O acesso à higiene menstrual é reconhecido como uma questão de saúde pública e de direitos humanos pela ONU (Organização das Nações Unidas). Mas, de acordo com dados do Banco Mundial, pelo menos 500 milhões de mulheres no mundo não têm condições adequadas para manter a higiene menstrual.
A presidente da Comissão de Valorização da Mulher da Fundação Ceperj (Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro), Noelma Faria, explica que a pobreza menstrual pode ser caracterizada em três pilares: falta de recursos, como absorventes e coletores menstruais; falta de condições adequadas de higiene, como banheiros em condições de uso, com água e sabonete, e conhecimento sobre o tema.
“As pessoas mais afetadas são todas aquelas de menor poder aquisitivo, como estudantes, pessoas em situação de rua, mulheres desempregadas e presidiárias, que não possuem condições de comprar os itens básicos de higiene, muitas vezes, encarados como produtos supérfluos", conta Noelma Faria.
A professora em obstetrícia Regina Rocco ressalta que a pobreza mestrual vai de 11 a 51 anos, período em que as meninas estão na escola e as mulheres no trabalho, e, diante da necessidade, elas acabam fazendo uso inapropriado de papel higiênico, panos, miolo de pão, toalhas velhas e até estopa, o que gera danos à saúde íntima de meninas e mulheres.
“Pode levar desde uma irritação em toda a vagina por dentro, por fora, causar inflamação da uretra, infecção urinária e até nos rins. Há ainda o risco de entrar no canal vaginal, atingindo até mesmo o interior do útero e as trompas”, explica Regina Rocco.
A saúde mental também pode ser comprometida, de acordo com a psicóloga e advogada Simone Coelho Aguiar, Coordenadora da Secretaria da Escola de Gestão e Políticas Públicas da Fundação Ceperj. Segundo ela a pobreza menstrual é um problema estrutural, que afeta em primeiro lugar o psicológico, principalmente, das crianças e adolescentes.
“Muitas meninas têm vergonha do corpo até por causa da própria idade, além de esbarrar na dificuldade financeira para comprar um absorvente, gerando um grande impacto psicológico e até mesmo um trauma que pode ser levado para a vida toda. Está na hora de todos prestarmos atenção nessas crianças e adolescentes, afinal não são elas o problema, mas sim a falta da atenção”, destaca Simone Aguiar.
Em enquete realizada pelo UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) em 2021 com 1,7 mil crianças e adolescentes que menstruam, ficou constatado que 62% já deixaram de ir à escola ou a algum outro lugar de que gostam por causa da menstruação, e 73% sentiram constrangimento nesses ambientes.
A advogada e membro da Comissão de Valorização da Mulher da Fundação Ceperj, Daniele Oliveira, revela ainda que “a pobreza menstrual pode ocasionar estresse, insegurança, vergonha, medo, contribuindo assim para aumentar a discriminação que meninas e mulheres sofrem na sociedade”.
Ela conta que a Comissão trabalha na arrecadação e doação de absorventes e coletores, engajando o público interno e externo a participarem da campanha, através de divulgações que conscientizam sobre a pobreza menstrual.
“A distribuição é feita para Centros de Referência Especializados em Assistência Social (CREAS) que atende meninas e mulheres vulneráveis. Essa é uma campanha que se soma a realização de palestras, simpósios e rodas de conversa sobre a importância de informações acerca do período menstrual e a forma de higienização feminina durante esse período”, completa Daniele.
Para a advogada criminalista Gisela França, que também integra a Comissão, a pobreza menstrual pode ser solucionada com uma série de medidas conjugadas.
“A problemática da pobreza menstrual possui causas socioeconômicas e decorre de uma defasagem na saúde pública. Políticas de distribuição de itens de higiene pessoal e menstrual em escolas, postos de saúde, hospitais, casas de acolhimento, prisões, orfanatos e outras instituições do gênero, campanhas de saúde e conscientização são fundamentais na luta pela liberdade menstrual de meninas e mulheres em nosso país”, conclui Gisela França.