Com o caixa da prefeitura longe do poderio mostrado até meados de 2014, o município de Campos, no Norte-Fluminense, enfrenta uma das piores crises econômicas de sua história. O investimento da prefeitura ano que vem será apenas 4% dos R$ 249 milhões alcançados em 2016.
Dois anos foram suficientes para liquidar a capacidade de investir do município, pela soma dos efeitos da queda do preço do barril de petróleo e da crise financeira do Estado. A extensão territorial do município, o maior do Rio, e o contraste com os anos dourados do açúcar e dos royalties do petróleo acentuam a dramaticidade do quadro.
A decadência da cidade, uma das primeiras da América Latina a contar com iluminação pública a eletricidade, tal qual a força no começo do século passado, ganha contornos mais dramáticos nos anos 80.
O fechamento de quase todas as usinas de cana-de-açúcar na década de 80 e início da de 90 fez com que a economia da cidade passasse a ser baseada nos royalties do petróleo, responsável por mais de 75% da arrecadação da prefeitura. Como os altos valores pagos não resultaram em crescimento econômico, a crise atropelou o município, e o desemprego cresceu e segue em alta.
Economista da Agência de Inovação da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), José Alves de Azevedo fez uma comparação da receita total e dos investimentos da Prefeitura de Campos a partir de 2015. Segundo os números, em 2015 a receita total ficou em R$ 2,038 bilhões e os investimentos foram de quase R$ 146 milhões. Em 2016, a receita chegou a R$ 2,605 bilhões; os investimentos passaram de R$ 249 milhões.
Mas, em 2017, a receita total da Prefeitura de Campos caiu 38,02% se comparada aos dois anos anteriores. Com isso, os investimentos foram reduzidos em 98,15%. Até o final de 2018, a previsão da equipe econômica da prefeitura é que a receita alcance R$ 2,039 bilhões e os investimentos sejam de quase R$ 131 milhões - tudo por conta da queda no preço do barril de petróleo. Mas a crise estadual também causou prejuízos.
“Pode-se afirmar, baseado nos dados da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2019 do município, que o orçamento da prefeitura de Campos no ano que vem terá uma retração de 10,68% quando comparado a 2015, e os investimentos, uma queda de 96,18%”, analisou o economista.
Líder dos lojistas não identifica perspectivas de recuperação
Sindicato aponta 8 mil demissões de comerciários desde 2017
O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Campos, o empresário Joilson Barcelos, diz que não há perspectivas de crescimento. “O comércio está muito acanhado, e com a economia retraída não há perspectiva de crescimento”, analisa ele, que é dono da maior rede de supermercados da cidade. Como o município praticamente não tem indústrias, o comércio é a atividade econômica que mais emprega, seguido da Prefeitura.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Campos, Ronaldo Nascimento, em 2017, cerca de oito mil trabalhadores foram demitidos das lojas da cidade. “Já neste ano houve uma estabilizada, até porque o comércio está funcionando no osso. Se ocorrerem mais demissões as lojas fecham por falta de funcionários”, ironiza o líder sindical.
Saúde sofre com baixa na atividade
A crise também chegou com força à saúde. Segundo o presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de Campos, Carlos Morales, hospitais filantrópicos como Plantadores de Cana, Santa Casa de Misericórdia e Beneficência Portuguesa ainda não conseguiram pagar o 13º salários do ano passado aos seus funcionários. A Beneficência Portuguesa e Santa Casa constantemente atrasam salários. A Santa Casa tenta resolver os atrasos com um empréstimo junto a uma cooperativa de crédito. Em algumas Unidades Básicas de Saúde da prefeitura faltam medicamentos, mesmo quadro encontrado nos hospitais da prefeitura, Hospital Geral de Guarus e Hospital Ferreira Machado.
A Prefeitura também cortou programas sociais como o Cheque Cidadão, que garantia R$ 200 mês a famílias de baixa renda, pôs fim à passagem social que era de R$ 1 – passou para R$ 2,75. Também na prefeitura, quem recebe no regime de RPAs vive reclamando de constantes atrasos, que podem chegar a três meses. Além disso, empresas de ônibus também devem salários, e as escolas particulares amargam atrasos nas mensalidades.
Nem mesmo o início da safra sucroalcooleira prevista para julho anima o presidente da CDL. A previsão é de que as quatro usinas do estado – três em Campos – moam 1.2 mil toneladas de cana, o que representa 20% a mais do que a safra passada. O aumento é atribuído às chuvas deste ano, já que nos últimos quatro anos os produtores enfrentaram uma longa estiagem. De acordo com o presidente da Cooperativa Agroindustrial do Rio de Janeiro (Coagro), Frederico Paes, a safra 2018 será mais curta, por causa do volume de cana menor.
Prefeitura aposta em geração de renda
Em nota enviada ao Portal Eu, Rio! A Prefeitura de Campos afirmou que “vem desenvolvendo ações visando à geração de trabalho e renda, através de iniciativas em várias áreas, como a agricultura, por exemplo, como projetos como o Mais Frango. Outra proposta, desenvolvida pela gestão do prefeito Rafael Diniz é o incentivo à economia criativa e ao empreendedorismo, como a Casa do Empreendedor e através de projetos de artesanato, como a Feira Mãos da Sabedoria. O Fundo de Desenvolvimento do Município de Campos (Campos) oferece várias linhas de financiamento que fomentam a economia, também, gerando emprego e renda: Fundecam Agricultura Familiar (equalização Pronaf), Fundecam Inovação (financia processos de inovação em média e pequenas empresas), Fundecam Economia Solidária (CataSol) e Fundecam Empreendedor”.
Ainda segundo a nota, “dentro do projeto Caravana para além dos royalties, foi lançado no ano passado o Programa Tomatec, desenvolvido pela Embrapa, em parceria com a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, o grupo de produtores rurais Fórum AgroNorte e a Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária (Pesagro). Outra iniciativa que vai movimentar a economia e gerar empregos é a transformação das instalações da antiga Ceasa em um Polo Agroalimentar”.
A nota diz que “o prefeito Rafael Diniz recebeu no último dia 13, no auditório da Prefeitura, uma equipe da GNA (Gás Natural Açu), subsidiária da Prumo Logística SA, que opera o Porto do Açu, em São João da Barra. O Espaço da Oportunidade, vinculado à Superintendência de Trabalho e Renda, está com oferta de vagas de emprego”.
Ainda segundo a nota, “com a crise financeira que o país atravessa, a Prefeitura de Campos não tem medido esforços para manter o atendimento à população, em diferentes áreas, e ainda manter em dia todos os compromissos da administração municipal. A prefeitura está buscando regularizar o pagamento dos prestadores de serviço em regime de Recibo de Pagamento Autônomo (RPA). Os salários dos servidores estatutários estão em dia e os valores referentes a maio foram feitos antecipadamente”.
A Prefeitura de Campos conclui afirmando que com “as dificuldades financeiras são decorrentes de R$ 1 bilhão a menos na arrecadação do município, assim como do pagamento de dívidas contraídas pela gestão passada, que totalizam R$ 2,4 bilhões. Somente à Caixa Econômica Federal, desde janeiro de 2017, já foram pagos R$ 72 milhões referentes às parcelas do empréstimo de R$ 1,3 bilhão conhecido como “Venda do Futuro”. Além disso, o governo também paga R$ 4 milhões mensalmente relativos a uma dívida de R$ 180 milhões da administração anterior com o Previ Campos, instituto de previdência dos servidores municipais”.