Pesquisa feita pelo Datafolha confirma o que já vinha sendo denunciado no Brasil: o retorno da fome e da diminuição da quantidade de comida na mesa das famílias brasileiras durante a pandemia de Covid-19. Um a cada quatro brasileiros afirma que viu a comida faltar em sua casa.
O levantamento do Datafolha – realizado durante os dias 11 e 12 de maio e que entrevistou presencialmente 2.071 pessoas em 146 municípios – apontou também que 88% dos entrevistados afirmaram ter percebido o aumento da fome no país. A margem de erro da pesquisa é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos, com nível de confiança de 95%.
Mulheres, negros e os menos escolarizados foram os que mais sentiram o drama da falta de alimentos em suas casas. Para 40% dos que tem apenas o ensino fundamental faltou comida e a situação de fome foi registrada com maior vigor entre os moradores de estados do Nordeste.
Segundo a pesquisa, outro fator que se relaciona à fome diz respeito à quantidade de adultos que trabalham nas famílias. Nos lares onde apenas um adulto trabalha, 29% teve menos comida do que o suficiente, enquanto que nos onde nenhum adulto trabalha esse índice salta para 35%.
O levantamento apresenta outro dado que comprova o que já vinha sendo alertado por especialistas: quem recebe auxílio emergencial do governo em 2021 é quem mais sentiu o peso da fome. Um total 41% desse grupo diz que faltou comida na mesa. Lembrando que o auxílio emergencial neste ano gira em torno de R$ 150 e R$ 375, enquanto que em 2020 era de R$ 600.
De acordo com o economista Francisco Menezes, ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) – que foi extinto pelo governo Bolsonaro no início do seu governo – a diminuição do auxílio é fator importante para explicar a fome medida pelo Datafolha. “É preciso destacar que quem recebe R$ 150 de auxílio tem efetivamente R$ 5 por dia para comer”, diz ele.
Sobre a gravidade do atual quadro social, ele compara a pesquisa com os índices apontados pelo IBGE no passado recente. “O Datafolha capta agora uma situação mais extrema, que o IBGE já apontou entre 2017 e 2018: uma inversão da curva da segurança alimentar no Brasil, que era até então descendente e voltou a níveis alarmantes”, afirma.
Também em dezembro do ano passado, dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, conduzido pela Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), revelou que a fome atingiu 19 milhões de brasileiros em 2020. Além disso 116,8 milhões de brasileiros se encontravam em situação de insegurança alimentar. A pesquisa foi feita em 2.180 domicílios das cinco regiões do país.
Francisco Menezes destaca também que um dos programas importantes de segurança alimentar é o da alimentação nas escolas. Porém, com o fechamento das escolas devido à pandemia, as crianças passaram a fazer todas as refeições em casa, o que agrava mais ainda a situação.
A pesquisa Datafolha mostra que famílias com crianças sentiram mais a fome: em 35% das casas com crianças de até 6 anos, houve menos comida na mesa do que o suficiente. Crianças pequenas em casa também dificultam que as mães trabalhem fora, observa Menezes.
Outro dado importante apontado pelo economista é o da alta dos preços dos alimentos, que influencia diretamente na diminuição da comida na mesa dos brasileiros. Os alimentos tiveram uma alta de 15%, ou seja, três vezes mais do que o índice da inflação de 2020.