Ainda continuo desafiando a morte quando acredito que a qualquer momento vou te ver entrando pelo portão de casa.
Quem sabe ouvir os passos do andar lento e calculado de quem viveu poucas e boas nessa vida. O almoço, sempre no mesmo horário, era a certeza de que te veria pelo menos uma vez por dia. Não era o ideal, mas o necessário.
O corre-corre do dia, o trabalho e as responsabilidades nos afastaram. Até hoje, quando fecho os olhos, lembro que a fase mais feliz da minha vida foi na infância. Era lá que, na minha inocência, você era meu herói sem capa e sem poderes sobrenaturais. Mas tínhamos mais tempo um com o outro.
Mas queria mesmo, depois de três anos, era ouvir os gritos em casa daquela voz inconfundível. Tudo está estranho. O quintal é um silêncio e jamais imaginaria que um sentiria falta da sua voz.
Dias desses, não sei o motivo, lembrei de coisas bobas que aprendi com você: escovar os dentes, dar nó no cadarço do sapato, me molhar, fechar o chuveiro, me ensaboar e finalizar o banho. Além disso, nunca colocar os cotovelos sobre a mesa e falar sempre a verdade também foram ensinamentos que o senhor me ensinou.
Todavia, conviver com a saudade não é difícil. Mas acho que o pior é encontrar alguém, seja lá quem for e em qualquer lugar, e ouvir histórias suas. Sempre rio, pois sei o quanto você era querido.
Aos poucos, as coisas estão se perdendo com o tempo. As ferramentas que você tinha, os objetos pessoais e as roupas. Algumas, por termos o mesmo corpo, continuo usando. Só não uso as camisas do Vasco, mas por você eu usaria. Acredita?
Há três anos que você foi embora. E como um guerreiro, no dia da sua morte, naquele 18 de janeiro de 2022, trabalhou para trazer o sustento para casa mais uma vez.
Você envergava, mas nunca quebrou!
No entanto, gostaria muito de te reencontrar. Dizer que, apesar das nossas diferenças e da forma como encarávamos a vida, nunca deixei de amar você.
Acredito que o homem que me tornei, foi muito em razão do pai que tive. Mas só por hoje, do fundo do meu coração, queria te reencontrar.
Seria um reencontro para a gente sentar, aparar nossas arestas, bater um papo e conversar sobre coisas da vida. Algo que a gente nunca fez.
Pai, você morreu. Mas já não me preocupo mais em compreender ou tentar entender a tanatologia. Não, já desisti disso!
Continua sendo difícil. E, mais difícil é, quando sonho com você. Tenho sonhado pouco, confesso, mas ainda sonho.
Mas o que me conforta - se isso é importante para quem perde algo valioso na vida - é que tivemos poucos momentos juntos que representaram muito para mim.
Queria você de volta aqui para brigar comigo por estar com o IPVA vencido e continuar saindo com o carro.
Queria você de volta aqui para ouvir sua voz dizendo: "Marcos, você só vai aprender quando for multado por dirigir falando ao celular. Estou cansado de alertar. Guerra avisada: morre quem quer!".
Eu sei que são coisas bobas. Mas me fazem uma falta muito grande.
Tentei escrever este texto no dia que completou três anos da sua morte. Mas, por sorte ou pela falta dela, só agora consegui escrever. Me perdoa!
Ah, meu pai... como queria você de volta aqui.
Mas só por hoje!