Passados 32 anos da decretação do Plano Collor, uma das primeiras medidas do recém-empossado presidente Fernando Collor de Mello foi a de confiscar o dinheiro da poupança de milhões de brasileiros, que só puderam sacar, naquele momento, até R$ 50 mil cruzeiros. Muitos tentam reaver na Justiça o dinheiro confiscado e, até hoje, não devolvido.
Há anos, diversas famílias lutam para sacar o próprio dinheiro, mas ainda não conseguiram por impedimento dos bancos. Os clientes acionaram a Justiça, mas até agora nada foi decidido. Algumas pessoas morreram sem receber nada. Filhos e netos ainda tentam sacar o dinheiro. Familiares não têm previsão de quando vão receber. Algumas instituições bancárias fizeram acordos com os clientes.
Hugo Hagge Filho, de 75 anos, morador de Arraial do Cabo, na Região dos Lagos, trabalhava como conferente no Cais do Porto, no Rio de Janeiro, quando teve seu dinheiro na poupança bloqueado pelo Plano Collor, em 16 de março de 1990. No final daquela década, entrou com ação na justiça para reaver o dinheiro, aconselhado por colegas de trabalho. Atualmente, seu processo corre na 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro e "não anda", segundo o aposentado.
“Estive na vara várias vezes e todo o sistema estava trancado. Não tive resposta nenhuma até agora. Não sei o que está acontecendo, pois, depois da pandemia, não consegui mais entrar no site deles. Esperança a gente sempre tem. Não sei qual é o valor, mas eu sou do Sindicato dos Conferentes do Rio de Janeiro e, lá, vários amigos meus já receberam o valor devido. Meu advogado não conseguiu entrar e agora está com a perna quebrada e não pode ir ao local. Vou voltar para verificar se já abriu e se há alguma resposta. Quando estive lá, na última vez, me falaram que a resposta sairia em um mês. Mas, aí, entrou a pandemia e já vai fazer dois anos que não sei de nada”, relata Hugo.
Em novembro de 2017, um acordo foi fechado com os bancos para encerrar quase um milhão de ações judiciais e os poupadores reaverem o dinheiro confiscado nos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990, como o Bresser (1987), o Verão (1989), no Governo José Sarney; além do Collor 1 (1990) e Collor 2 (1991), na gestão de Fernando Collor de Mello. Pelo acordo, em pouco tempo os poupadores seriam ressarcidos. Porém, isso não aconteceu. Na época, quem aceitasse o acordo teria de desistir do processo judicial.
A Advogacia-Geral da União mediou o acordo depois de treze meses de negociações. Por ele, teria direito ao ressarcimento somente quem já entrou com ação na justiça, não importando se coletiva ou individual. O poupador teria que comprovar, com algum documento, que tinha dinheiro depositado na época. Os primeiros pagamentos começariam no início de 2018. Em média, cada pessoa teria direito a receber R$ 10 mil. O valor total de indenização ficaria entre R$ 10 e 11 bilhões.
História
Quando a então ministra da Economia, Zélia Cardoso de Melo, apresentou o Plano Collor 1, em uma entrevista coletiva no dia 16 de março de 1990, explicou que "quem tinha mais de 50 mil cruzeiros na poupança ficaria com a quantia depositada em qualquer agência bancária junto ao Banco Central, sob a titularidade da pessoa física ou jurídica em forma de cruzados novos". Este valor seria convertido em cruzeiros após 18 meses. Os poupadores reclamaram, nas ações posteriores, que, na hora da troca dos planos, a remuneração da poupança não foi feita da forma devida, causando perdas. Os bancos dizem que seguiram as regras vigentes nos períodos.
O objetivo do plano era conter uma inflação de 84% ao mês. O pacote foi batizado de Brasil Novo e incluía, entre outras medidas de estabilização, a troca da moeda (de cruzado novo para cruzeiro, sem corte de zeros), a criação de um imposto sobre operações financeiras, o congelamento de preços e salários por 45 dias, o aumento das tarifas de serviços públicos (gás, luz e telefone, entre outros), a extinção de 24 empresas estatais e a demissão de 81 mil funcionários públicos.
Cerca de 80% do dinheiro aplicado, não só em cadernetas de poupança e em contas correntes, mas, também, em aplicações financeiras, como o famoso "Overnight", ficou retido no Banco Central por 18 meses. Estima-se que o governo tenha confiscado o equivalente a cerca de US$ 100 bilhões, o equivalente a 30% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.