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Peças religiosas de matriz africana trocam Museu da Polícia pelo da República

Civil cede acervo apreendido entre 1889 e 1945, quando Código Penal legitimava incursões em terreiros de candomblé e umbanda

Por Portal Eu, Rio! em 10/08/2020 às 19:02:39

Participantes da primeira reunião sobre o destino das peças apreendidas pela Polícia entre 1889 e 1945, no Ministério Público Federal, em 2017 Foto Divulgação MPF

Após quase três anos de negociações mediadas pelo Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Civil do Rio de Janeiro assinou na última sexta-feira (7/8) o termo de transferência ao Museu da República do acervo de mais de 200 peças de religiões de matriz afro-brasileira apreendidas entre os anos de 1889 e 1945, quando o Código Penal Brasileiro legitimava a intolerância religiosa. A transferência das peças é uma conquista do movimento Liberte Nosso Sagrado, que trouxe ao MPF a notícia de que os itens que integravam a coleção estavam armazenadas de forma inapropriada no Museu da Polícia Civil.

As peças foram apreendidas em terreiros de candomblé e umbanda - em sua maioria durante a Primeira República e a Era Vargas - e guardadas na Repartição Central da Polícia, prédio que abriga hoje a sede da Polícia Civil. Naquela época, o Código Penal de 1890 definia como crime a “prática do espiritismo, da magia e seus sortilégios”.

O inquérito civil público foi instaurado em setembro de 2017, “com a finalidade de promover o acesso aos objetos sagrados, relacionadas às religiões de matriz africana, apreendidas sob a égide do Código Penal de 1890, e tombadas pelo Iphan conforme Processo 35-T-1938; apurar o seu recolhimento e armazenamento de forma inapropriada no Museu da Polícia Civil; bem como promover, em reparação histórica pelas violações de direitos, adequada exposição e produção de conhecimento, em contexto de valorização da cultura de matriz africana”. Desde então, o MPF buscou estabelecer o diálogo entre os religiosos, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Polícia Civil e museus interessados em receber o acervo.

Entre uma série de diligências com pedidos de informações e relatórios, especialmente junto ao Iphan para a avaliação do acervo, foram realizadas três reuniões entre as partes interessadas. Religiosos de matriz africana participaram de todo o processo para que fosse possível ter uma compreensão culturalmente informada sobre o destino que deveria ser dado às peças. A última reunião, em 19 de setembro de 2019, acertou os termos principais da transferência, com a conclusão da vistoria do acervo pelo Iphan e elaboração do diagnóstico de seu estado de conservação, a confirmação do Museu da República como destinatário das peças e o encaminhamento de tratativas sobre o transporte dos itens.

Há, ainda, outras questões a serem concluídas, como um novo nome para a chamada “Coleção Magia Negra”, já que o atual é discriminatório às religiões afro-brasileiras, e a ampliação do tombamento das peças, uma vez que foi constatado que foram incorporados itens ao acervo depois do tombamento. O Babalawo Marcio Alexandre Obeate Ifairawo, da tradição afro cubana de Ifá, da casa Ilê Ifá Obedande Ifairawo, saúda a transferência, mas lamenta a continuidade da perseguição religiosa no Brasil, e ressalta os componentes racistas dessa intolerância, em depoimento ao podcast do Portal Eu, Rio!

Por Portal Eu, Rio!

Fonte: Ministério Público Federal

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