Em que pese o aumento astronômico da dívida pública (que bateu R$ 5 trilhões em 2020), por conta da pandemia, o resultado primário do governo central (que compreende Previdência, Banco Central e Tesouro Nacional) apresentou, em março último, superávit fiscal de R$ 2,1 bilhões, de acordo com estudo divulgado, nessa quinta-feira (29), pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN).
Esse resultado contrariou previsão da pesquisa Prisma Fiscal do Ministério da Economia, que projetava um déficit de R$ 30 bilhões, pois, em igual mês do ano passado, o déficit primário chegou a R$ 21,1 bilhões. Ainda assim, como reflexo da crise sanitária ainda a ser debelada, enquanto o Tesouro e o Banco Central (BC), juntos, foram superavitários em R$ 22,1 bilhões, a Previdência amargou um déficit de R$ 20 bilhões.
Durante a divulgação, o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, procurou tranquilizar o mercado quanto à operacionalidade da máquina pública, que deverá continuar funcionando, mesmo com o veto de R$ 19,8 bilhões em gastos e do bloqueio temporário de R$ 9,2 bilhões no orçamento deste ano. Desse modo, ele admitiu que o risco de shutdown (paralisação da máquina pública) em 2021 é “baixo, perto de zero”, mas que este poderá ser "o ano mais difícil para a execução orçamentária".
Superávit consolidado
Quando considerado o acumulado do ano, o resultado de março consolida um superávit primário de R$ 24,4 bilhões, em contraste com o déficit de R$ 2,9 bilhões registrado em 2020, em termos nominais. Esse resultado positivo reflete o superávit de R$ 81,6 bilhões (Tesouro e BC) contra um déficit de R$ 57,1 bilhões da Previdência Social (RGPS), este último, como reflexo de despesas crescentes do setor público durante o período pandêmico.
Na comparação com março de 2020, o resultado primário decorre da combinação de um aumento real de 21,3% (+R$ 20,8 bilhões) da receita líquida, face a um decréscimo real de 3,1% (-R$ 3,7 bilhões) das despesas totais.
Com o número de março, o primeiro trimestre apresentou superávit primário acumulado de R$ 24,4 bilhões, ante um déficit de R$ 2,9 bilhões no mesmo período de 2020 (em termos nominais). Esse resultado – o melhor para o mês, desde 2014, quando ficou em R$ 4,257 bilhões – é composto por um superávit de R$ 81,6 bilhões do Tesouro Nacional e do Banco Central e por um déficit de R$ 57,1 bilhões na Previdência Social (RGPS).
Receitas administradas em alta
A explicação do Tesouro é que o aumento de receita líquida deriva, sobretudo, do crescimento das receitas administradas (+R$ 18,4 bilhões), da arrecadação extraordinária de IRPJ/CSLL (+R$ 4,0 bilhões), assim como da elevação da arrecadação relativa à estimativa mensal, do balanço trimestral e declaração de ajuste anual (IRPJ/CSLL), como também do comportamento dos tributos sobre o comércio exterior.
No que toca ao acumulado até março deste ano, a receita líquida teve aumento de 7,6% (+R$ 26,4 bilhões), enquanto a despesa total encolheu 0,4% (-R$ 1,5 bilhão). Entre os fatores componentes da receita, destaque para as administradas (+R$ 28,5 bilhões), as não administradas pela Receita Federal (+R$ 4,2 bilhões), sem contar as transferências por repartição de receita (+R$ 5,8 bilhões) e redução na arrecadação líquida para o RGPS (-R$ 0,3 bilhão).
Abono e seguro em queda
Pelo lado das despesas primárias, estas resultaram de reduções nos pagamentos de abono e seguro-desemprego (-R$ 2,9 bilhões), resultante da antecipação de parcela do abono salarial de março para fevereiro de 2021), de despesas discricionárias (-R$ 2,5 bilhões) e de despesas de Pessoal e Encargos sociais (-R$ 1,2 bilhão), parcialmente compensadas pelo aumento no pagamento de créditos extraordinários (+R$ 4,0 bilhões).
Ainda quanto à despesa, no primeiro trimestre de 2021, o destaque ficou com a redução de R$ 7,1 bilhões das despesas discricionárias, por sua vez influenciadas pela não aprovação do orçamento e pela execução mensal no regime de 1/18 do PLOA (Projeto de Lei Orçamentário Anual).
Neste aspecto, também cabe registrar o crescimento de R$ 7,5 bilhões em outras despesas obrigatórias, créditos extraordinários que aumentaram R$ 6,9 bilhões, ao passo que as despesas com Pessoal e Encargos Sociais acusaram recuo de R$ 3,0 bilhões, se comparadas ao mesmo período do ano anterior.
Teto é a ‘âncora’
De acordo com técnicos do Tesouro, a expectativa para o futuro imediato dá conta de uma política fiscal ‘ancorada’ pelo teto de gastos, premissa considerada fundamental pela autarquia para a formação de um cenário macroeconômico equilibrado, com base em taxas de juros baixas, retomada do crescimento econômico em patamares próximos a 2,5% ao ano, reforçado por um resultado fiscal que caminha para o superávit, no médio prazo.
O Tesouro lembra, ainda, que o teto de gastos é um preceito básico para o equilíbrio das contas públicas, tendo em vista o incremento do endividamento público decorrente das medidas de combate aos efeitos da pandemia de Covid-19.
Dívida bruta explosiva
Com base nos resultados auferidos até agora nas contas nacionais, a STN considera o Brasil um dos países emergentes mais endividados do mundo, com a perspectiva de fechar o ano com uma Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) em torno de 87,2% do PIB, bem acima da média estimada para os demais emergentes, não superior a 65,1% do PIB.
Além da elevada carga tributária, a agenda fiscal do governo – acentua o documento do Tesouro – tem diante de si o desafio de combater a trajetória ascendente das despesas obrigatórias, de um lado, e a rigidez orçamentária, de outro, o que comprime significativamente o ‘espaço’ para políticas públicas, como investimentos em infraestrutura e programas sociais.