Traficante mais antigo no poder no Rio, Fernando Gomes de Freitas, o Fernandinho Guarabu, que comanda a venda de drogas no Morro do Dendê, na Ilha do Governador, na Zona Norte da Capital, mandava incendiar kombis e vans de motoristas do transporte alternativo que não pagavam o pedágio do tráfico no bairro. A informação consta em um processo que tramita na 17ª Vara Criminal da Capital do Tribunal de Justiça fluminense (TJ-RJ). O Disque-Denúncia oferece R$ 30 mil por informações que levem ao paradeiro do traficante.
Segundo os autos, a quadrilha de Guarabu exigia semanalmente R$ 350 dos motoristas e proprietários dos veículos que atuam nas linhas Bananal/Portuguesa; Bananal/Bonsucesso; Ribeira/Portuguesa; Bancários/Bonsucesso; Bananal/Vila da Penha; Bancários/Aeroporto; Bananal/Vila Kosmos; Ribeira/Aeroporto; Ribeira/Portuguesa; Bancários/Jardim Guanabara; Bancários/Ribeira; Bancário/Vila Joaniza; Bananal/Vila Joaniza e Castelo/Ilha Governador. Mais de 500 motoristas eram obrigados a pagar o pedágio.
O recolhimento do dinheiro era feito por cobradores que controlavam, por meio de anotações contendo as placas dos veículos, aqueles que estavam ´habilitados´ a circular pela Ilha do Governador e aqueles que deveriam ser ´travados.
De acordo com o processo, os veículos confiscados ficavam retidos no Morro do Dendê até a quitação integral dos valores exigidos pelo bando de Guarabu e caso não fosse efetuado o pagamento, as kombis e vans eram destruídas.
Segundo depoimentos, o dinheiro tinha que ser dado toda quarta-feira em um local conhecido como 200, na localidade de Bancários. Cada fiscal que fazia a cobrança recebia também R$ 5 por cada veículo, de segunda a sábado.
Propina a PMs
O processo revela que a quadrilha de Guarabu pagava propina a policiais militares da APTRAN do 17º BPM para que não houvesse qualquer tipo de repressão às atividades a uma cooperativa que era usada como fachada pelo bando para extorquir os motoristas. Os autos, no entanto, não revelaram o nome de nenhum policial .
Os traficantes ligados a Guarabu também pagavam propinas para PMs para evitarem ações de repressão ao tráfico de entorpecentes, além de participar de negociações para a libertação de bandidos presos (ainda não apresentados à autoridade policial) e a ´recompra´ de armas e drogas eventualmente apreendidas. As propinas chegavam até R$ 5 mil, segundo diálogos captados através de interceptações telefônicas.
O grupo, segundo os autos, também explorava a difusão clandestina de sinais de TV e Internet, a monopolização, dentro do território controlado pelo tráfico, do comércio de gás de cozinha, com preços acima dos praticados no livre mercado, além de realizar a extorsão de comerciantes que desempenham suas atividades no interior e nas adjacências das comunidades, à titulo de um suposto serviço de ´segurança.
Sobre essa desconfiança, na última quinta-feira (30), equipes do Estado Maior da Polícia Militar realizaram inspeções de rotina no Batalhão de Policiamento em Vias Expressas (BPVE) e no 17º BPM (Ilha). Durante a operação no batalhão da Ilha do Governador foram encontradas drogas, munições, granadas e lunetas em dois armários não identificados. Foi instaurado pela Corregedoria da Polícia Militar um Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar o fato.
O Comando da Polícia Militar informou que reitera o compromisso no combate aos malfeitos dentro e fora da corporação, assumindo o protagonismo nas ações correcionais.
Os crimes perpetuados pela quadrilha de Guarabu foram comprovados por diversos meios disponíveis (interceptação de conversas telefônicas; entrevistas realizadas por agentes de campo; imagens colhidas em vigilâncias; abordagens; depoimentos; relatórios de diligências; provas compartilhadas e informações oriundas de órgãos de inteligência). Segundo os autos, Fernandinho exerce uma função de liderança, centralizando o comando de todas as atividades ilícitas do grupo, e ´delegando´ a execução propriamente dita das condutas típicas a pessoas de sua estreita confiança.
Além do Dendê, o bando é acusado também de controlar a venda de drogas na comunidade Boogie-Woogie, também na Ilha.
Lavagem de dinheiro
Apontado como um dos principais assessores de Fernandinho Guarabu, Antônio Eugênio de Souza Freitas, o Batoré, lavou o dinheiro proveniente dos crimes de extorsão contra motoristas na aquisição de três carros. Ele comprou um Toyota Hilux no valor de R$ 140 mil, entregues totalmente em espécie. O mesmo bandido adquiriu um Toyota Corolla por quem pagou R$ 123 mil, dando R$ 83 mil em dinheiro vivo. Comprou também um outro Corolla. A Justiça pediu o sequestro dos bens.
O criminoso registrou os dois veículos no Detran em nome de uma empresa de construção para dar aparência de licitude à renda obtida com as extorsões praticadas. Em outras palavras, a empresa, que não tinha um só funcionário cadastrado, era uma mera ficção, uma ´história cobertura´ para permitir o branqueamento de capitais.
Batoré é ex-PM e está sendo acusado de ter feito ameaças ao major da PM, Alan de Luna Freire, que foi assassinado esta semana, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
Nesta semana, a polícia intensificou operações no Dendê para reprimir o tráfico local e pelo menos quatro bandidos foram baleados.