Em fevereiro, pouco antes do registro do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, 59,3% dos municípios brasileiros não dispunham de respiradores/ventiladores, 51,9% não possuíam monitores de ECG, 39,6% não contavam com desfibriladores, 71,0% não registravam bombas de infusão, 84,6% não tinham tomógrafo e 90,4% não contabilizam leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) para adultos.
Dados como esses ilustram as grandes diferenças regionais na disponibilidade de recursos hospitalares no país, e a falta de equipamentos e leitos de UTI para atendimento a casos graves de Covid-19, na maioria dos municípios brasileiros. A conclusão é de uma pesquisa liderada pelo Departamento de Administração e Planejamento em Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz).
O estudo, que contemplou 421 municípios em 26 estados e no Distrito Federal, indica maior capacidade de atendimento na região Sul e menor nas regiões Norte e Nordeste, comparadas ao Sudeste. O Centro-Oeste não se diferenciou significativamente do Sudeste.
Os resultados também indicam que os municípios com mais recursos para atendimento de casos graves da doença apresentam maior porte populacional e porcentual de beneficiários de planos de saúde. "São muitos os desafios para comportar a demanda por cuidados em centros de maior aglomeração populacional, onde já são maiores os números de casos de Covid-19, mas também se situam mais recursos. A possibilidade de regulação única dos recursos públicos e privados precisa ser considerada fortemente", alertam os pesquisadores.
Diagnóstico, monitoramento e estabilização de pacientes estão concentrados nas grandes cidades
Com base em dados do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES) relativos a fevereiro de 2020, a pesquisa analisou a disponibilidade de recursos necessários para a estabilização, manutenção da vida ou diagnóstico preciso de pacientes com quadro grave de Covid-19, tais como respiradores/ventiladores, monitores de ECG, desfibriladores, bombas de infusão e tomógrafos, além de leitos de UTI.
Ao analisar exclusivamente os leitos de UTI, não disponíveis na maioria dos municípios, a pesquisa mostra que existe maior concentração do recurso nas regiões Sul e Sudeste, com taxas entre 1 e 5 leitos de UTI por 10 mil habitantes em termos globais, com destaque para a saúde suplementar, em que as taxas são de 10 leitos de UTI por 10 mil habitantes.
Em relação à disponibilidade de tomógrafos, foi encontrada indisponibilidade ou baixa disponibilidade do recurso em grande parte do país em termos globais, no SUS e na saúde suplementar. "Mais frequentemente, a disponibilidade está no SUS. Mas alguns municípios possuem até cinco tomógrafos por 10 mil habitantes nas regiões Sul e Sudeste na saúde suplementar", explicam os pesquisadores.
No que diz respeito aos demais recursos – respiradores/ventiladores, monitores de ECG, desfibriladores e bombas de infusão –, foi observada disponibilidade maior e mais espalhada, com maior capilaridade no SUS na maioria dos municípios e concentração de recursos na saúde suplementar em algumas áreas. "Na maior parte dos municípios do interior do país, os leitos e equipamentos se concentram no SUS. Já nas regiões onde é elevado o número de beneficiários de planos de saúde hospitalares, os recursos estão centrados na saúde suplementar", esclarecem os pesquisadores.
Avanço da epidemia obriga a monitorar risco de explosão de demanda por UTI, com uso prolongado
O estudo acende alerta sobre a tendência de interiorização da pandemia, chamando a atenção para a necessidade de novos arranjos e ampliação da capacidade de prestação de cuidados em condições adversas. "Para dar conta do enfrentamento da Covid-19, leitos e equipamentos já estão sendo adicionados à estrutura hospitalar de diversos municípios do país, sendo tais recursos muito importantes para mitigar problemas na capacidade de provisão de cuidados a pacientes e reduzir índices de letalidade da doença. Entretanto, frente a um quadro epidêmico já instalado, é fundamental monitorar a elevada probabilidade de que a demanda pelos recursos disponíveis cresça de forma exponencial e com padrões de uso prolongados", advertem os estudiosos.
Os pesquisadores também destacam a continuidade do isolamento social como medida de prevenção da disseminação do novo coronavírus. "A minimização da circulação de pessoas é central para reduzir os níveis de transmissão da Covid-19, atenuar a propagação acelerada do vírus, distribuir a demanda por atendimentos no tempo e evitar o colapso do sistema de saúde", afirmam.
"São grandes os vazios de capacidade instalada no território nacional, impondo a necessidade de planejamento regional, reorganização dos serviços prestados em unidades básicas de saúde e UPA, além de transporte adequado de pacientes em uma rede de referência bem estabelecida", alertam os pesquisadores.
Fonte: Agência Fiocruz de Notícias