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Acordo acaba com monopólio das empresas de ônibus na gestão do Riocard

Licitação vedará presença de pessoa ou empresa ligada às concessionárias de transporte de passageiros no Estado do Rio

Por Portal Eu, Rio! em 18/02/2020 às 12:10:07

Fetranspor exerce monopólio sobre bilhetagem eletrônica e coordena interesses das empresas de ônibus, inclusive em atividades ilícitas, conforme denúncia do Ministério Público Federal Foto Casa Flumin

Alvo de disputa judicial e de tentativas de acordo durante mais de três anos, o sistema de bilhetagem eletrônica usado no transporte público passará a ser administrado pelo Estado do Rio ou por empresa escolhida por licitação, cuja vencedora deverá ser conhecida e contratada até 31 de dezembro desse ano. A data e as novas regras para gestão e controle da emissão dos cartões e da receita das passagens estão determinadas em novo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado pela Defensoria Pública, pelo Ministério Público e pelo governo do Estado.

O novo TAC põe fim ao monopólio da Riocard, de propriedade da Federação de Transportes de Passageiros do Estado do Rio, e proíbe expressamente que empresas de concessionárias de transporte público ou pessoas a elas ligadas se candidatem à concorrência que escolherá a nova operadora do sistema. O documento destaca que o objetivo da Defensoria, do MP e do Estado é a "a elaboração de um sistema de bilhetagem mais aberto, moderno e benéfico ao usuário, aliado a um controle maior pelo Poder Público, em especial dos benefícios concedidos com dinheiro público (Bilhete Único Intermunicipal e gratuidades)".

Já devidamente homologado no Poder Judiciário, o TAC pode ser levado à execução judicial, com cobrança de multa diária, caso o Estado descumpra qualquer uma das cláusulas.

"Através deste novo TAC, todo o sistema de bilhetagem eletrônica passará a ser de efetiva titularidade do Estado, e não mais da Fetranspor. É uma medida essencial para um novo capítulo na história do Estado do Rio de Janeiro, com o poder público cuidando adequadamente da população fluminense e assumindo um serviço que já deveria estar no controle desde sempre. Esperamos que agora o transporte público melhore para a população mais carente que o utiliza diariamente, e que o Estado consiga melhor planejar e melhor pagar os subsídios que são no fim pagos por toda a população do Rio com os impostos", explica o subcoordenador do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria, Eduardo Chow de Martino Tostes.

O promotor de Justiça Guilherme Magalhães Martins, titular da 5ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva e Defesa do Consumidor e do Contribuinte da Comarca da Capital, argumenta "o termo aditivo assegura maior transparência e informação aos consumidores, além de romper o monopólio da Fetranspor nas operações de bilhetagem eletrônica do transporte público. A população tem muito a comemorar".

Todo o sistema de bilhetagem eletrônica do transporte público, incluindo ônibus e vans intermunicipais, é coberto pelo TAC, que prevê transição de até 180 dias para a vigência simultânea do novo e do antigo sistema, de modo a não prejudicar os usuários do Bilhete Único Integrado, do Vale Social e do Vale Educação. A ideia é que, nesse intervalo, haja adequação do serviço e troca de todos os cartões.

O futuro serviço de bilhetagem eletrônica e todos os dados relativos ao sistema, principalmente receita, estarão sujeitos o acompanhamento permanente por parte da Defensoria Pública e do Ministério Público. A operação deve ser "instrumento de transparência e fiscalização dos serviços de transporte público e da regularidade dos subsídios custeados pelo ente público".

Ainda na fase de licitação e contratação, Defensoria e MP deverão ter acesso irrestrito a "todas as informações, dados e justificativas técnicas" do processo. A empresa que vier a ser vencedora na licitação deverá permitir também "acesso remoto irrestrito a todos os dados que integram o sistema, como, por exemplo, o valor do subsídio a ser repassado às permissionárias e concessionárias, o número de passageiros e de viagens e o valor total auferido por cada modal".

As informações deverão ser publicadas na internet, aberta a toda a população, preservando somente detalhes que "violem a privacidade dos usuários" de transporte. Além disso, conforme garante o TAC, o Estado deverá "contratar bienalmente auditorias externas para atestar a inviolabilidade do sistema de bilhetagem eletrônica", a fim de evitar fraudes.

"Este TAC representa o fim da caixa preta da Fetranspor/RioCard no Estado do Rio de Janeiro. Será o antes e o depois de sua implementação, colocando um fim a uma conduta que gerou muitos prejuízos em nosso Estado", destaca o subcoordenador do Nudecon.

Os números disponíveis sobre o movimento de passageiros dão conta de que, de setembro de 2016 a agosto de 2017, viajaram em ônibus e vans intermunicipais mais de 1,2 bilhão de pessoas, ou cerca de 100 milhões por mês. O transporte ferroviário recebeu, em doze meses, cerca de 165 milhões de passageiros; o metroviário, pouco menos de 250 milhões. As barcas tiveram, no período, 20 milhões de usuários. O VLT, 6,5 milhões. Serão, assim, milhões de pessoas beneficiadas por este TAC.

Desde 2017, Defensoria e Ministério Público tentam garantir que os dados relativos à receita gerada pelo sistema de bilhetagem eletrônica sejam transparentes e controlados pelo poder público. Em julho daquele ano, Defensoria e MP conseguiram liminar em ação civil pública junto à 4ª Vara de Fazenda Pública contra a Fetranspor, a RioCard e o Estado, alegando ser inconstitucional e ilegal que não tivesse havido licitação para escolha da empresa responsável pela emissão de cartões usados no transporte de concessão e/ou permissão estadual e pela coleta de dados relativa à venda de passagens.

Em novembro, o Estado acabou por assinar um primeiro Termo de Compromisso com a Defensoria e o MP, comprometendo-se a mudar o sistema de bilhetagem e a abrir licitação para escolha de empresa que faria o processamento de todas as transações referentes ao transporte de passageiros, substituindo a RioCard.

Meses depois, já em fevereiro de 2018, o então governador Luiz Fernando Pezão assinou o Decreto 46.243, acabando com monopólio da RioCard, conforme o que fora acordado no Termo de Compromisso. Na sequência, porém, o Estado passou a descumprir o acordo anterior e o caso voltou à Justiça.

Em 2019, com a posse do novo governo estadual, a renegociação foi retomada, de modo a tornar exequível a mudança em todo o sistema e a sua efetiva implementação.

Riopar, empresas criada por dirigentes da Fetranspor, operava sem licitação a bilhetagem eletrônica dos transportes desde 2012

A denúncia da Operação Ponto Final contra o ex-governador Sergio Cabral e os dirigentes da Fetranspor, por crimes que vão da lavagem de dinheiro à cobrança de propinas e o superfaturamento de bens e serviços, ajuda a explicar as normas altamente restritivas com que o Termo de Ajustamento de Conduta busca balizar a futura licitação da substituta da Riocard. O documento explica que a organização criminosa, que atuou desviando verbas públicas de origem federal e estadual, as remetendo para o exterior, vem sendo desarticulada progressivamente, já tendo sido identificados vários de seus núcleos e operadores financeiros, bem como a forma como lavavam os proveitos do crime. Em sua ramificação relacionada aos transportes públicos, possuía sua estruturação e divisão de tarefas em quatro núcleos básicos:

a) o núcleo econômico,formado por donos de empresas de ônibus que dominavam a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro – FETRANSPOR;

b) o núcleo administrativo, composto por gestores públicos do Governo do Estado do Rio de Janeiro que solicitavam e administravam o recebimento das vantagens indevidas pagas pelos empresários;

c) o núcleo financeiro operacional, formado por responsáveis pelo recebimento e repasse das vantagens indevidas e pela ocultação da origem espúria;

d) o núcleo político, formado pelo líder da organização criminosa, o ex-governador Sérgio Cabral.

Integravam o núcleo econômico os empresários de ônibus JOSÉ CARLOS LAVOURAS, JACOB BARATA FILHO, JOÃO AUGUSTO MONTEIRO e MARCELO TRAÇA, além do então presidente executivo da FETRANSPOR e do RIO, todos responsáveis por controlar a arrecadação semanal da propina junto às empresas de ônibus e repassar os valores ilícitos a agentes públicos, incluindo

o ex-governador SÉRGIO CABRAL, que recebeu entre os dias 30 de julho de 2010 e 20 de outubro de 2016, por 203 vezes, a quantia total de R$ 144.781.800,00 (cento e quarenta e quatro milhões, setecentos e oitenta e um mil e oitocentos trinta mil Reais). Além da propina repassada ao líder da organização criminosa, o total de R$ 43.400.000,00 foram destinados, entre 07/2010 e 02/2016, ao então presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro – DETRO, ROGÉRIO ONOFRE

Os repasses de propina à organização criminosa tinham como contraprestação a prática de atos de ofício pelos gestores do Estado do Rio de Janeiro, porquanto o conjunto de funções exercidas pelos agentes públicos que integram o núcleo administrativo e político da organização está relacionado com os interesses privados dos particulares como exploradores do transporte público urbano, isto é, pode-se aferir extreme de dúvidas a relação de mercancia que tem por objeto a função pública exercida pela então maior autoridade do Poder Executivo estadual. Dessa forma, os empresários aqui denunciados garantiam a sua hegemonia no setor de transportes públicos, além de benefícios na política tarifária e de gestão desse serviço público de natureza essencial.

Conforme as planilhas apresentadas ao Ministério Público Federal por colaboradores, contemporâneas aos fatos, os milionários valores da propina foram ocultados e movimentados ao largo do sistema bancário oficial, recolhidos regularmente nas garagens de empresas de ônibus vinculadas à FETRANSPOR e custodiado em transportadoras de valores,que transcendiam totalmente a autorização para custódia que qualquer empresa dessa natureza possui, passando a operar francamente instituição financeira, inclusive com a manutenção de contas em nome de empresas e de pessoas físicas, fazendo intensas operações de compensação entre elas e até mesmo aplicando uma espécie de remuneração mensal no saldo custodiado. Portanto, além dos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e pertinência a organização criminosa, esta denúncia abrange crime contra o sistema financeiro nacional, conclui esse trecho da denúncia, que já resultou em condenações para Cabral e seus parceiros.

A denúncia da Operação Ponto Final resume meses de investigações em uma descrição detalhada

A FEDERAÇÃO DAS EMPRESAS DE TRANSPORTES DE PASSAGEIROS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – FETRANSPOR é entidade que congrega 10 sindicatos de empresas de ônibus responsáveis por transporte urbano, interurbano e de turismo e fretamento. Esses sindicatos, por sua vez,reúnem mais de 200 empresas de transporte por ônibus, que respondem por 81% do transporte público regular no Estado do Rio de Janeiro. Como sabido, a referida federação sindical representa os interesses das empresas de transporte de passageiros do Estado, sendo a entidade de interlocução com a sociedade civil e esferas governamentais a respeito dos serviços púbicos prestados nesse setor da economia.

Sempre de acordo com o documento da Todos os ora denunciados, que representam o núcleo econômico da ORCRIM liderada por SÉRGIO CABRAL, integram ou integraram, até próximo à deflagração da Operação Ponto Final, os quadros da FETRANSPOR e do seu principal sindicato filiado, o RIO ?"NIBUS (Sindicato das Empresas de ônibus da Cidade do Rio de Janeiro), onde revezavam entre si os postos mais estratégicos há mais de 20 (vinte) anos. Além dessas entidades sindicais patronais, esses denunciados exercem o controle da sociedade empresária RIOPAR PARTICIPAÇÕES SA (CNPJ 16727386000178), a qual foi constituída em agosto de 2012 e opera, sem licitação, a polêmica bilhetagem eletrônica de todos os transportes públicos o Estado do Rio de Janeiro (Bilhete Único e Rio Card), objeto de recente ação civil pública do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

JOSÉ CARLOS LAVOURAS é Presidente do Conselho de Administração da FETRANSPOR desde a sua criação em 1988, entidade que tem como VicePresidente MARCELO TRAÇA, e que tinha como Presidente Executivo LÉLIS TEIXEIRA desde 2006, cargo ao qual renunciou por supostos "problemas de saúde" dias antes da deflagração da fase mais ostensiva da Operação Ponto Final. LÉLIS TEIXEIRA também era desde de 1999, portanto há 18 anos, Presidente do RIO ?"NIBUS, cargo ao qual também renunciou dias antes de ser preso. Ainda, JOÃO AUGUSTO MONTEIRO ocupa o cargo de Vice-Presidente do Conselho Superior do RIO ?"NIBUS.

Por sua vez, JACOB BARATA FILHO é Presidente do Conselho de Administração da RIOPAR PARTICIPAÇÕES S/A (CNPJ 16727386/0001-78), o qual também é integrado por JOSÉ CARLOS LAVOURAS, LÉLIS TEIXEIRA e MARCELO TRAÇA, denunciados que também fazem parte da diretoria da RIOCARD ADMINISTRADORA DE CARTÕES E BENEFÍCIOS S/A (CNPJ 14.081.184/0001-76), da CONCESSIONÁRIA DO VLT CARIOCA S/A (CNPJ 18.201.378/0001-19), e da RIOTER – TERMINAIS RODOVIÁRIOS DE PASSAGEIROS LTDA (14.102.782/0001-84), sociedades subsidiárias da primeira.

Essa digressão acerca das diversas funções de comando exercidas por esses denunciados nas entidades representativas das empresas de transporte, bem como na administração de sociedades empresárias diretamente atuantes no sistema de bilhetagem eletrônica de todos os transportes públicos do Estado do Rio de Janeiro, permite contextualizar a total ingerência de cada um deles na gestão do "caixa dois" da FETRANSPOR, utilizada para pagamento de propina a agentes políticos.

Riocard se manifesta

A Riocard enviou a seguinte nota ao Portal Eu, Rio!:

"A RioCard esclarece que não tem monopólio sobre o sistema de pagamento eletrônico no transporte público no Estado do Rio. A empresa é a favor da livre concorrência e lembra que existem mais de sete sistemas de bilhetagem em operação no Estado, como exemplo nas concessionárias de trem e metrô.

É importante ressaltar que a bilhetagem eletrônica foi instituída pela Lei Estadual 4.291, de 2004, que determina que as empresas de transporte sejam responsáveis pelo custeio, pela implantação e pelo gerenciamento do sistema, assegurando ao poder público o acesso às informações. E as empresas que receberam a delegação por lei, por sua vez, optaram pela utilização do sistema RioCard.

É preciso informar ainda, que de acordo com o decreto estadual 46.243, de 2018, não há monopólio na comercialização de Vale-Transporte. Pelas novas normas, todas as concessionárias podem realizar a venda do VT.

Cabe destacar também que não há caixa-preta em relação aos dados referentes à bilhetagem eletrônica. A Secretaria de Estado de Transportes recebe diariamente, por meio do Proderj, todos os dados auditados, inclusive as gratuidades e as informações do Bilhete Único Intermunicipal (BUI). Em relação às gratuidades, cada secretaria recebe as informações para análise.

Com relação à validade dos créditos de transporte, a RioCard relembra que não há prazo determinado para o uso dos valores depositados nos cartões de transporte, conforme decisão da Justiça.

A RioCard afirma que sempre esteve disponível para esclarecer os questionamentos do Ministério Público e da Defensoria Pública, de forma transparente e colaborativa, buscando soluções que venham atender os interesses do Estado e as necessidades dos passageiros de transporte público.

Sobre a definição das tarifas de transporte, a RioCard deixa claro que não tem qualquer ingerência nos valores calculados, que é responsabilidade exclusiva do poder público".


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