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Após cinco meses, intervenção federal não melhora a segurança no Rio

Segundo especialistas, falta investimento em inteligência

Por Anderson Madeira em 22/07/2018 às 10:55:24

Muita operação e pouco resultado, segundo especialistas (Foto: Fábio Costa)

A intervenção federal na área da segurança pública do estado do Rio de Janeiro, decretada em fevereiro pelo presidente Michel Temer, após reunião com o governador Luiz Fernando Pezão prometia trazer o Exército novamente às ruas, ocupar as comunidades e trazer uma sensação de segurança à população, assustada com o aumento nos índices da violência, principalmente na Região Metropolitana. Porém, passados cinco meses, se viu justamente o contrário.

Para José Ricardo Bandeira, presidente do Instituto de Criminalística e Ciências Policiais da América Latina, faltou investimento na tecnologia de inteligência no combate à violência.

"Estamos completando cinco meses da intervenção e nada de novo foi feito, pior, tem sido feito mais do mesmo. A intervenção somente repetiu que a Polícia do Rio vinha fazendo algumas décadas. A política de segurança pública está totalmente equivocada. Hoje temos a menor repressão policial. Gera dois fatores: aumento da mancha criminal, que se expande e se desloca no território e temos menos apreensão de armas, principalmente as de guerra, como fuzis e metralhadoras. Se temos menos polícia, temos menos apreensão de drogas, armas e munições no Rio. Um erro gravíssimo e de gestões passadas também, foi o não investimento em tecnologia de inteligência. Em 2017, O Rio gastou R$ 8 bilhões para gerir segurança pública durante um ano. Foram investidos em segurança pública menos de 20 mil reais. Como você quer ter capacidade de inteligência de investigação, se você não investe em inteligência?", questiona Bandeira.

De acordo com o especialista, a polícia é mal treinada e mal cuidada. "Quando os resultados aparecem são muito aquém do que poderiam esperar. Com o advento destas ocupações que a intervenção faz, usando o princípio da massa, com grande material bélico, o criminoso não reage. A intervenção é maior que o crime na comunidade. Ele se esconde espera a intervenção ir embora para sair. Daí o insucesso. Quanto mais você coloca o policial em confronto na comunidade, mais violência. Você tem policiais mal preparados, mal treinados e mal tratados pelo próprio Estado. A PM está adoecida. Você tem oito mil policiais em licença por ano em tratamento psiquiátrico. Policiais que desenvolvem transtornos de estresse pós traumático. Vivem em situação de guerra. Isso joga o policial contra a comunidade. Ele usa de mais violência que o necessário. O mesmo já está acontecendo com os militares nas Forças Armadas, nas ocupações", apontou Bandeira.

O Observatório da Violência, grupo criado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (CESeC/Ucam), corrobora a análise de Bandeira com o relatório "Muito tiro, pouco avanço", que mostra um balanço sobre os últimos cinco meses. Conforme o documento, nas 95 operações conjuntas do Gabinete de Intervenção houve 69 mortes.

O relatório citou a morte de um menino de 14 anos a caminho da escola, no Complexo da Maré, em 20 de junho passado, que teve grande repercussão e foi vítima da falta de planejamento da intervenção. Sem falar na execução da vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL), executada com vários tiros no Rio Comprido, em 14 de março, junto com o seu motorista, Anderson Pedro Gomes.

De acordo ainda com os dados do movimento, foram mobilizados 105 mil agentes, para um total de 280 operações monitoradas, parte delas só com a Polícia Militar ou a Polícia Civil presentes. Nem assim, os resultados foram animadores, segundo o Observatório. Ocorreram 4.005 tiroteios, mais do que 2.904 nos meses anteriores à intervenção. Aconteceram 28 chacinas, 119 pessoas mortas em chacinas, 46 agentes de segurança mortos, na maioria durante as folgas, 637 pessoas mortas no total e 536 feridos nos tiroteios. Ao todo, 260 armas foram apreendidas.

Segundo os dados do ISP de junho, ocorreram 375 homicídios dolosos (com intenção de matar), contra 390 no mesmo período de 2017, uma redução de 3,8%. O número de autos de resistência (mortes em confronto com a polícia) cresceram 59,8% em junho em relação ao mesmo período do ano passado.

Procurado, o Gabinete de Intervenção não quis comentar os dados, pelo fato deles serem "extra-oficiais". A reportagem também perguntou como ele via as 69 mortes ocorridas durante o período da intervenção, inclusive a de um garoto de 14 anos, uniformizado, no Complexo da Maré. Outras questões foram: O que falhou na intervenção? Quais foram os maiores problemas? Nenhuma delas foi respondida.

O general Walter Braga Netto, interventor federal da segurança no estado, divulgou na última quinta-feira, no Diário Oficial do Estado, o Plano Estratégico da Intervenção Federal. O documento apresenta diagnóstico, metas e métodos, entre outras informações. Entre os objetivos definidos, está a redução do número de crimes no estado, que não vem sendo verificada nos últimos meses.

O plano indica que dinamizar as práticas do setor, aumentar a eficiência administrativa e valorizar a dimensão humana dos agentes são algumas das linhas-mestras definidas. Com orçamento de R$ 1 bilhão, a intervenção segue em vigor até 31 de dezembro. Segundo o Gabinete de Intervenção, o plano já estava pronto desde 7 de junho, quando foi entregue ao presidente Michel Temer.

Em entrevista no último dia 4 à imprensa, Braga Netto declarou que a continuidade da intervenção em 2019, como quer o governador Luiz Fernando Pezão, é completamente desnecessária. " Se não, vocês vão ficar dependentes o resto da vida. Não vai sair nunca. A qualidade do policial civil e do policial militar é muito boa. Tem gente que dá problema? Tem, como emqualquer instituição. Ela precisa ser valorizada e o chefe tem deterliderança sobre a sua tropa", afirmou.

O general disse ainda que a intervenção está conseguindo melhorar a gestão na segurança pública e obtendo resultados. "O que foi dado inicialmente foi um choque de liderança e gestão que fez cair os índices. Quando começarem a chegar as aquisições, isso deve melhorar muito. A população brasileira é muito imediatista. Ela quer o resultado assim: começou a intervençãohojee, no dia seguinte, caíram todos os índices de criminalidade. Isso é paulatino", observou.

O interventor acrescentou ainda que após a intervenção, ficará uma equipe técnica que fará a transição e o legado. Ela está sendo treinada por Braga Netto. " Quando nós sairmos, eles vão continuar a transição. Nós estamos deixando esse planejamento pronto. Há necessidade de mantê-loe não deixar depois a segurança pública ser contaminada novamente por indicações políticas. Segurança pública tem de ser técnica, tem de ser por meritocracia", defendeu.

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