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Os brasileiros redescobriram Portugal em busca de qualidade de vida

Em 2017, o país emitiu mais de dez mil vistos de nacionalidade para imigrantes oriundos do Brasil

Por Jonas Feliciano em 02/09/2018 às 16:53:33

Portugal tem sido escolha de brasileiros para morar fora do país (Foto: Pixabay)

A crise política e econômica do Brasil tem levado muita gente a desistir do país. Desesperançosos com as mudanças que residem apenas no campo das promessas, esses cidadãos tem escolhido a imigração como uma das principais alternativas para fugir de fantasmas como o desemprego e os altos índices de violência das cidades brasileiras.

Neste contexto, Portugal se tornou um dos destinos. De acordo com dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), relativos aos números de 2017, aproximadamente 85 mil imigrantes brasileiros vivem em território português. Um total que corresponde a maior comunidade estrangeira do país.

Nos últimos cinco anos, os relatórios estatísticos anuais produzidos pelo SEF revelam o aumento do número de pareceres positivos de nacionalidade emitidos para brasileiros. O governo português tem incentivado a vinda de migrantes para desacelerar o declínio da população ativa  que, atualmente, apresenta um baixo índice de natalidade e um grande número de idosos.


Imagem: Jonas Feliciano

O músico Christian Venieris, 32, é alguém que se aventurou em terras lusitanas. De agosto a meados de setembro do ano passado, motivado por uma oportunidade de trabalho em sua área profissional e, após uma demissão, ele decidiu arriscar e aproveitar a disponibilidade que tinha no momento.

"Eu nunca havia viajado sozinho para o exterior. Foi bem legal e uma experiência positiva. No pouco tempo que fiquei, consegui arrumar um trabalho, mesmo não sendo formal. Fiz amigos portugueses e brasileiros. Aliás fui muito bem recebido", contou o músico.

Segundo ele, a sua motivação inicial acabou não acontecendo. Ainda assim, continuou no país, mas a solidão e o descuido com a previsão orçamentária foram determinantes para o seu retorno.

Foto: Arquivo pessoal/Christian Venieris

"Posso dizer que a minha decisão de viajar foi meio louca, mas sem filhos é mais tranquilo. É impressionante como as coisas por lá funcionam. Na verdade, fui para morar, mas a saudade da minha mãe e dos meus amigos foi muito grande, além de outros problemas pessoais. Acabei decidindo voltar", relatou Christian.

“Quem chega precisa ser humilde e se adaptar a cultura do outro”

Depois de uma vida inteira morando em Petropólis, Nayra Nunes, 31, e o marido decidiram mudar de ares, ou melhor, de nação. O casal trocou uma vida estável na bela cidade da região serrana do Rio de Janeiro para buscar um lugar com mais oportunidades e segurança. Um local onde pudessem oferecer uma melhor qualidade de vida aos filhos.

A partir disso, em dezembro de 2017, começaram a planejar essa transição. Juntos, pesquisaram em vídeos nas redes sociais sobre documentação, custo de vida, melhores bairros e outras informações essenciais para a mudança. No meio do planejamento, um imprevisto motivou ainda mais a decisão: Nayra ficou grávida.

“Apesar de ser um lugar bom para viver, Petropólis é uma cidade cara e sem grandes oportunidades. Para crescer é preciso ir para o Rio, mas essa alternativa nos assustava devido à violência da capital. Confesso que quando descobri que estava grávida fiquei com alguns receios, mas pensando no futuro da nossa filha, decidimos seguir um novo caminho e uma nova experiência de vida. Hoje, temos a consciência de que se não der certo, voltamos. No entanto, acredito que daqui não sairemos mais”, contou Nayra.

Em julho deste ano, após 7 meses de organização, Nayra e o companheiro partiram na sua aventura. Venderam móveis, carro, moto e juntaram um dinheiro suficiente para se manterem no caso de qualquer emergência. Eles chegaram à Portugal com visto de turista e com a ideia de regularizarem a imigração no próprio país por meio de contrato de trabalho.


Nayra Nunes trocou Petrópolis pelas terras lusitanas (Imagem: Arquivo Pessoal)


“Antes de chegarmos, já sabíamos sobre as oportunidades e como os imigrantes podem começar no que chamam de “sub-empregos”. Entretanto, viemos dispostos a trabalhar. Muitas vezes, são essas chances ou sufocos que vão abrir às portas para um contato de trabalho e para dar entrada na regularização pelo SEF”, contou a brasileira.

Neste pouco tempo, em território lusitano, ela ainda acrescentou que mesmo falando inglês fluente, o seu marido virou uma espécie de motoboy de aplicativo e já tem em vista uma promessa de contrato. Já sobre as documentações, Nayra disse que em uma semana conseguiu tirar todos os documentos importantes, bem como, abriu uma conta bancária.

Para ela, é preciso uma previsão financeira e também uma consciência com os gastos, pois se o imigrante não se programar e sair gastando de uma vez, no primeiro aperto vai ter que acabar voltando para o Brasil.

De acordo com Nayra, há muitos brasileiros imigrando sem planejamento nenhum, passando fome, sem ter lugar para dormir e pedindo ajuda para voltar porque não se programou. Além do mais, é difícil alugar um imóvel, pois os portugueses pedem um valor antecipado. Em alguns casos, exigem até um ano de aluguel.

Todavia, nem tudo é só perrengue. Entre as boas surpresas, a nova imigrante ficou admirada com alguns serviços públicos oferecidos no país.

 “Umas das coisas que mais me surpreenderam foram os sistemas de educação e saúde. Aqui, as crianças desde cedo aprendem o inglês e em determinado período podem escolher outra língua estrangeira. Na saúde, fui muito bem atendida. Eu estava preocupada com a gestação no exterior, mas fui surpreendida. Em Portugal, gestantes não pagam exames ou consultas. A médica que me atendeu foi muito atenciosa e ouviu minha história. E olha que não era um hospital, mas um centro de saúde. Já me falaram que não são todos os hospitais e escolas que são maravilhosas, mas a minha experiência inicial foi nota dez”, relatou.

A brasileira também falou das suas impressões da cidade e dos habitantes. Ela observou que Lisboa não é tão limpa quanto imaginava, disse que viu muito lixo no chão, além de uma quantidade de poeira que não estava acostumada. Já em relação aos portugueses, desmistificou alguns preconceitos.

“Já conheci alguns países e cidades do mundo. Sinceramente, achava que por ser na Europa, Portugal iria ser mais limpo. Porém, não é bem assim. Dizem que a poeira é característica da época, pois faz dois meses que não chove. Outra coisa, é que me assustaram muito dizendo que os portugueses eram ignorantes e grossos. Ainda não conheci nenhum assim. Só encontrei português que nos ajudou. Acho que isso deve está ligado à humildade, quem chega precisa ser humilde e se adaptar a cultura do outro”, relembrou.

Planejar, re-planejar e planejar de novo

Independentemente das histórias, não resta dúvidas: é preciso planejamento e organização financeira para tomar uma decisão tão radical. Embora nos últimos tempos a política de imigração portuguesa tenha facilitado os processos administrativos, no ano passado um Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo também elaborado pelo SEF, apontou que houve um recorde de 1.336 brasileiros impedidos de ingressar em Portugal. Em 2016, foram devolvidos 968 brasileiros.

Para não ser barrado ou ter que tentar sobreviver ilegalmente num lugar desconhecido, é necessário estar preparado para os imprevistos e todas as despesas primordiais.

Em setembro, a carioca Malena Ramos é mais um brasileira que vai deixar o país. Segundo ela, a ideia surgiu quando começou a buscar as documentações de seus familiares portugueses para tentar a cidadania e também foi motivada pela busca de um lugar mais tranquilo para se viver.

Malena entrou com um processo para garantir a sua cidadania, porém não esperou o deferimento do consulado português para adiantar a sua viagem.

"Como eu já pensava em fazer um mestrado, decidi adiar a minha ida. Por isso, fiz uma pesquisa minuciosa nas instituições, li sobre todas as documentações e exigências, escolhi o local e me inscrevi no processo seletivo. Fui aprovada para a Universidade de Minho, em Braga", contou a carioca.

Entretanto, Malena relembrou da importância do planejamento não só documental, mas também financeiro numa decisão que envolve tantas mudanças.

"No ano passado, quando fui demitida, eu procurei não me vincular a nenhum outro emprego, pois já pensava nesta viagem. Dessa forma, mantive uma organização financeira pensando nos custos futuros que serão em euros. Elaborei uma planilha levando em consideração todos os possíveis gastos. Afinal, se alguém  almeja mudar de país, é necessário que o planejamento ande do seu lado. Hoje em dia, muita gente fala qualquer coisa nas redes, mas cada detalhe deve ser cumprido corretamente, bem como, respeitadas as legalidades", alertou Milena.

Ela também recorreu a um serviço de consultoria. Hoje em dia, essa é uma ferramenta utilizada por muitos interessados em imigrar para outros países.

Gustavo Strobel, consultor e diretor da Strobel & Santos Consultores Associados, é um especialista no assunto. Sua empresa já enviou mais de 600 famílias para Portugal. Segundo ele, hoje, há uma grande procura pelo país.

“Muita gente tem procurado Portugal como se lá fosse um nirvana e não tivesse pontos negativos e positivos. Elas esquecem que não é bem assim, esquecem até de se planejar. O ideal é que, antes de partir, o indivíduo tenha um capital suficiente para se estabelecer. Afinal, por lá, as coisas são muito mais lentas. É possível, por exemplo, que o tempo para conseguir o aluguel de um ponto comercial demore até 3 meses. A cultura portuguesa é mais lenta e receosa para negócios”, alerta Gustavo.

Para ele, também é fundamental ter um bom dinheiro guardado, além do título e o visto de residência solicitado quando o imigrante ainda estiver no Brasil.

“Eu diria que para ter uma vida confortável em Lisboa é necessário cerca de mil euros por mês. Não aconselho que as pessoas viajem com menos de 6 mil euros para viver durante um semestre. Quem está se aventurando acaba se submetendo a empregos ruins porque não possui as documentações exigidas. Para imigrar com sucesso, é importante ter uma boa reserva financeira e entender que a Europa tem um perfil econômico diferenciado. Em torno de 70% dos meus clientes que tentam empreender em Portugal acabam desistindo ou se transformando em empregados”, relembra o consultor.

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