Cerca de 25 mil coalas morreram em uma ilha consumida pelas chamas. Espera-se que 10 mil camelos selvagens sejam baleados e mortos. Ao todo estima-se que um bilhão de animais tenham perecido em toda a Austrália.
Estes são alguns dos números que surgiram nos últimos dias a agonia vivida pelos australianos. Agonia esta resultante dos impressionantes incêndios, que mataram pelo menos 24 pessoas, destruiu mais de 2.000 casas e queimaram mais de 6 milhões de hectares. Uma área maior do que o Estado da Paraíba.
Os números que registram a morte em massa desses animais, viralizaram na Internet, causando apreensão e pesar.
Especialistas expressaram preocupação com a extensão de terra arrasada em um país com uma mega biodiversidade, que abriga entre 600.000 a 700.000 espécies, muitas das quais não são encontradas em nenhum outro lugar do mundo.
Kate Umbers, bióloga da Western Sydney University, que estuda o gafanhoto alpino australiano, está especialmente preocupada com o destino das 250.000 espécies de insetos do país, das quais apenas um terço foram descobertas.
“A atual temporada de incêndios é profundamente preocupante - muito pior do que qualquer coisa que já experimentei na minha vida”, afirma a bióloga. "É realmente muito assustador em um sentido ecológico."
Muitos especialistas alertam que ainda é impossível saber exatamente quantos animais morreram. Muitas das estimativas das manchetes se baseiam em suposições sobre o tamanho da população existente e no efeito de desastres naturais sobre elas. E eles não dão crédito ao instinto de sobrevivência dos animais.
Esse é o plano, sim. Mas não é por causa dos incêndios.
Autoridades da Austrália foram manchetes internacionais nesta semana, quando disseram que planejavam abater até 10.000 camelos selvagens depois que muitos dos animais, atormentados pela seca e pelo calor extremo, migravam cada vez mais do deserto árido para comunidades locais em busca de comida e água.
As comunidades aborígines que vivem nas terras de Anangu Pitjantjatjara Yankunytjatjara, no extremo noroeste do sul da Austrália, também conhecidas como APY, disseram que os camelos (e alguns cavalos selvagens) estavam danificando casas e outras infraestruturas da comunidade.
"Ficamos presos a condições quentes e desconfortáveis, nos sentindo mal, porque todos os camelos estão entrando e derrubando cercas, entrando nas casas e tentando beber água nos aparelhos de ar-condicionado", afirma Marita Baker, diretoria membro da APY. “Eles estão perambulando pelas ruas à procura de água. Estamos preocupados com a segurança das crianças pequenas; eles acham que é divertido perseguir os camelos, mas é claro que é muito perigoso.”
O país luta há anos contra uma população crescente de camelos selvagens que dizima espécies nativas, destrói plantas e danifica propriedades. Hoje, os camelos somam mais de um milhão e o governo estima que a população dobrará a cada nove anos.
Os camelos são rotineiramente mortos para gerenciar os números da população. Em 2010, o governo federal planejava abater cerca de 670.000 camelos selvagens em quatro anos.
“Um abate de 10.000 pode não ter um efeito significativo. Isso aliviará o comportamento de busca de água a curto prazo por cerca de um ano", disse Corey Bradshaw, pesquisador de ecologia da Universidade Flinders, em Adelaide. “Mas quando as condições melhorarem, eles aumentarão seus números rapidamente. Eles são bons produtores.”
Possivelmente. Esse número foi divulgado por Sam Mitchell, o co-proprietário do Parque da Vida Selvagem da Ilha do Canguru, em Ducan.
Em uma entrevista ao jornal inglês The Guardian, Mitchell estimou que a população total de coalas antes dos incêndios seria de 50.000.
De acordo com Sam Mitchell, "provavelmente mais da metade" dos coalas da ilha poderia ter morrido nos incêndios, mas que era "um jogo de adivinhação".
Os coalas não foram as únicas vítimas na ilha. Também há preocupações com o destino de uma subespécie de cacatuas negras brilhantes, das quais restavam apenas 300 a 370 na ilha antes dos incêndios.
Os coalas da Austrália – fofos e, em grande parte, indefesos diante de desastres naturais - costumam ser manchetes. Em novembro, depois de outro incêndio devastador, uma notícia amplamente divulgada de que a espécie foi dada como "extinta funcionalmente" viralizou. Tudo não passou de fakenews.
“Ao todo, estima-se que 30% da população de coalas tenha morrido”, disse Sussan Ley, Ministra do Meio Ambiente da Austrália.
Infelizmente, é o que parece. Mas não há um consenso.
Recentemente, o professor Christopher Dickman, da Universidade de Sydney, calculou que 480 milhões de animais teriam morrido por conta dos incêndios. Conforme os incêndios continuavam, o professor Dickman revisou essa estimativa para mais de um bilhão de animais mortos em todo o país.
Para atingir esse número, o professor Dickman se baseou nas medidas de um relatório de 2007 do World Wide Fund for Nature sobre o efeito do desmatamento na vida selvagem australiana.
Outros especialistas, porém, discordam das estimativas.
Colin Beale, ecologista da Universidade de York, disse à BBC que os instintos de sobrevivência dos animais entram em ação.
"Nas áreas da África em que trabalho, tenho certeza de que pouquíssimos pássaros morrem como resultado direto do fogo", disse ele. "Eles certamente têm a capacidade de fugir dos incêndios, e esse também é certamente o caso na Austrália."
O professor Bradshaw, da Universidade Flinders, em Adelaide, afirma ser perigoso compartilhar números gerais que não se baseavam em evidências.
"Não estamos dizendo que o número está errado, mas é inestimável", disse ele. "A mídia e o público em geral estão famintos por números, e ficam confusos, mas a realidade é que ninguém realmente sabe os números reais."
De acordo com o professor, animais podem se recuperar dessa devastação.
"Estamos constantemente surpresos como a recuperação acontece rapidamente após um incêndio e quantos animais sobrevivem".