Divergências políticas, pedidos de demissão e chegada de novos profissionais no meio da temporada, grupo muito jovem, salários atrasados, zona de rebaixamento se aproximando, caso Gustavo Scarpa, etc. São inúmeros os problemas que o Fluminense vem enfrentando em 2018. E as dificuldades financeiras não deixam os tricolores vislumbrarem dias melhores.
Em meio ao furacão que ronda as Laranjeiras, o Portal Eu, Rio! entrevistou Sandro Lima, vice-presidente tricolor, cargo que exerceu de maio de 2011 a setembro de 2013. Atualmente conselheiro, é figura muito atuante na política do Fluminense. O ex-dirigente falou sobre o futuro do clube, a demissão de Abel Braga, chegadas de Marcelo Oliveira e Paulo Angione, Pedro Abad, Gustavo Scarpa, entre outros assuntos.
Sandro se mostra triste com o atual momento tricolor. "Eu defino como catastrófico esse atual momento do Fluminense. E triste, principalmente pela torcida. Porque quando a gente vai dirigir um clube como o Fluminense, na verdade a gente dirige para a torcida. Não é para a gente, não é para ninguém. É para o torcedor ter orgulho do clube, ter carinho com o clube. E, nesse momento, o que a gente tem é o carinho, óbvio, que nunca vai acabar, mas muita tristeza pelo que tem acontecido dentro e fora do clube."
A grande referência do Fluminense nesta temporada era o técnico Abel Braga, que pediu demissão no início deste mês. Sandro Lima não poupou críticas à atual gestão do clube e disse o que os tricolores devem esperar na sequência do ano, após a saída do técnico.
"O que a gente tem que esperar é o seguinte. A gente sabe que a gestão e que o nosso presidente estão fragilizados. Primeiro, a torcida abraçar esse time e não deixar que aconteçam coisas piores. Porque quando as coisas vão mal do lado de fora, é óbvio que elas chegam ao lado de dentro. E também não podemos ajudar essa imprensa, que tanto tenta destruir o Fluminense, a potencializar esses tipos de críticas. Então a torcida vai ter que garantir o Fluminense mais uma vez, como sempre foi. E a diretoria, de alguma maneira, vai ter que blindar esses jogadores, vai ter que honrar os compromissos que tem com esses jogadores, para que não aconteçam coisas piores. E aí sim, virou o ano, reformular. Ou essa gestão sai ou renuncia, ou muda alguma coisa, porque do jeito que está, não está dando. Já viram que não deram certo. Essa gestão é um fracasso."
Atualmente, o Fluminense ocupa a 12ª posição do Campeonato Brasileiro e vê a zona de rebaixamento cada vez mais próxima, já que apenas dois pontos o separam do Bahia, primeiro time no Z4, com 12 pontos. Apesar de não querer pensar em um possível descenso, o ex-vice-presidente acredita que o apoio da torcida será fundamental para o clube permanecer na Série A.
"Eu não quero acreditar em rebaixamento do Fluminense. Eu acho que a torcida, mais uma vez, vai ter que ter uma participação fundamental. É um grupo jovem e a gente não sabe como esse grupo vai vir depois da Copa, com a saída do Abel. Porque todo mundo sabe que, dentro do vestiário, ele segurava. Alguns jogadores que ainda estão no elenco, que eu tive a oportunidade de conversar, me confessaram que eles corriam muito pelo Abel, que não tinha como olhar para o Abel e não correr por ele. Então, agora, essa diretoria vai ter que ter um trabalho, porque o Abel está aí com o Abad desde que ele assumiu. Vamos ver como vai ser o Abad sem o Abel, porque eu acho que eles transferiam muita coisa para o Abel. Mas não quero acreditar em rebaixamento. Foi como eu disse anteriormente, motivo para potencializar essas críticas que vêm da imprensa em relação ao Fluminense. Agora, eles têm que, no mínimo, ter algumas soluções para manter a harmonia dentro do vestiário. Como o salário em dia, que é uma obrigação. Como unir a torcida, fazer com que a torcida volte ao estádio e abrace esse time. Que a torcida garanta esse time, porque se depender dessa diretoria, a gente não vai para a B, vai é voltar para a C. Eles são muito ruins."
Confira, abaixo, a íntegra da entrevista:
Recentemente, Paulo Autuori e Abel Braga pediram demissão do Fluminense. Como você viu a saída desses dois profissionais do clube?
É péssimo perder referências. No caso, o diretor executivo Paulo Autuori e o treinador Abel Braga, que têm uma relação mais do que íntima com o clube. Você perde uma referência muito grande de proteção ao elenco, de um vestiário fechado. Eu acho que o Fluminense perde muito, principalmente com a saída do Abel. Agora está chegando o Marcelo. Ele vai ter que fazer com que o vestiário fique unido com ele, como era com o Abel. E eu acho que isso, hoje, é o principal. E blindar esses jogadores. São jogadores jovens. Um elenco jovem e passando por uma crise dessas, queira ou não queira, as coisas chegam ao vestiário. Se não tiver uma blindagem boa, chega ao vestiário qualquer tipo de comentário fora do clube, qualquer entrevista ruim de alguém que esteja na diretoria do clube. Então, agora é o momento de união de todos ali, blindar esse grupo e pensar no futuro. Um futuro melhor do que esse, porque esse aí, dá pra sentir que não funciona mais.
Você teve a oportunidade de conversar com o Abel após saída do Fluminense?
Eu não conversei com o Abel em relação ao Fluminense. Falei com ele que não conversaríamos, enquanto ele estivesse no Fluminense, sobre o clube. Mas, conhecendo bem o Abel, para ele sair, com certeza ele viu que as coisas não estavam funcionando. Provavelmente estavam se repetindo as coisas que aconteceram no ano passado, e resolveu sair. O que eu vejo nesse momento, é isso. Mas não conversei com o Abel. E assim que eu puder conversar, óbvio que vou estar com ele, para dar um abraço nele.
Certa vez, em uma entrevista, você disse que o Abel Braga merecia receber do Fluminense o mesmo tratamento que Alex Ferguson no Manchester United. Você acha que a atual gestão pouco valorizou a trajetória dele no clube?
Como eu disse, a relação do Abel com o Fluminense é muito íntima. Em entrevistas, ele mesmo fala que o Fluminense é o formador dele como atleta e ser humano. E o Abel é um cara de falar mesmo a verdade, o que ele sente. E quando a gente tem uma pessoa assim, que ama o nosso clube, que foi vitoriosa fora e dentro de campo com o clube, a gente sempre tem que valorizar essas figuras. E o Fluminense, ultimamente, tem pegado a biografia de algumas pessoas importantes e destruído. Eu acho que isso não é legal. Eu acho que a gente tem que valorizar um pouco a história, quem contribuiu, quem realmente deu a cara a bater pelo clube. E o Abel, hoje, com certeza seria um desses. O Abel é um cara que entende muito de futebol, pode contribuir muito. Não precisa nem falar o tanto que ele valoriza os garotos, o tanto que ele mesmo toma porrada para proteger esses garotos. Ele é um cara sensacional. Claro que ele ainda é treinador, mas mais para frente, eu o vejo cuidando de gestão de jogadores. Um cara para estar dentro do clube dando sua opinião, para estar blindando e dando moral aos jogadores, falando de estratégia e de futuro. O Abel é um grande tricolor, e como grande tricolor, não podemos esquecê-lo jamais.
(FOTO: Nelson Perez / ASCOM Fluminense FC)
Como isso pode afetar os jogadores do Fluminense?
O que afeta o jogador é quando você não tem palavra com eles. Isso realmente incomoda o jogador. Você tem que ser o mais sincero possível, mostrar a realidade e mostrar soluções. Não chegar lá, falar que vai ter solução, e não tem. Eu volto a insistir na torcida abraçar esses jogadores que nós temos e não deixar que aconteça o pior.
Nesta semana, o clube anunciou a volta de Paulo Angione para arrumar o departamento de futebol. Foi a melhor escolha?
Conheço o Paulo Angioni. Um ser humano extraordinário e um cara muito experiente no futebol. Mas o problema é o momento do Fluminense. Eu acho que a escolha, em relação à experiência de futebol, foi muito boa. O problema realmente é o momento. Mas eu desejo a ele muita sorte e que ele possa fazer essa blindagem, que eu tanto estou falando aqui, com os jogadores.
Qual será a maior missão de Paulo Angione neste retorno ao clube?
A missão dele vai ser tranquilizar os jogadores. Contratar, eu não sei se ele vai conseguir, porque essa diretoria não está com os salários em dia e vai ter dificuldade em contratar. A gente viu que, no começo do ano, jogadores que nem são expoentes em suas equipes não quiseram vir para o Fluminense. Hoje temos que entender que o nosso grupo é esse aí e é com ele que vamos ter que ir até o final. É com esse grupo que a gente vai ter que acreditar, valorizar e torcer para eles. E a missão do Paulo, pela experiência que ele tem no futebol, vai ser tranquilizar esse pessoal todo. E o Paulo, como eu disse antes, é um cara que entende de futebol, já é veterano nisso, e vai poder contribuir com a sua experiência.
Até que ponto a fama de mau pagador que o clube adquiriu nesta gestão pode atrapalhar o Fluminense após a Copa do Mundo?
O mundo do futebol é muito pequeno. Os jogadores, hoje, se falam entre si. Quando um jogador está vindo para o clube, ele já pega informação de como o clube está. Eu lembro que na minha época, óbvio que a gente tinha um patrocínio forte, os jogadores faziam fila. Quando recebiam uma ligação do Fluminense, eles paravam tudo que estavam fazendo para nos escutar. Hoje em dia não acontece isso. Me lembro da situação do Thiago Neves, que estava praticamente fechado com o Flamengo, e nós conseguimos reverter. Também é uma outra época, com um patrocínio forte, que às vezes recebia muitas críticas sem as pessoas saberem o que realmente estava acontecendo. E hoje, vou te falar, eles vão ter que ter muita criatividade para trazer alguém. Ou vão trazer Romarinhos e esses jogadores aí, que vão servir de ponte, para bater no Fluminense e ir embora, como esse último zagueiro que chegou e não ficou nem dois meses.
Como você vem acompanhando o caso Gustavo Scarpa. Quem está errado nesta situação, clube ou o jogador?
Eu acho que quem está errado é ele, o jogador, por escutar mal os seus empresários. E o clube também, que não teve um diálogo claro com ele para tentar resolver isso antes que chegasse a esse ponto. Mas o jogador também está muito errado. O jogador tem que entender que o Fluminense foi o clube que o formou. Eu peguei muito pouco tempo do Scarpa. Ele ainda era das categorias de base quando eu estive lá na vice-presidência. Ele já fazia alguns treinos com o profissional. Pelo que eu vejo, é um grande jogador, com muito potencial. Eu acho que o Fluminense tem que chegar nele e resolver isso. Conversar, enfim, entrar num acordo, porque o jogador também está sendo prejudicado. Não jogou esse ano. E na idade dele, ficar um ano sem jogar é realmente prejudicial demais. Eu acho que falta diálogo, só isso.
Se fosse dirigente do clube, você tentaria um acordo com o jogador?
É óbvio. Eu tenho certeza que o jogador quer jogar. O problema é que se criou um clima que, no Fluminese, talvez ele não consiga jogar mais. Se dialogar com ele, eu tenho certeza que ele entraria em um acordo. Mas tem que ter pessoas capacitadas para fazer isso, né?
Você aceitaria ou não existe a menor possibilidade de colaborar com a atual gestão?
Não existe a menor possibilidade de eu sentar com esses caras para ajudar em nada. Agora, ajudar o Fluminense, sempre. Sentar para dialogar com esses caras, não tem como. Eles não olham no olho. Esse caras só pensam neles e nos amiguinhos deles. E eles estão afastando muitas pessoas boas que poderiam ajudar o Fluminense.