Daniel, um policial de 40 anos, foi suspenso. Ele está sob investigação acusado de cometer atos violentos. Quando Sara, a pessoa com quem tem um relacionamento virtual, para de responder às suas mensagens, ele vai para o norte, embarcando em uma jornada aparentemente sem sentido. Mostra a foto de Sara, mas ninguém parece reconhecê-la. Até que um cara apareça e sob certas condições poderia fazê-los se encontrar. Essa é a trama básica de "Deserto Particular", de Aly Muritiba, que ganhou um dos prêmios do público na Giornate Degli Autori, a série de encontros com diretores do Festival de Veneza, um dos principais encontros de linguagem audiovisual do planeta.
No depoimento em que apresenta seu filme, Muritiba destaca o impacto do golpe de 2016 sobre sua geração, que segundo ele vive um momento particularmente dramático. Muritiba, que trabalhou como policial penal para pagar os estudos, reflete na trajetória pessoal as mudanças por que o Brasil passou, com a ascensão recente de jovens de regiões e camadas sociais até então fora da produção cinematográfica.
"Deserto Particular é um filme de encontros. Desde 2016, minha geração, formada após a ditadura, vive o momento mais dramático de sua existência. Após o golpe, o país afundou em uma espiral de ódio que culminou na ascensão de um fascista à presidência. Com a eleição de Jair Bolsonaro, todas as minorias, mulheres, indígenas, a comunidade LGBTQI+, os negros, são sistematicamente perseguidos e o país está dividido entre o sul conservador e o norte/nordeste progressista. Muitas vezes chegamos à beira de um confronto armado. Foi precisamente esse ódio que acabou sendo fundamental para decidir qual seria meu próximo filme. Eu sabia que ia fazer um filme sobre uma reunião. Em uma era de violência, eu queria fazer um filme de amor", explica Aly Muritiba.
Aly Muritiba nasceu em Mairi, uma pequena cidade na Bahia. A partir da experiência como policial, inspirou-se para fazer dois curtas-metragens e um documentário: "A fábrica", indicado ao Oscar; "Pátio", selecionado na Semaine de la Critique em Cannes; e "A gente", documentário estrelado por Muritiba e seu trabalho no sistema prisional.
Em 2015, apresentou "Tarântula" na seção Orizzonti, dentro da programação do Festival de Veneza. No mesmo ano, dirigiu seu primeiro longa-metragem, "Para minha amada morta" (Global Filmmaking Award/Sundance Institute 2013), exibido, entre outros, no Festival de Cinema de San Sebastian, na Espanha. Em 2018, foi a vez de "Ferrugem" ser pré-estreia em Sundance. Sua carreira na televisão também tem sido intensa, com séries feitas em parceria com a HBO, Globo, Netflix e GloboPlay.
Filmografia
2021 Deserto particular
2018 Ferrugem
2015 Para minha amada morta
2015 Parque Pesadelo (com direção de Francisco Gusso, Pedro Giongo)
2015 Tarântula (direção de Marja Calafange)
2014 Brasil
2013 Para pessoas
2013 Pátio
2011 A fábrica
2011 Circular (direção de Fábio Allon, Bruno de Oliveira, Adriano Esturilho, Diego Florentino)
2010 Reminiscências
2008 Com as mãos próprias