O Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada (LAPPCOM/UFRRJ) realizou na noite desta quinta-feira (15) uma palestra com o sociólogo José Cláudio Souza Alves, professor e pesquisador da UFRRJ. Há 28 anos, ele se debruça sobre a atuação de milícias e grupos de extermínio, da Baixada Fluminense ao Rio de Janeiro.
Falando sobre governança criminal, Souza Alves comentou a ação das chamadas autodefesas. Atualmente, ele está trabalhando na companhia de um professor mexicano, na pesquisa que compara dados do Grande Rio e da provínica de Michoacán, localizada no país centro-americano.
"Nossa ideia básica, minha e do Antonio Fuentes Díaz, é a seguinte: o Estado, que deveria ter o monopólio legal da violência na concepção weberiana [referente ao alemão Max Weber, 1864-1920] e traz a noção de soberania, abre uma possibilidade de negociação de atores criminais de formas e estruturas de domínio. Há uma indistinção entre o legal e o ilegal, o criminoso e o justo. Essas dimensões começam a se confundir e misturar", detalhou. As milícias, segundo ele nessas áreas onde se envolve para colher material, são reconhecidas pela expansão "voraz, rápida e forte".
A forma de atuar dentro dessa noção de governança criminal estabelece regimes criminais, a partir dos quais se dão formas de negociar com cada grupo paramilitar e facção do tráfico.
Por seu trabalho, o professor, candidato a prefeito de Duque de Caxias no ano de 2016, se depara com acusações feitas por figuras públicas, de uma jornalista e apresentadora de TV ao chefe da Secretaria de Polícia Civil (Sepol).
"Ele deveria refletir a respeito do cachê que recebe de outro grupo", rebateu ele, numa referência a Alan Turnovsky. O secretário já declarou que Souza Alves e outros pesquisadores seriam assessores e receberiam cachê de uma das facções do tráfico no Rio de Janeiro.
Como os grupos paramilitares costumam ser formados por agentes de segurança, ativos, aposentados ou expulsos pelas corporações, o trabalho dos pesquisadores consiste em analisar a realidade a partir de dados concretos e refletir sobre causas, efeitos, soluções. Por exemplo, quando operações policiais são realizadas a um mês das eleições, como foi em 2020, e levam às mortes de pessoas. Neste caso, 17.
Independente se os mortos em Nova Iguaçu (5) e Itaguaí (12) tinham envolvimento com o tráfico, o ponto levantado por Alves é a nomenclatura usada pelo próprio Turnovsky –"narcomilicianos". "Seria uma forma de justificar a lógica 'bandido bom é bandido morto'", resumiu ele, para arrematar em seguida. "Atuar em conjunto com a milícia é vantajoso. Miliciano bom é policial, vinculado à estrutura política. Vai permitir controle territorial, econômico e eleitoral-político de áreas como zona oeste e Baixada Fluminense". Atualmente, também de acordo com o professor da Rural, 6% das operações policiais no estado de Rio de Janeiro ocorrem em áreas dominadas por milicianos.
Ainda assim, o docente avaliou que a largada para o próximo período eleitoral, em 2022 ("O controle de água, luz, gatonet, aterro é a chave para o que vai acontecer"), foi dada com a morte de Wellington da Silva Braga, o 'Ecko', morto no Dia dos Namorados, em ação coordenada pela Polícia Civil em Paciência. "O assassinato do Ecko foi cronometrado". O bairro fica na zona oeste; somada à Baixada Fluminense, as duas regiões reúnem aproximadamente 50% do eleitorado do estado.
Alves foi claro ao dizer que Coronel Jairo (Solidariedade) pertence ao mesmo grupo miliciano de 'Ecko'. Ex-suplente, assumiu como deputado estadual, no lugar de Rodrigo Bacellar, convidado por Cláudio Castro para chefiar a Secretaria de Governo. "É a estrutura se movimentando", resumiu.
No entanto, quando o assunto é segurança pública, o professor universitário não poupa governantes e partidos do outro lado do espectro político. "A política da esquerda é o tapete vermelho para a extrema-direita. O Lula veio ao Rio em 2007 e, após a Chacina do Pan, ele afirmou que 'não se combate o crime com pétalas de rosas'. Witzel e agora Castro apenas dão continuidade ao que têm sido feito por governos desde o início dos anos 2000".
"Entre a esquerda que faz mímica e a extrema-direita que se expressa, a maioria [dos brasileiros em 2018] votou em quem foi mais original", ironizou ele.
"Eu prefiro ser um desiludido que acredita em possibilidades reais”, destacou o professor. Ele considera "temerária" a busca de Marcelo Freixo (PSB), pré-candidato ao Governo do Estado, pelo voto de policiais, bem como se aproximar de figuras públicas como Raul Jungmann, ministro da Justiça do governo Temer. Na época, quando o general Braga Netto, atual ministro da Defesa, foi designado interventor federal na Segurança Pública estadual, ocorreu o assassinato da vereadora Marielle Franco, assessora de Freixo durante os mandatos dele na Alerj. "As investigações vão se tornar a total incapacidade de descobrir quem foram os mandantes", lamentou ele.
A próxima atividade do LAPPCOM/UFRRJ vai promover um debate sobre clientelismo, no dia 17 de agosto.
Clique aqui para assistir à íntegra do debate com o sociólogo José Cláudio Souza Alves, disponível na página do LAPPCOM no Facebook.