O número de cirurgias oncológicas no estado do Rio de Janeiro caiu 25% desde o início da pandemia. Também houve redução (24,8%) nos tratamentos de câncer, com exceção de radioterapia e quimioterapia. Já as consultas ambulatoriais para esses pacientes tiveram recuo de 21,9%, no período de março a maio de 2020 na comparação com o trimestre imediatamente anterior (dezembro de 2019 a fevereiro de 2020).
Os dados fazem parte da pesquisa Assistência Oncológica do Estado do Rio de Janeiro durante a pandemia de Covid-19, realizada pela Coordenadoria de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Rio em parceria com Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O panorama registra ainda afastamento de profissionais de saúde durante março e maio de 2020, redução de encaminhamentos às unidades de saúde, aumento de ausência de pacientes nas sessões de quimioterapia e necessidade de mudança de protocolo devido à falta de medicamentos.
O levantamento dos dados se baseou em um questionário online que foi enviado às unidades da rede de alta complexidade em oncologia do Sistema Único de Saúde (SUS) no estado. A referência foi o trimestre anterior à pandemia, entre dezembro de 2019 e fevereiro de 2020, e o primeiro trimestre de pandemia entre março e maio do ano passado.
De acordo com a pesquisa, o percentual de afastamento dos médicos, no período, atingiu 14,6%, dos enfermeiros, 15,5%, dos técnicos de enfermagem, 22,7%, dos auxiliares de enfermagem, 12,5% e de outros profissionais, 26,5% .
“No total, de todas as categorias pesquisadas, foi visto um afastamento de 20,4% dos profissionais alocados em unidades especializadas em oncologia durante o período de março a maio de 2020. Este dado pode ter gerado um déficit no quadro de profissionais das unidades, levando a diversas mudanças na organização dos serviços, como: redução na oferta de serviços oncológicos, necessidade de realocação de profissionais especialistas em oncologia para outras funções, diminuição das atividades administrativas de alimentação de banco de dados para registro de atividades e captação de recursos, entre outros”, concluiu a pesquisa.
Para a coordenadora de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Rio, Thaisa Guerreiro, a redução na oferta de ações assistenciais voltadas ao combate do câncer como consultas, cirurgias, rádio e quimioterapia revela como, mesmo diante da determinação de manutenção desse tratamento durante a pandemia pelas autoridades sanitárias, a covid-19 impactou na garantia de atendimento às demais necessidades de saúde, confirmando a precarização das redes de atenção à saúde no estado do Rio de Janeiro.
“Sem novo aporte de recursos materiais e humanos, era esperado que uma rede tão subfinanciada e desorganizada não desse conta do acréscimo de demandas decorrentes da covid-19 sem prejudicar o atendimento das demais doenças”, observou.
A coordenadora lamentou que, a despeito de todos os esforços judiciais e extrajudiciais, o estado tenha enfrentado três ondas de casos de covid-19 sem um prévio e adequado planejamento. “Corre-se o risco de repetir o mesmo erro no caso de um quarto aumento de casos, provocado pela disseminação da variante Delta”, alertou.
A pesquisa indicou também o desabastecimento de Docetaxel - medicamento utilizado no tratamento do câncer de mama - em quatro unidades de saúde (26,6% das unidades). Foram relatadas ainda falta de analgésicos (6,7%) e de anestésicos (6,7%), ambos mencionados por apenas uma unidade cada um. Nas 15 unidades que responderam ao questionário, 80% informaram ter um Plano de Contingência criado para o enfrentamento do SARS-CoV-2, o restante dos representantes de unidades não soube responder. A Defensoria solicitou o envio do plano, mas apenas oito (66,6%) das doze unidades responderam até o momento da elaboração do relatório.
O estudo apontou deficiências na oferta de tratamento adequado para pessoas com câncer antes da pandemia. De acordo com a Defensoria, vistorias realizadas pelo Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) entre 2016 e 2019, consolidadas no levantamento, mostram que em 88% das unidades não existem leitos de cuidados. Já com relação aos leitos oncológicos, 44% das unidades afirmaram não possuir nenhum leito específico para casos de oncologia, sendo ofertados de acordo com a demanda. Além disso, 13 estabelecimentos afirmaram possuir leitos específicos, apresentando uma média de 20 leitos por unidade de saúde, variando de 6 a 77 leitos.
A Agência Brasil procurou a Secretaria Estadual de Saúde e o Instituto Nacional de Câncer (Inca), mas não obteve respostas até o momento da publicação desta matéria.
Fonte: Agência Brasil