Na última quinta-feira de abril (28), cerca de 60 trabalhadores - entre surdos e ouvintes - fizeram uma caminhada pelo campus Manguinhos da Fiocruz em celebração ao Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais (Libras) (24/04) e os 20 anos da Lei 10.436/2002, que a reconhece como meio legal de comunicação e expressão no país. Foi uma iniciativa dos próprios trabalhadores surdos que se organizaram e contaram com apoio da equipe do projeto Empregabilidade Social da pessoa Surda, coordenado pela Cooperação Social da Presidência da Fiocruz em parceria com o CVI-Rio e a Coordenação Geral de Gestão de Pessoas (Cogepe) da Fiocruz.
O coletivo de trabalhadores partiu da Biblioteca de Manguinhos, passando pelo Castelo Mourisco, Museu da Vida e parando em frente ao prédio de Bio-Manguinhos. A caminhada, que ocorreu durante o horário de almoço, tinha como objetivo dar visibilidade à demanda por ampliação da acessibilidade nos espaços de trabalho na Fiocruz: o que passa, necessariamente, pela integração dos profissionais surdos e não-surdos por meio de uma comunicação adequada.
“Nossa intenção foi mostrar que na Fiocruz temos muitos trabalhadores surdos que precisam ser vistos e ouvidos e que, embora tenhamos avançado bastante em acessibilidade nos últimos anos, ainda temos muito a fazer para garantir uma instituição totalmente acessível e inclusiva”, avaliou a Coordenadora do projeto, Luciane Ferrareto.
“Esperamos que a caminhada tenha sensibilizado as pessoas quanto à importância da Libras, da comunicação e para que todos e todas conheçam um pouco mais sobre a cultura surda e quem sabe se sintam estimulados a aprender essa língua”, completou.
O projeto Empregabilidade Social da Pessoa Surda, principal apoiador da ação, funciona desde 1994 com o objetivo de promover a inserção de trabalhadores surdos nas dependências da Fiocruz por meio de postos de trabalho e processos formativos. Atualmente, o projeto conta com uma média de cem trabalhadores surdos exercendo suas atividades em diversas Unidades técnico-científicas.
Heloísa Sardinha Garcia dos Santos, que participou da caminhada e atua há 26 anos como assistente administrativa no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), foi uma das primeiras trabalhadoras surdas a ingressar na instituição. Ela expressou um pouco da sua trajetória e avaliou como era essa acessibilidade quando chegou.
“Quase não tinha surdos na instituição. Os surdos mesmo se ajudavam. No médico, precisava chamar o intérprete e não tinha. É importante a consciência dos próprios ouvintes, precisamos de igualdade. O ouvinte e o surdo têm que ter possibilidades iguais. Não se evita o problema afastando-se dos surdos”, desabafou Heloísa.
Histórico do projeto
O projeto Empregabilidade Social da pessoa Surda, em parceria com o Museu da Vida e com apoio do Comitê Fiocruz pela Acessibilidade e Inclusão das pessoas com deficiência, tem oferecido cursos de Libras aos trabalhadores ouvintes da Fiocruz como estratégia para melhoria na comunicação nos ambientes de trabalho e no dia a dia entre os trabalhadores da instituição, sejam surdos ou não.
Luzia Fatima Gonçalvez Caputo, do Laboratório de Patologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), supervisiona Luciana de Silva Souza desde 1996. Contou que, com a convivência, Luciana a ensinou a se comunicar de forma diferente. Antes, Luzia não entendia o quanto a linguagem de Libras era importante. Para ela, era apenas uma forma de se comunicar com as mãos. A supervisora só foi entender sua relevância para um ambiente de trabalho saudável anos depois, quando se dedicou a aprender a língua. Com o tempo, percebeu que era fundamental fazer com que a Libras entrasse na rotina do laboratório. Desde 2010, vem se aprofundando e, aos poucos, viu a comunicação entre elas mudar.
“O projeto de Empregabilidade da Fiocruz é super importante porque oferece emprego a pessoas altamente capacitadas e que são ignoradas pela sociedade. Todo mundo acha que o surdo tem um problema intelectual e ele não tem. O problema não é dele, é nosso, que não sabemos nos comunicar adequadamente com eles. A sociedade tem que aprender Libras”, defendeu Luzia.
"A partir do reconhecimento legal da Libras, foi e continua sendo possível uma maior visibilidade da comunidade surda no país. Na Fiocruz, o projeto realiza intervenções e ações que mostram a pessoa surda no seu espaço de realização, do seu existir. Para isso, a equipe trabalha com a visão de que o incentivo à aprendizagem de Libras favorece uma visão de liberdade e respeito na convivência", manifestou Walkiria Pontes, psicóloga no projeto.
Fonte: Portal Fiocruz