"Estamos vivendo uma segunda abolição?", esta pergunta foi respondida e esclarecida pelo renomado historiador e jornalista Laurentino Gomes durante uma palestra on-line promovida nesta quarta-feira (19/7) pelo programa Humanitas, do Museu da Justiça.
Laurentino, autor da trilogia 'Escravidão' e ganhador de oito prêmios Jabuti, é reconhecido como um dos escritores mais influentes do cenário contemporâneo. Ele traça a história do Brasil de maneira franca e objetiva: apesar da abolição formal da escravidão em 1888, a estrutura socioeconômica do país permaneceu praticamente inalterada. Laurentino Gomes argumenta que a desigualdade, a pobreza e o analfabetismo persistem, e que a elite continua a defender seus privilégios, replicando a estrutura socioeconômica do fim do século XIX.
"O Brasil precisa confrontar a herança da escravidão para se desenvolver como nação. Se não abordarmos a questão do legado da escravidão, continuaremos a ser um país desigual e injusto", afirmou.
O problema da escravidão, segundo Laurentino, ainda deixa marcas hoje. Em uma sociedade que valoriza cada vez mais a tecnologia e o conhecimento humano, a população negligenciada e discriminada - que inclui a maioria dos afrodescendentes - está sendo deixada para trás. Para Gomes, essa negligência fica evidente ao observarmos as pessoas marginalizadas nas ruas das grandes cidades. Ele questiona quantos talentos foram privados da oportunidade de atingir seu pleno potencial.
Laurentino argumenta que o impacto da escravidão ainda ressoa no tecido social. O comportamento diário da sociedade, que inclui manifestações de racismo e discriminação, demonstra isso. "Porém, as redes sociais têm exposto mais o racismo e isso possui um aspecto positivo", ponderou.
Para exemplificar como a escravidão moldou a sociedade brasileira, Laurentino mencionou alguns dados impressionantes: "O Brasil foi o maior território escravocrata do hemisfério ocidental. Cerca de 4,9 milhões de pessoas escravizadas foram trazidas para o Brasil, o que representa 40% de todas as pessoas embarcadas nos navios negreiros", informou.
Diante de tantos problemas, deveríamos ser pessimistas? Para Laurentino Gomes, a resposta é não. O historiador afirma que o país precisa encarar a herança da escravidão para avançar como sociedade. E que, apesar das dificuldades do passado, é preciso ser esperançoso. Laurentino acredita que, como uma democracia, o Brasil tem a capacidade de corrigir essas injustiças históricas e lutar por um futuro melhor.
"Para mudar a realidade do país, precisamos de um 'bom sonho', uma visão coletiva para um Brasil mais igualitário e justo, onde todos tenham oportunidades de se desenvolver plenamente", concluiu.
Com o objetivo geral de promover o diálogo entre o Direito e outras áreas das Humanidades, o programa Humanitas - Ciclos de Diálogos Interdisciplinares do Museu da Justiça busca especificamente fomentar a cultura humanística, filosófica, científica e artística. Nesta 22ª edição, a palestra de Laurentino Gomes foi realizada em comemoração ao Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial (3 de julho), ao Dia do Nascimento de Nelson Mandela (18 de julho), e ao Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha (25 de julho).
Fonte: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro