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Justiça nega denúncia de calúnia contra presidente da OAB

Juiz da 15ª Vara Federal Criminal em Brasília não identificou 'animus caluniandi' na afirmação de Felipe Santa Cruz que Moro 'banca o chefe de quadrilha', ao dizer que sabe de conversa de autoridades fora das investigações

Por Cezar Faccioli em 14/01/2020 às 21:32:11

Acusado de calúnia contra Sergio Moro pelo Ministério Público Federal, o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, teve a denúncia contra si considerada improcedente pela Justiça Federal em Brasília Foto

O juiz da 15ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal, Rodrigo Parente Viana Beuttenmuller, indeferiu a denúncia do Ministério Público Federal contra o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz. No despacho, o juiz reconhece exagero nos termos usados por Santa Cruz para criticar a atuação do ministro da Justiça, Sergio Moro, ainda quando juiz da 13ª Vara Federal, de Curitiba, em particular na Operação Spoofing, um dos desdobramentos da Lava Jato.

O magistrado, contudo, sustenta que, mesmo contundente, a fala do presidente da OAB não teve intenção de caluniar Moro, apenas de criticá-lo. Ao afirmar que Moro "usa o cargo, aniquila a independência da Polícia Federal e ainda banca o chefe da quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas", o acusado extrapolou uma fala institucional, mas não teve intenção de imputar falsamente crime ao ministro, e portanto a denúncia de calúnia apresentada pelo MPF era inepta, não devendo ser-lhe dado prosseguimento. Em consequência, Beuttenmuller indeferiu também o pedido do MPF de afastamento de Santa Cruz da presidência do Conselho Federal da OAB.

Presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra, do Conselho Federal da OAB, Humberto Adami Santos Júnior saudou a decisão. Adami escreveu numa rede social que o magistrado não só ressalta que o presidente da Ordem reiterou a critica a Moro, como esclareceu que não ofendeu o ministro, nem teve 'animus caluniandi' em relação ao juiz da Lava Jato, quando disse que o mesmo 'tinha atos de chefe de quadrilha'. Adami parabenizou Felipe Santa Cruz e todos os advogados 'que todos os dias enfrentam esse mesmo tipo de postura'.

No despacho, Beuttenmuller nega seguimento à denúncia contra Felipe Santa Cruz por calúnia, diante das acusações de que Moro se comportou como chefe de quadrilha ao admitir o conhecimento de conversas de autoridades que não estejam sendo investigadas sob sua responsabilidade. Na peça, o magistrado começa por listar os argumentos do MPF, para sdepois rebatê-los no essencial, citando a jurisprudência, entre outros, do ministro Jorge Mussi, do Superior Tribunal de Justiça, em casos semelhantes. Seguem alguns dos trechos mais significativos do despacho da 15ª Vara, negando provimento à acusação:

"Analisando o caso aqui apresentado, segundo a inicial acusatória apresentada pelo Ministério Público Federal, o denunciado incorreu em ofensa à honra objetiva do Ministro da Justiça Sérgio Moro ao afirmar que este "usa o cargo, aniquila a independência da Polícia Federal e ainda banca o chefe da quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas".
Assevera ainda o MPF que a manifestação do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, em entrevista, "nada teve de "institucional", refletindo apenas a leitura pessoal do interlocutor quanto aos desdobramentos de uma operação policial [Operação Spoofing] cotejada a frações de informações publicadas pelos diversos meios de comunicação".

Sem adentrar no mérito da importância da OAB para o sistema democrático brasileiro, atuando como órgão apto e vocacionado a "defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis,pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas" (art. 44, I, Lei 8.906/94 – Estatuto da OAB), entendo que a manifestação do ora denunciado não se amolda a uma fala institucional, tendo o acusado extrapolado suas funções como Presidente da Ordem e exarado uma opinião pessoal acerca do caso e da conduta do Ministro da Justiça.
Contudo, mesmo com uma fala mais contundente, não vislumbro a intenção de o denunciado imputar falsamente crime ao Ministro da Justiça Sérgio Moro. Tal conclusão é reforçada pela manifestação do próprio acusado (Felipe Santa Cruz, presidente da OAB) em nota oficial pública, cuja transcrição é pertinente no momento:"

"Minha afirmação não teve, em qualquer momento, a motivação de ofender a honra do ministro Sergio Moro. Ao contrário, a crítica feita foi jurídica e institucional, por meio de uma analogia e não imputando qualquer crime ao ministro. Essa semana, no programa Roda Viva, da TV Cultura, reconheci que a analogia utilizada estava acima do tom que costumo usar, mesmo considerando os sistemáticos atentados contra preceitos do Estado democrático de direito que deram base à declaração.
De todo modo, como disse na entrevista, mantenho, no mérito, minha crítica de que o ministro da Justiça não pode determinar destruição de provas e que deveria, para o bom andamento das investigações, se afastar do cargo,
como recomendou o Conselho Federal da OAB."

Retomando, depois da transcrição, a linha de argumento anterior, Beuttenmuller se mostra peremptório: "Assim, demonstra-se cabalmente que o denunciado não teve intenção de caluniar o Ministro da Justiça (animus caluniandi), imputando-lhe falsamente fato criminoso, mas sim, apesar de reconhecido um exagero do pronunciamento, uma intenção de criticar a atuação do Ministro (animus criticandi), quando instado a se manifestar acerca de suposta atuação tida como indevida no âmbito da Operação Spoofing por parte de Sérgio Moro.
Desta feita, não vislumbrando o dolo específico para cometimento do crime de calúnia, entendo como atípico o fato narrado na denúncia."

Na conclusão do despacho, o juiz reafirma uma vez mais a improcedência das acusações contra Felipe Santa Cruz e do pedido do MPF de afastamento do acusado do cargo que ocupa, a presidência do Conselho Federal da OAB>

"Apesar dos argumentos expendidos pelo Ministério Público Federal, amparado por tais lições doutrinárias e jurisprudenciais, entendo que a conduta, no presente caso, como já exposto acima,é atípica, sendo a rejeição da peça inaugural acusatória a medida a se impor.
Por oportuno, é descabido falar em afastamento do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, tendo em vista a ausência de cometimento de delito no caso apresentado. Eventualpronunciamento acima do tom por parte de representante da OAB não deve ser motivo para seu desligamento temporário do cargo por determinação do Judiciário, cabendo à própria instituição avaliar, dentro de suas instâncias ordinárias, a conduta de seu Presidente, legitimamente eleito por seus pares, através do sistema representativo.
Ante o exposto, com fundamento no art. 395, III, CPP, rejeito a denúncia oferecida."

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