Cobrada por deixar de homenagear na avenida dois de seus maiores nomes, a Mangueira vai reparar a suposta injustiça no Carnaval de 2021 – fora de época, quando e se acontecer em julho. A Verde e Rosa anunciou na última quinta-feira (17) que levará para a Marquês de Sapucaí um enredo sobre três dos mais importantes baluartes da escola e do próprio Carnaval: Cartola, Jamelão e Mestre Delegado.
Batizado como "Angenor, José e Laurindo", título formado com os nomes de batismo de cada um, o enredo será o sexto trabalho na escola do aclamado carnavalesco Leandro Vieira, artista que, nos últimos dias, aguçou a curiosidade da turma do samba pelo último tema de desfile a ser anunciado no Grupo Especial.
Segundo o próprio carnavalesco, a Mangueira fará uma "reparação importante em sua história, quando deixou de homenagear outros dois grandes nomes que passaram em branco em seus centenários: Cartola, seu fundador e Jamelão, que através de sua voz eternizou sambas antológicos que ganharam o mundo".
Vieira se refere a dois Carnavais em que as esperadas homenagens ao compositor e ao intérprete (puxador não!) deram lugar a enredos patrocinados.
Em 2008, nos 100 anos do nascimento de Cartola, um dos fundadores da Mangueira, a escola fez um desfile sobre outro centenário, do frevo. A troca valeu um aporte financeiro de R$ 3 milhões da prefeitura de Recife – valores oficiais -, mas rendeu (e rende) um rosário de críticas. Relegar o autor de "As rosas não falam" e outros clássicos absolutos, a quem a escola deve suas próprias cores, foi algo tratado como um pecado quase imperdoável. Mas, sim, deve haver o perdão.
Em 2013, no centenário de Jamelão, a Mangueira ignorou seu cantor, que empunhou o microfone da escola por incríveis 57 anos seguidos, e homenageou a cidade de Cuiabá, em troca de um patrocínio de R$ 3,6 milhões (valores oficiais) da prefeitura da capital do Mato Grosso. Na concentração, momentos antes da Manga entrar na Sapucaí, dirigentes da escola mal disfarçavam o incômodo com as perguntas dos jornalistas sobre o lapso com Jamelão.
E o intérprete não ficou sem desfile: o cantor foi o enredo da Unidos do Jacarezinho no mesmo ano, no grupo de acesso, apresentação bancada, segundo o então presidente da Mangueira, Ivo Meirelles, com o dinheiro do patrocínio cuiabano, conforme relato ao site Sambario.
Entre os homenageados, Mestre Delegado é o menos conhecido fora da chamada "bolha carnavalesca". Mas o legado do mestre-sala, que morreu em novembro de 2012, permanece até hoje. Agora é a hora do povo conhecer e exaltar, pelo olhar de Leandro Vieira, a importância para a folia de Delegado, que tinha esse apelido por causa da fama de "prender" as mulheres na base do papo.
Talvez por ser a figura menos popular do trio, foi também quem mais me despertou interesse no processo. "A trajetória dele é mantida viva no boca a boca, através da oralidade no morro da Mangueira", disse Vieira em entrevista ao jornalista Pedro Willmersdorf, do jornal O Globo, que antecipou a notícia do enredo.
Considerado um dos maiores – ou o maior – mestre-sala da história, Delegado completaria 100 anos em 2021. A homenagem, portanto, é oportuna. Pelo menos por esse centenário a Mangueira nunca será cobrada.
Ouça o que diz o professor Luiz Antônio Simas sobre o enredo da escola de samba no próximo carnaval no Podcast do Portal Eu, Rio!: