Mais da metade (54%) dos alunos de todo o Estado do Rio de Janeiro enfrentam problemas de acesso à internet; desses, 10% não dispõem de nenhum tipo de conexão. Também um em cada dois alunos (49%) precisa compartilhar o uso do aparelho eletrônico (celular, tablet ou computador). Não mais que 12% conseguem acessar as aulas online; outros 27% apenas raramente. Apenas 1% dos estudantes recebeu, das escolas, chips pré-pagos; e 29%, material didático já impresso. Dentre aqueles que receberam material por meio digital, só 22% contam com impressora em casa.
Essas são algumas das conclusões da Diretoria de Pesquisa e Estudos de Acesso à Justiça da Defensoria Pública do Rio, que mapeou as dificuldades do chamado regime especial domiciliar de ensino do ciclo básico (que compreende a educação infantil e os níveis fundamental e médio) durante a pandemia de COVID-19.
— A pesquisa foi imprescindível para apoiar as ações da Defensoria Pública na defesa do direito à educação universal e de qualidade. Queríamos ouvir os interessados e aqueles impactados diretamente para planejarmos nossas ações — explica o coordenador de Infância e Juventude, Rodrigo Azambuja.
A dificuldade de compreensão do material didático oferecido no ensino a distância foi sentida por 67% dos estudantes, dos quais 40% nem sempre conseguem entender o conteúdo e 5% informaram ser impossível o entendimento. Além disso, metade das crianças e adolescentes também não contam com o auxílio de adultos para o estudo em casa. E 75% dos responsáveis pelos estudantes não tiveram nenhum tipo de orientação para tal.
O relatório da Defensoria é resultado da análise de respostas espontâneas, colhidas por formulário online, compartilhado principalmente por aplicativo de mensagens, de 6139 pais e alunos, entre 2 de junho e 2 de julho. Exatos 59% das respostas vieram de responsáveis por um ou mais estudantes.
— A pandemia provocou a reorganização de diversos serviços, dentre eles o educacional. A pesquisa tinha por objeto entender como essa reorganização afetou os alunos e o processo de aprendizagem. Podemos constatar inicialmente que faltou apoio aos alunos na oferta do ensino remoto — ressalta Azambuja.
Sete em cada dez alunos não receberam alimentos ou ajuda financeira para substituir merenda
As respostas à pesquisa indicam que 73% dos alunos não receberam nem alimentos nem ajuda financeira para substituir a merenda escolar. Na rede municipal do Rio, 56% não tiveram nenhuma compensação. No total, mesmo entre as famílias contempladas com algum tipo de ajuda, em 69% dos casos não cobriu as refeições que eram feitas na unidade escolar.
— Tentamos identificar o maior número possível de detalhes sobre as dificuldades do ensino remoto durante a pandemia, pois o objetivo é fundamentar a adoção de medidas coletivas que busquem o acesso universal e de qualidade aos serviços educacionais e aos programas suplementares, como de alimentação — destaca a diretora de Estudos e Pesquisas da Defensoria, Carolina Haber.
O levantamento também detectou que mais de 70% dos alunos da rede municipal do Rio de Janeiro e de Nova Iguaçu — ou seus responsáveis — querem a reposição de aulas presenciais. Em São Gonçalo, o índice chega a 80%. Em Niterói, a 88%. Na rede estadual, em diferentes cidades fluminenses, até oito em cada dez estudantes ou pais são favoráveis à reposição das aulas quando as escolas forem reabertas. Na média, 68% do alunato desejam rever, presencialmente, o conteúdo didático do chamado regime especial domiciliar de ensino. Apenas cerca de 9% são pelo cancelamento do ano letivo.
Dos 6139 formulários (já excluídas as duplicidades), 61,7% vieram de moradores do município do Rio. Duque de Caxias, São João de Meriti, São Gonçalo, Niterói, Belford Roxo e Nova Iguaçu foram as outras cidades com maior participação na pesquisa. Fora da Região Metropolitana, somente Volta Redonda participou com mais de uma centena de entrevistas enviadas.
A Ouvidoria foi o principal meio de divulgação do formulário que serviu de base ao relatório. A Defensoria recebeu respostas de cerca de dois terços dos municípios fluminenses, embora a adesão maior tenha vindo de pais e alunos de unidades das redes municipais, estadual, federal e privada estabelecidas na Região Metropolitana.
— Lançamos um canal de consulta às famílias sobre as reais condições de acesso às aulas e ao direito à educação, e divulgamos entre lideranças comunitárias e instituições de educação. O retorno foi muito positivo, nos indicando que estávamos certos na preocupação com os milhares de estudantes que sequer possuem máquinas e redes adequadas para o acompanhamento do ano letivo pela internet — afirma o ouvidor-geral da Defensoria, Guilherme Pimentel.
Cerca de 65% das entrevistas foram preenchidas por responsáveis ou por alunos filhos de pessoas cadastradas para o recebimento do auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal. Seis em cada dez entrevistados se declararam negros ou pardos.
Dentre os participantes do município do Rio, a grande maioria (87%) é moradora das Zonas Norte e Oeste. Na capital fluminense, um em cada três entrevistados informou morar em comunidade de baixa renda. Apenas 13% dos mais de 6 mil entrevistados estão matriculados ou têm filhos em escolas particulares.
Fonte: Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro