Um espetáculo para saudar um dos grandes nomes da música, assim é ‘’Ismael Silva: Professor Samba’', uma homenagem a Ismael Silva (14/09/1905 ?14/03/1978), ilustre sambista carioca e que foi um dos fundadores da 'Escola de Samba Deixa Falar', em 1928 e que anos depois se tornaria a tão conhecida Estácio de Sá. A trama se desenvolve com o personagem apresentando ao público uma roda de samba, ambientada na lapa das décadas de 20 a 50, recheada de muitas histórias, muita música e a boa "malandragem", característica da boemia carioca na Lapa, contando suas aventuras e passeando por fatos importantes da cultura popular e do cenário histórico do Rio de Janeiro da época. A peça, com texto inédito de autoria de Ana Velloso, estreou dia 19 de setembro no Arena Sesc Copacabana e seguirá em cartaz até dia 20 de outubro.
Três atores se revezam no palco dando vida ao personagem título da peça, Edio Nunes, Jorge Maya e Milton Filho, dão vida a Ismael Silva e com muita versatilidade, ainda se desdobram em diversas figuras, contando a história do professor samba, contando a história do professor carioca, transitando por fatos importantes da sociedade no contexto da época em que o gênero se renova, resiste, luta contra preconceitos e permanece vivo e forte, tanto tempo após sua saída da Casa da Tia Ciata (13/01/1854 – 10/04/1924), para conquistar o mundo. E o teatro musical brasileiro é mais um espaço para que os grandes nomes da nossa cultura e do samba possam ser reverenciados.
“A transformação do samba, os blocos de carnaval, a virada para a criação da Escola de Samba, o pulsar da bateria, a criação da estrutura não só musical, mas de organização daqueles blocos, cordões, a evolução do maxixe para o samba, são sedimentações feitas a partir do envolvimento de Ismael e seus contemporâneos que transformaram o samba na potência do Rio, num estilo musical que transcende, que é estilo de vida, de cultura, e sociedade que desenha a figura da malandragem, da cabrocha, da cadência, do que se tornou símbolo não só do território fluminense, mas de um país, assim como o futebol, o Brasil é a terra do samba a partir dele e de outros artistas representados na peça. A cultura do povo preto que foi abraçada, mas que este mesmo povo sempre foi colocado de lado. Vidas e histórias como a dele, merecem ser contadas, cantadas e reverenciadas’’, diz Edio Nunes.
Edio ainda complementa dizendo que a peça também é uma forma de chamar a atenção, da sociedade para não esquecer de nomes tão importantes que ajudaram a transformar a cultura nacional, mesmo com o peso do estigma social e racial, batalhas travadas, ainda na atualidade:
“Esse espetáculo conta a história de um homem, artista, negro, favelado, que mostra que tem talento e que pode ter o espaço dele por merecimento, ser valorizado. Algo não tao distante da realidade atual. É o nosso caso, somos três artistas pretos, transitamos de maneira multifacetada pela arte. Eu, Jorge e Milton possuímos uma carreira extensa com mais trinta anos fazendo isso, e todos os dias temos que provar que podemos, que somos capazes, nada vem fácil, nós criamos, produzimos, colocamos espetáculos nos palcos, temos outros trabalhos além viver da arte para nos mantermos. Estamos sempre na corda bamba, lutando para manter-se de pé, com trabalho, com dignidade. Os aplausos acontecem, mas como os sambistas que interpretamos, vivemos a instabilidade, à parte. Para os artistas pretos, a luta é contínua. Ismael e os demais sambistas, artistas que vieram antes nós, já travavam essa batalha, de ser e viver da arte e deixar um legado. Defender a cultura e o pão de cada dia. Brigar para não cair no esquecimento’’, complementou o ator.
Para Ana Veloso, o espetáculo também tem como objetivo fazer uma reflexão sobre a descolonização dos corpos pretos. “Entendemos, Édio e eu, que precisávamos extrapolar o objetivo inicial, de contar a história do sambista do Estácio, que foi um dos criadores da primeira escola de samba. Queríamos traçar um paralelo entre passado, presente e futuro, discutir problemas humanos, enfatizar que corpos negros são corpos políticos, que não podem ser dissociados de sua realidade histórica, social e cultural. Para alcançar esse objetivo, inseri na dramaturgia traços da vida dos atores, que também compõem a cena, ajudando a contar a história de tantos “Ismaeis”, artistas brasileiros, negros, que dedicaram suas vidas à construção da nossa cultura”, pontua a autora e diretora.
Nascido em 1905 em Niterói, Ismael Filho, caçula de um cozinheiro e de uma lavadeira, mudou-se com a mãe e os quatro irmãos para o Rio de Janeiro após a morte precoce do pai. No Rio Comprido, bairro vizinho ao Estácio, o menino tornou-se o melhor aluno da escola. Começou na rua o interesse pelo samba. O primeiro, “Já desisti”, composto aos 14 anos. Muito jovem começou a frequentar os bares do Estácio, onde os sambistas se reuniam. Lá conheceu Francisco Alves, um dos principais cantores da época, que foi procurar o jovem para gravar seus sambas. O compositor aceitou a parceria, e ao lado de Nilton Bastos e Francisco Alves integrou uma das mais famosas parcerias da música popular brasileira, o trio “Os Bambas do Estácio”. Ismael foi um dos fundadores da 1ª Escola de Samba do Brasil, a Deixa Falar, em 1928, que depois virou a Estácio de Sá. Ismael tornou-se parceiro frequente de Noel Rosa, mas após a morte do amigo Noel, em 1937, Ismael passou por momentos de extrema dificuldade: foi preso por uma briga de bar, passou dificuldades financeiras e ficou um tempo isolado. A volta triunfal ocorreu em 1950, quando seu samba Antonico foi gravado por Alcides Gerardi, com grande sucesso. Nas décadas de 60 e 70 fez foi reverenciado por diversos artistas como Chico Buarque, Vinícius de Moraes e os integrantes do Zicartola. A vida de Ismael, cheia de altos e baixos, e sua obra genial, são a inspiração de nossa homenagem. Ismael morreu em março de 1978, aos 73 anos, deixando mais de 100 composições que fazem parte da nossa cultura musical.
Serviço:
“Professor Samba – Uma homenagem a Ismael Silva”
Até 20/10/2024
Quinta a domingo - às 20h
Teatro de Arena do Sesc Copacabana
R. Domingos Ferreira, 160 – Copacabana
Ingressos somente na bilheteria
Telefone: (21) 4020-2101
Duração: 80 Min.
Classificação: 14 anos.
Ingressos: R$ 7,50 (associado do Sesc), R$ 15 (meia-entrada), R$ 30 (inteira)