O presidente paraguaio, aliado próximo de Jair Bolsonaro, Mário Abdo Benítez, está sofrendo seu desgaste político mais significativo desde que assumiu o cargo há um ano. O motivo seria um acordo de energia com o Brasil denunciado por seu suposto sigilo e como uma entrega da soberania nacional.
O protocolo bilateral assinado em maio tornou-se de conhecimento público na semana passada e de forma abrupta desde que foi anunciado juntamente com a renúncia de Pedro Ferreira, presidente da empresa Administración Nacional de Electricidad (Anda).
Ferreira teria se recusado a assinar o protocolo, que estabelece novos termos para a contratação anual de energia da hidrelétrica de Itaipu, compartilhada pelo Paraguai e pelo Brasil.
O gerente técnico da Ande, Fabin Cáceres, também renunciou, depois que ele também se recusou a assinar o protocolo.
Cáceres disse à imprensa local que os técnicos do Ande haviam sido retirados daquela negociação com a Eletrobras e substituídos por representantes do Ministério das Relações Exteriores. Ele acrescentou que o acordo implicaria um custo adicional para o Paraguai de US $ 250 milhões.
A oposição reagiu imediatamente a uma questão sensível à população, como a usina hidrelétrica de Itaipu, maior geradora mundial de energia renovável e limpa, cuja construção exigiu inundação de grande parte do lado paraguaio e onde a maior parte da energia produzida vai para o Brasil.
O acordo também foi descoberto quando o governo de Abdo Benítez estava se preparando para a renegociação do Anexo C do Tratado de Itaipu em 2023, referente ao preço da energia que o Paraguai vende a preço de custo para o Brasil.
O Partido Liberal, o maior da oposição, acusou Abdo Benítez, do conservador Partido Colorado, de servidão ao presidente Jair Bolsonaro, e de assinar um acordo que é “extorsivo” e “escandaloso” aos direitos dos paraguaios.
Senadores da ala esquerda de Guasu expressaram a possibilidade de impeachment do presidente porque o protocolo foi assinado em segredo e sem informar o Congresso ou a população.
O governo criticou o embaixador do Paraguai no Brasil, Hugo Saguier, que liderou as negociações sobre o controvertido acordo em maio.
Saguier não apenas negou que houvesse uma “renúncia à soberania”, mas também assegurou que o protocolo é “o primeiro grande triunfo do Paraguai na negociação com o Brasil, visando alcançar o compromisso para 2023”.
O ministro das Relações Exteriores do Paraguai, Luis Alberto Castiglioni, e seu embaixador no Brasil, Hugo Saguier Caballero, renunciaram na segunda-feira, 29 de julho, na esteira das consequências desse acordo secreto de energia com o Brasil.
O governo argumenta ainda que a não divulgação de informações anteriores às negociações é comum, uma vez que ocorrem anualmente entre a Ande e a Eletrobras como parte da compra de energia da usina de Itaipu.
No entanto, devido a uma demanda feita pelos brasileiros, incluiu-se um cronograma com a contratação de energia da usina até 2022, algo que não havia sido feito até agora, já que o Paraguai fixa esse número anualmente.
Além disso, os montantes anuais de energia média aumentaram ao longo desse período de 1.370 megawatts (MW) em 2019 para 1.924 MW em 2022, o que também implica maiores gastos na compra de mais megawatts.
A oposição conseguiu trazer a seu território uma batalha em torno da suposta rendição da soberania energética como uma verdade imutável.
Essa discussão foi encaminhada ao Senado, que realizou uma sessão extraordinária na sexta-feira, durante a qual foram feitas críticas duras ao governo, principalmente sobre o “sigilo” das negociações.
A esse respeito, chamou a atenção o fato de que Abdo Benítez não mencionou este acordo em 1º de julho, quando compareceu ao Congresso para apresentar o primeiro relatório do governo.
Os senadores concordaram com a criação de um comitê de investigação ea audiência na segunda-feira do ministro das Relações Exteriores, Luis Alberto Castiglioni, o novo diretor da Ande, Alcides Jiménez, e o diretor do lado paraguaio de Itaipu, José Alberto Alderete.
Essa crise a menos de um mês do primeiro ano de Abdo Benítez como presidente, que prometeu transparência e o compromisso de que o Paraguai conduziria a renegociação decisiva de Itaipu com o Brasil em pé de igualdade.
Novas manifestações contra o acordo de compra de energia da usina de Itaipu serão realizadas nesta segunda-feira. Diferentes setores anunciam protestos e exigem que as autoridades revejam o protocolo bilateral assinado pelos representantes do Paraguai e do Brasil.