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MPF desmente presidente da Fundação Palmares sobre reunião no Galpão Docas

O objetivo do encontro foi o de possibilitar a apresentação pública de projeto e dos resultados alcançados.

Por Anderson Madeira em 04/09/2021 às 13:10:54

A reunião foi sobre a apresentação pública do projeto “Cais do Valongo: socialização e valorização do sítio arqueológico”, para representantes do movimento negro. Foto: Divulgação

Uma reunião realizada pelo Ministério Público Federal, no último dia 2, sobre a apresentação pública do projeto “Cais do Valongo: socialização e valorização do sítio arqueológico”, para representantes do movimento negro no Galpão Docas Pedro II, na Gamboa, provocou a ira do presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, que é inimigo declarado do movimento negro. Ele acusou a reunião de ter sido política e sem a autorização da Fundação. O que foi negado pelo próprio MPF.

Segundo o MPF, a reunião foi realizada a pedido do próprio órgão, com as organizações e grupos culturais que atuam na área da Pequena África, no centro do Rio. Representantes do Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG), responsável pelo projeto apresentado no evento, também participaram. O projeto em questão foi feito em colaboração com a Prefeitura do Rio de Janeiro e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O objetivo do encontro foi o de possibilitar a apresentação pública do projeto e dos resultados alcançados.

“A ata da reunião está em fase de elaboração e será anexada ao procedimento do MPF, ficando, também, disponível para consulta da Fundação Palmares, caso seja do interesse da instituição”, informou o órgão, em ofício enviado no último dia 2 ao presidente da Fundação Palmares.

No último dia 30, Sérgio Camargo publicou em seu perfil numa rede social duas postagens acusando as organizações do movimento negro de promoverem uma reunião política sem autorização dele.

“O movimento negro quer fazer reunião política no Docas Dom Pedro II/Rio. Não tem permissão da Palmares, a quem cabe a guarda do imóvel. Tomarei medidas cabíveis no âmbito judicial e administrativo. O Docas não será um templo para o culto do ressentimento’, disse Camargo em uma postagem. Em outra, afirmou: “Qualquer manifestação política ou reunião realizada nas dependências do armazém Docas Dom Pedro II/Rio, sem a consulta e autorização expressa da Fundação Cultural Palmares será visto por essa gestão como ato de INVASÃO”.

Segundo ofício que o MPF enviou a Camargo, as postagens contém inverdades. “As mensagens contêm uma série de inverdades pois, como já esclarecido: a) a reunião não foi convocada pelo movimento negro, mas sim pelo MPF; b) a reunião não é uma “manifestação”, nem tem natureza política, mas sim administrativa, pois trata da apresentação e discussão do projeto “Cais do Valongo: socialização e valorização do sítio arqueológico”, desenvolvido pelo IDG; c) a posse do imóvel Docas Pedro II ainda encontra-se com a ONG Ação da Cidadania, que não apenas autorizou a realização da reunião no local como disponibilizou pequena estrutura para que o evento se realizasse com observância dos protocolos sanitários em vigor durante a pandemia do Covid-19.”, disse o trecho do ofício.

Sobre o galpão, o ofício do MPF continuou: “A respeito do último ponto, cumpre lembrar que a posse do imóvel é objeto da ação civil pública nº 5045231-63.2018.4.02.5101, ajuizada pelo MPF em face da União, da Fundação Palmares e da própria ONG Ação da Cidadania. Como deve ser do conhecimento de Vossa Senhoria, em 07 de dezembro de 2020 foi celebrado acordo judicial por meio do qual a Prefeitura do Município cedeu à Ação da Cidadania a posse de dois galpões na região da Gamboa, para que as ações de combate à fome por ela desenvolvidas possam continuar.”.

O Ministério Público informou ainda que a mudança da ONG Ação da Cidadania para os galpões cedidos – e consequente desocupação do Galpão Docas Pedro II – depende da conclusão do processo de transferência das cerca de 1,3 milhões de peças arqueológicas atualmente depositadas em um dos galpões objeto da cessão. O processo ocorre de maneira dialogada entre a ONG e a Prefeitura do Rio e encontra-se em fase final de embalagem do material. Segundo acordado na audiência judicial, compete à prefeitura promover o transporte e proteção adequada das peças para o Galpão Docas Pedro II.

“Registramos que, na mesma audiência, a Fundação Palmares e a União assumiram a obrigação de apresentar em juízo, até outubro de 2021, comprovação do início do processo licitatório para reforma do imóvel Docas Pedro II. Trata-se, como se vê, de processo complexo e que demanda ações coordenadas e dialogadas de todos os órgãos envolvidos, de forma a se garantir a proteção do patrimônio material afrobrasileiro, único objetivo a ser buscado por todos os envolvidos”, disse outro trecho do ofício.

O MPF lembrou ainda que a Fundação Palmares obteve a guarda provisória do Galpão Docas Pedro II, exclusivamente para que possa estabelecer, no local, o Centro de Interpretação do Cais do Valongo, objeto de obrigação internacional contraída junto à UNESCO, por ocasião da inclusão do sítio arqueológico na lista do Patrimônio Mundial.

O ofício do MPF foi assinado pelo procurador da República Sergio GardenghiSuiama. O movimento negro, por sua vez, preferiu não dar atenção a “mais uma declaração” de Sérgio Camargo contra a luta da população negra brasileira contra o racismo.

“Acho que ninguém deu muita atenção ao que o Sérgio Camargo disse ou deixou de dizer. Teve esse ofício do Ministério Público, a reunião foi realizada a convite do MPF e me causaria muita estranheza que o atual presidente da Fundação Palmares, que ainda imagino sub-júdice, porque ainda não foram julgadas as inúmeras ações engrossadas contra a sua nomeação. O povo está mais preocupado com a pandemia e a comida na mesa do que com declarações dele”, afirma Humberto Adami, presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra, do Conselho Federal da OAB e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.

Eis a íntegra do ofício

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO RIO DE JANEIRO

Ofício PR-RJ-22ºOfício nº 10482/2021 Rio de Janeiro, 2 de setembro de 2021.

Ref.: 1.30.001.005145/2019-11 (Favor mencionar esta referência na resposta)

Senhor Presidente:

Apenas nesta data tomamos conhecimento dos ofícios nº 963/2021/GAB/PR-FCP e 991/2021/GAB/PR-FCP, uma vez que estão endereçados e foram encaminhados ao Procurador da República Renato de Freitas Machado, que não tem atribuição para acompanhar as ações de preservação e valorização do sítio arqueológico do Cais do Valongo. Registramos, inicialmente, que a reunião realizada no Galpão Docas Pedro II/André Rebouças foi convocada pelo Ministério Público Federal no âmbito do procedimento nº 1.30.001.005145/2019-11, que trata do acompanhamento das ações voltadas à conservação e promoção do sítio arqueológico. Participaram do evento as organizações e grupos culturais que atuam na área da Pequena África e o Instituto de Desenvolvimento e Gestão – IDG, associação responsável pelo projeto “Cais do Valongo: socialização e valorização do sítio arqueológico”, em colaboração com a Prefeitura do Rio de Janeiro e IPHAN.

O objetivo do encontro foi o de possibilitar a apresentação pública do projeto e dos resultados alcançados. A ata da reunião está em fase de elaboração e será anexada ao procedimento do MPF, ficando, também, disponível para consulta da Fundação Palmares, caso seja do interesse da instituição. Por outro lado, o Ministério Público Federal tomou conhecimento dos “posts” abaixo reproduzidos, supostamente de autoria de Vossa Senhoria:

As mensagens contêm uma série de inverdades pois, como já esclarecido: a) a reunião não foi convocada pelo movimento negro, mas sim pelo MPF; b) a reunião não é uma “manifestação”, nem tem natureza política, mas sim administrativa, pois trata da apresentação e discussão do projeto “Cais do Valongo: socialização e valorização do sítio arqueológico”, desenvolvido pelo IDG; c) a posse do imóvel Docas Pedro II ainda encontra-se com a ONG Ação da Cidadania, que não apenas autorizou a realização da reunião no local como disponibilizou pequena estrutura para que o evento se realizasse com observância dos protocolos sanitários em vigor durante a pandemia do Covid-19. A respeito do último ponto, cumpre lembrar que a posse do imóvel é objeto da ação civil pública nº 5045231-63.2018.4.02.5101, ajuizada pelo MPF em face da União, da Fundação Palmares e da própria ONG Ação da Cidadania. Como deve ser do conhecimento de Vossa Senhoria, em 07 de dezembro de 2020 foi celebrado acordo judicial por meio do qual a Prefeitura do Município cedeu à Ação da Cidadania a posse de dois galpões na região da Gamboa, para que as ações de combate à fome por ela desenvolvidas possam continuar. A mudança da ONG para os galpões cedidos – e consequente desocupação do Galpão Docas Pedro II – depende da conclusão do processo de transferência das cerca de 1,3 milhões de peças arqueológicas atualmente depositadas em um dos galpões objeto da cessão.

O processo ocorre de maneira dialogada entre a ONG e a Prefeitura do Município e encontra-se, segundo informado pelo IRPH, em fase final de embalagem do material. Segundo acordado na audiência judicial, compete ao IRPH/Prefeitura promover o transporte e proteção adequada das peças para o Galpão Docas Pedro II. Registramos que, na mesma audiência, a Fundação Palmares e a União assumiram a obrigação de apresentar em juízo, até outubro de 2021, comprovação do início do processo licitatório para reforma do imóvel Docas Pedro II. Trata-se, como se vê, de processo complexo e que demanda ações coordenadas e dialogadas de todos os órgãos envolvidos, de forma a se garantir a proteção do patrimônio material afrobrasileiro, único objetivo a ser buscado por todos os envolvidos. Dessa forma, causa estranheza a publicação, em rede social, de mensagens atribuídas a Vossa Senhoria, contendo falsidades e ameaças dirigidas à realização de reunião convocada pelo MPF, sem que a Fundação Palmares tenha, sequer, se dado ao trabalho de obter – previamente às publicações – informações corretas a respeito da natureza e finalidade do evento.

Convém registrar, finalmente, que a Fundação Palmares obteve a guarda provisória do Galpão Docas Pedro II, exclusivamente para que possa estabelecer, no local, o Centro de Interpretação do Cais do Valongo, objeto de obrigação internacional contraída junto à UNESCO, por ocasião da inclusão do sítio arqueológico na lista do Patrimônio Mundial. Segundo a decisão adotada pela UNESCO disponível no endereço https://whc.unesco.org/en/list/1548/, o Cais do Valongo foi reconhecido como patrimônio mundial por ser “um sítio de consciência, que ilustra fortes e tangíveis associações com um dos mais terríveis crimes da humanidade: a escravidão de centenas de milhares de pessoas, criando o maior movimento de migração forçada da história. (...) O sítio evoca memórias difíceis, as quais muitos Afrobrasileiros estão fortemente vinculados”. Recorda o MPF a Vossa Senhoria que, nos termos do art. 37, caput, da Constituição brasileira, todos os agentes públicos estão vinculados aos princípios da legalidade e da impessoalidade administrativas, motivo pelo qual a vontade do administrador está subordinada ao que a lei expressamente lhe autoriza, observados, ainda, a finalidade e o interesse públicos dos atos praticados

Agradecendo desde logo a atenção dispensada, colocamo-nos à disposição para quaisquer outras informações e solicitamos, na oportunidade, a gentileza de retificar as informações postadas em rede social, pois, conforme esclarecido, não correspondem elas à verdade dos fatos.

Atenciosamente,

Sergio GardenghiSuiama Procurador da República

Ao Senhor SÉRGIO NASCIMENTO DE CAMARGO Presidente da Fundação Cultural Palmares


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