Segundo um relatório emitido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil já se destacava, antes mesmo da Covid-19, como um país com números alarmantes relacionados a casos de ansiedade e depressão. Com a pandemia, o cenário ficou ainda mais devastador, já que ela trouxe às pessoas uma série de fatores, problemas e questionamentos que só contribuíram para o aumento exponencial destes transtornos. “Neste momento, a situação é ainda mais delicada, uma vez que somos o epicentro da doença no mundo. A saúde mental da maioria das pessoas já estava comprometida. Agora, então, o que a gente mais percebe, como médico, é uma onda generalizada de dor e medo, chegando ao desespero, em alguns casos. Tudo isso culmina em diversos transtornos mentais, por isso é importante ficar muito atento aos primeiros sintomas destes desequilíbrios”, explica o médico Jean Rafael, um dos mais renomados palestrantes brasileiros sobre Gerenciamento do Estresse e autor do livro “A Ciência da Gratidão - Como prevenir as doenças da mente e aplicar o gerenciamento de estresse”.
Diversos outros aspectos se juntam a este cenário, como questões econômicas e inúmeras informações desencontradas que nos fazem sentir no deserto em busca de um oásis. “Este é um ótimo comparativo – sabe aquelas histórias de pessoas que saem pelo deserto procurando água e quanto encontram percebem que aquela visão não passava de uma miragem? É isso que tem acontecido com as pessoas quando elas se pegam em um fio de esperança e logo depois percebem estarem de volta ao estado de sofrimento”, compara Jean. Ele ainda lembra da dor de quem perdeu um amigo ou um familiar para a doença como um momento ainda mais difícil. “O que precisamos é compartilhar conhecimentos que façam a diferença na vida das pessoas e possam ajudá-las a enfrentar estas situações”, sugere o médico.
Jean há mais de um ano atua treinando os profissionais da área de Saúde que estão na linha de frente do combate à doença. No começo da pandemia, ele organizou um grupo com caráter social para ajudar e compreender as pessoas, levando conhecimento e treinamentos diários. “Meu objetivo sempre foi levar força e esperança para as pessoas do grupo. Isso não só para ajudar no enfrentamento da doença, já que muitos estavam em fase de recuperação quando faziam as aulas diárias online. Eles davam seus depoimentos e compartilhavam angústias e tristezas, mas também celebravam a superação de momentos adversos. Fiquei encantado com o quanto as pessoas estavam, mesmo diante de tanta dor, seguindo com uma força que só me lembro de ter encontrado quando busquei apoio em um grande autor médico que superou os campos de concentração nazista, Viktor Frankel, pai da Logoterapia e autor do best seller ‘Em busca de um sentido’. Foi com o auxílio de seus postulados que pude me superar quando fiquei doente, com depressão severa, há alguns anos”, lembra Jean. O autor diz em sua obra que “se temos um sentido existencial e estamos conectados a ele, somos muito mais fortes”.
Jean Rafael. Foto: Divulgação
No grupo das aulas gratuitas de autoconhecimento, Jean trabalhou - e ainda trabalha, agora em reuniões virtuais semanais - com diversas atividades junto aos participantes de várias regiões do Brasil. Nestes encontros, ele trata de situações como:
Aceitação e compreensão do momento atual
Não se trata de uma aceitação passiva, de quem nada faz para mudar a situação, mas sim de enxergar a realidade com a capacidade de encontrar soluções. A ideia é usar a criatividade e exercitar a paciência diante do que todos estão enfrentando. “Vi muitos participantes que, após esta atividade, conseguiram encontrar maneiras de enfrentar e resolver conflitos, compartilhando ideias fundamentais para a execução do que se propunham”, conta Jean.
Desenvolvimento do campo mental da prosperidade
Estes exercícios provocaram no grupo uma abertura positiva para o dia a dia, melhorando a execução de projetos. “Uma mente próspera pode ser o primeiro passo para nos tornarmos mais otimistas, e isso vem com muito treinamento. Utilizamos recursos como a meditação para perceber como nosso funcionamento destrutivo está presente em nossas ações. Aos poucos, vamos ressignificando a cadeia de sofrimento”, explica.
Concentração
A concentração é primordial para trazer a mente para um estado de presença, pois o pensamento ansioso está buscando sempre o futuro e repetindo um verdadeiro filme de terror: “Será que vou pegar esse vírus?”, “Estou no sexto dia de sintomas, será que amanhã vou piorar?”, “Será que vou conseguir pagar minhas contas?”. Estas eram perguntas frequentes dos participantes nas aulas. Segundo Jean, viver assim de forma repetitiva gera uma cascata de estresse que faz com o corpo comece a falhar. “Se não intervirmos neste processo, algo como adoecer (o que não era para acontecer) começa a se desenrolar já na cabeça, por isso o treino da concentração auxilia muito os participantes”, garante.
Momentos de relaxamento
Nestes exercícios, os participantes recebiam uma nova carga de bateria. Essa necessidade ocorria, segundo o médico, provavelmente, por estarmos respirando muito mal. Com isso, ele explica que perdemos nosso combustível vital, que é o oxigênio. “Quando respiramos melhor, nosso estado de tensão diminui, levando à melhora de sintomas”.
Acolhendo o medo e ressignificando em ação
Por último, Jean deixa uma dica que considera uma das mais importantes para lidar com a ansiedade e o medo do momento pelo qual estamos passando: nos dar a oportunidade de acolher nossos sentimentos, sem negá-los. “Aprender isso favorece a construção da resiliência e da serenidade, comportamentos que geram uma força incrível na prevenção de doenças emocionais”, finaliza.