Em meio à greve de motoristas que se arrasta desde ontem (25), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) determinou hoje (26) a suspensão da intervenção da prefeitura sobre o sistema BRT (ônibus articulados com faixas exclusivas). A decisão liminar suspende os efeitos dos decretos 50.199, 50.200 e 50.201 que haviam estabelecido a caducidade dos contratos de concessão aos consórcios que operavam as linhas.
“Verifico que o princípio da continuidade do serviço público está sendo seriamente ameaçado, na medida em que os atos até então praticados pelo réu mostram-se dissociados das normas legais atinentes às concessões", escreveu a juíza Georgia Vasconcellos da Cruz. A liminar foi concedida atendendo pedidos dos consórcios Internorte e Transcarioca.
A decisão vale até que sejam concluídas as análises do desequilíbrio econômico-financeiro existente na operação do BRT pelos consórcios e os descumprimentos contratuais por parte do município. "Nem é necessária a alusão a dispositivo específico de lei ordinária quando a própria Constituição estabelece a garantia à ampla defesa e ao contraditório em todos os procedimentos administrativos", acrescentou. Foi agendada audiência de mediação entre as partes para o dia 7 de março.
A juíza também levou em consideração a paralisação deflagrada ontem (25) e apontada pela prefeitura como possível locaute, que consiste na ação deliberada e ilegal de empresários que paralisam uma atividade para favorecer seus próprios interesses. “Em que pese a tentativa de conciliação a ser buscada na referida audiência, entendo não ser possível, ante o relato da inicial e os últimos fatos notórios (greve dos funcionários do BRT), aguardar pela realização daquele ato sem decisão acerca da tutela requerida”, diz a decisão.
O sistema BRT vinha operando sob intervenção da prefeitura desde março do ano passado, com alegação de descumprimento de obrigações contratuais pelos consórcios. Para assumir a gestão do BRT, foi criada a empresa pública Mobi-Rio, como parte de uma série de medidas voltadas para requalificar o serviço. Ontem (25), foi publicado no Diário Oficial do Município as regras para licitação de novo sistema de bilhetagem eletrônica, que deve ser implantado até dezembro. Há algumas semanas, foi lançado o edital para a compra da primeira leva de 557 novos veículos.
A Rio Ônibus, que representa as empresas do setor, considera a intervenção municipal ilegítima, pois não teria sido respeitado o direito de defesa. Segundo a entidade, o descumprimento contratual se deu em razão da falta de equilíbrio econômico, já que a prefeitura não teria assumido seus deveres, deixando de fiscalizar o transporte clandestino e não autorizando reajuste de tarifa por três anos.
A greve deflagrada pelos motoristas foi considerada ilegal pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RJ) no mesmo dia. A decisão atendeu pedido da prefeitura e da Mobi-Rio, que informaram não ter havido notificação prévia como determina a legislação. O município alegou também não ter recebido a pauta de reivindicações.
A presidente do TRT-RJ, desembargadora Edith Maria Correa Tourinho, determinou o retorno de, no mínimo, 80% da frota do sistema BRT, sob pena de multa diária de R$ 100 mil. Os motoristas, no entanto, descumpriram a decisão e a greve prossegue hoje (26).
O município reforçou linhas de ônibus alternativas e o metrô. O prefeito Eduardo Paes também anunciou mais cedo, por meio das redes sociais, que seriam realizadas demissões por justa causa por não comparecimento ao trabalho.
Segundo o Sindicato dos Rodoviários, a mobilização surgiu nas redes sociais. A entidade divulgou nota oficial esclarecendo que não deliberou e nem deflagrou a greve. "Tudo indica que o congelamento dos salários há mais de três anos, que já afeta a subsistência das famílias dos trabalhadores, gerou acúmulo de insatisfação e ansiedade que precipitou essa paralisação espontânea", diz o texto.
Desde novembro, o Sindicato dos Rodoviários negocia melhorias das condições de trabalho com a Mobi-Rio e com a prefeitura. Cerca de 80% das demandas já teriam sido equacionadas. Após ter sido surpreendida pelo movimento grevista, a entidade pediu que a prefeitura acelere o processo de negociações para reduzir o grau de insatisfação. “Não dá mais para continuar trabalhando com as condições atuais. São ônibus quebrados diariamente, falta de segurança nas plataformas e dentro dos próprios articulados, além de todas as calhas em que circulam os ônibus totalmente esburacadas”, disse Ademir Francisco, representante do Sindicato dos Rodoviários junto aos motoristas do BRT.
Paes vem sustentando, por meio de manifestações nas redes sociais, que há indícios de crime de locaute e que os empresários dos consórcios estariam por trás do movimento grevista. A Secretaria Municipal de Ordem Pública e a Procuradoria Geral do Município solicitaram formalmente a entrada da Polícia Federal para investigar a hipótese.
Em nova manifestação, o prefeito lamentou a suspensão da intervenção municipal pelo TJRJ. "Decisão judicial se respeita e acata, mas nem sempre se entende. Suspender a encampação por causa da paralisação é dar razão ao locaute feito por aqueles que destruíram o BRT. Interromper o processo é prolongar o sofrimento das pessoas", escreveu.
Em nota, a Rio Ônibus, que reúne as empresas do setor, repudiou as acusações de locaute. A entidade atribuiu a greve ao descaso e à omissão da prefeitura. “Mesmo ignorando as necessidades das linhas circulares e investindo milhões no BRT, o sistema vive apenas de promessas não cumpridas há um ano, desde que a prefeitura assumiu a gestão dos corredores e não conseguiu obter nenhuma melhoria para os passageiros”. O Sindicato dos Rodoviários afirmou que os trabalhadores não são massa de manobra nem da prefeitura e nem dos empresários.
Fonte: Agência Brasil