Mazomba fica a 12 km do Centro de Itaguaí, município da Baixada Fluminense. Um recanto ecológico conhecido por poucos, com cachoeiras de águas cristalinas, montanhas exuberantes, uma rica diversidade e paisagens de tirar o fôlego. Mas, no caminho do desenvolvimento sustentável deste paraíso, tem uma grande pedra, ou melhor, uma pedreira.
A maioria dos moradores de Mazomba tira do campo o seu sustento e eles temem que a pedreira localizada em uma Área de Proteção Permanente (APP) seja reativada e, com isso, prejudique as plantações. A única escola agrícola da comunidade, que hoje atende a cerca de 30 crianças, fica poucos quilômetros do local onde eram feitas as detonações. Membros do Conselho Comunitário acreditam que mudanças feitas este ano em secretarias municipais podem favorecer o grupo empresarial responsável pelo empreendimento.
O presidente do Conselho Comunitário de Mazombinha e Rio Preto, Alexandre Conrado, conta que a entidade ingressou com um ofício comunitário na prefeitura, no início do mês de novembro, solicitando informações sobre a possível reativação da pedreira, mas até o momento o poder público não prestou nenhum tipo de esclarecimento. "Nossa comunidade é rural, temos apenas uma escola agrícola, que tem grande valor histórico para nós. E entendemos que são duas atividades [escola e pedreira] que não conseguirão seguir casadas, porque é difícil ter ensino de qualidade onde está funcionando uma empresa que faz detonações, onde há poeira, todo o transtorno de caminhões indo e vindo", argumenta Conrado.
O representante do conselho diz ainda que há uma cooperativa de agricultores que fornece alimentos para instituições do estado, inclusive para escolas públicas. "Mazomba é um celeiro de produção agrícola e pecuária, importante para a economia regional e até do estado. Se a pedreira voltar, este setor ficará prejudicado", enfatiza.
Para o morador José Tobias Filho, uma pedreira no bairro pode trazer enormes prejuízos financeiros e à saúde. "Imagina caminhões carregados de pedra transitando por aqui. Juntamente com os efeitos das detonações, as residências vão apresentar rachaduras e outros problemas de infraestrutura. Quem vai pagar este prejuízo? Além da saúde respiratória dos idosos e crianças, que deve ficar afetada", frisa o aposentado.
A produtora cultural Alessandra Reis tem um sítio em Mazomba, onde ela cultiva alimentos orgânicos. Alessandra faz parte de um coletivo que participa do projeto de Agricultura Familiar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). O grupo comercializa os seus produtos na feira que acontece periodicamente na própria universidade. Reis tem a mesma opinião dos outros moradores e acredita que as atividades da pedreira podem impactar as produções do campo.
"Movimentações estranhas" na Câmara
O vereador André Amorim (PR) conta que tramita na Câmara Municipal de Itaguaí uma mobilização em torno de Projetos de Lei enviados pelo Executivo, todos em caráter de urgência, e que estão aguardando por aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deste o início de novembro. Na opinião do parlamentar, estes PLs podem ser indícios de negociações "não oficiais", em torno da retomada das detonações em Mazomba.
Segundo Amorim, foi enviado para a casa legislativa, pelo poder municipal, a proposta de um novo plano diretor de Itaguaí, mas não consta no documento o mapa de zoneamento. A ausência deste tópico travou a tramitação da peça na Câmara. "Junto a este fato estranho, foi aprovado outro PL enviado pela prefeitura, que trata de mudanças em secretarias. Agora, a pasta de Meio Ambiente, que antes era conjugada com Agricultura, está vinculada a de Planejamento. Com isso, o secretário responsável está acumulando Obras, Planejamento e Meio Ambiente. Há cerca de 30 dias, vieram todas estas mudanças, no momento que rumores da reativação da pedreira estavam deixando os moradores [de Mazomba] preocupados", conta o vereador.
A empresa que tem endereço vinculado à pedreira em Mazomba é a Valle Sul Terraplenagem. Entre os seus sócios estão Henrique Coimbra Valle e Sebastião Emilio Valle, que em 2007 foram citados em uma investigação da Polícia Civil que revelou um esquema de corrupção e fraudes em licitações e licenças ambientais em municípios do sul fluminense. Na Operação Carta Marcada houve pedido de prisão de três secretários municipais e dos donos da Valle Sul. Nos anos seguintes o processo foi arquivado por falta de provas.
"Será um desastre ambiental"
O engenheiro ambiental Hélio Osório Coelho, que há 10 anos acompanha o meio ambiente na região, se mostra preocupado com a possibilidade de a pedreira voltar às suas atividades. "Temos um corpo hídrico, toda a água que desce da cachoeira é captada mais abaixo e abastece centenas de residências. Com a reativação [da pedreira] será afetado de forma desastrosa o meio ambiente local. Temos uma rica diversidade, fauna e flora, que será destruída, se o poder público liberar o funcionamento da pedreira", destaca ele. O engenheiro foi um dos especialistas responsáveis pela criação do plano ambiental do governador eleito do Rio, Wilson Witzel (PSC) e ele afirma que Itaguaí terá maior atenção na nova gestão do estado.
Na análise do engenheiro ambiental João Marcelo do Nascimento, "fica clara a insustentabilidade do projeto da pedreira". O especialista lembra que qualquer atividade que envolve o meio ambiente, precisa, por força da legislação, das devidas licenças nos organismos competentes. Se este rito não for respeitado, pode ser considerado um crime ambiental, especialmente quando gera grande impacto à natureza. "Se a comunidade não foi informada, é que este rito não se deu. Não há outro mecanismo, nem o município e nem o estado pode abrir mão dele [se referindo aos trâmites legais]", explica.
A equipe de reportagem do Portal Eu Rio! entrou em contato com a Prefeitura de Itaguaí para questionar as denúncias da comunidade, mas até o fechamento da reportagem não houve retorno.