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Comunidades atingidas por rompimento da barragem de Fundão, há sete anos, devem receber assessoria imediata

Demora na assistência técnica independente, na prática, configura negativa a direito das populações afetadas

Por Portal Eu, Rio! em 15/10/2022 às 13:00:25

Passados quase sete anos da tragédia, rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, segue sem indenização plena a comunidades afetadas. Foto: Agência Brasil

As instituições de Justiça que atuam no caso Samarco obtiveram uma decisão judicial aguardada há muitos anos: o reconhecimento do direito das populações atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, de propriedade das empresas Samarco, Vale e BHP Billinton, de serem auxiliadas por Assessorias Técnicas Independentes (ATI). Em decisão proferida nesta quinta-feira (13), o Juízo da 4ª Vara Federal determinou que as entidades que apresentaram plano de trabalho iniciem de imediato suas atividades nos territórios, com exceção das localidades de Aracruz, Serra e Fundão, cujas populações ainda não se decidiram quanto à entidade a ser contratada.

Para o magistrado, trata-se de medida urgente, “pois todas as outras discussões do Caso Mariana, que envolvem mais diretamente a população atingida, pressupõem que a população esteja devida e tecnicamente assessorada, como garantia de paridade de armas ou de efetivo contraditório, dada a vulnerabilidade diante de pessoas jurídicas de grande capacidade econômica”.

“Dada a evidente e inaceitável mora, é necessário que se iniciem as atividades, ainda que de maneira cautelar, pois, decorridos SETE ANOS do rompimento da barragem, a não garantia da assessoria técnica de forma urgente aos atingidos implicaria, no final das contas, uma negativa do direito, pois, como se apregoa costumeiramente nos livros jurídicos, justiça tardia é justiça falha”, afirma o Juízo.

Queda na barragem causou a morte de pessoas e destruição de fauna e flora


Documento do Ibama informa que em 5 de novembro de 2015 ocorreu o rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana (MG), o maior desastre socioambiental do país no setor de mineração, com o lançamento de cerca de 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos no meio ambiente. Os poluentes ultrapassaram a barragem de Santarém, percorrendo 55 km no rio Gualaxo do Norte até o rio do Carmo, e outros 22 km até o rio Doce. A onda de rejeitos, composta principalmente por óxido de ferro e sílica, soterrou o subdistrito de Bento Rodrigues e deixou um rastro de destruição até o litoral do Espírito Santo, percorrendo 663,2 km de cursos d'água.

Laudo Técnico Preliminar, concluído em 26 de novembro de 2015, aponta que “o nível de impacto foi tão profundo e perverso ao longo de diversos estratos ecológicos que é impossível estimar um prazo de retorno da fauna ao local”. O desastre causou a destruição de 1.469 hectares, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Dezenove pessoas morreram na tragédia. Foram identificados ao longo do trecho atingido diversos danos socioambientais: isolamento de áreas habitadas; desalojamento de comunidades pela destruição de moradias e estruturas urbanas; fragmentação de habitats; destruição de áreas de preservação permanente e vegetação nativa; mortandade de animais domésticos, silvestres e de produção; restrições à pesca; dizimação de fauna aquática silvestre em período de defeso; dificuldade de geração de energia elétrica pelas usinas atingidas; alteração na qualidade e quantidade de água; e sensação de perigo e desamparo da população em diversos níveis.

A força do volume de rejeitos lançado com o rompimento da barragem também pode ter revolvido e colocado novamente em suspensão os sedimentos de fundo dos cursos d'água afetados, que pelo histórico de uso e relatos na literatura já continham metais pesados.

Controlada pela Vale e pela BHP Billiton, a Samarco foi notificada 73 vezes e recebeu 25 autos de infração do Ibama até agosto de 2020, totalizando R$350,7 milhões. O Ibama acompanha a evolução do desastre em campo desde o dia 06/11/2015 e reúne nesta página todos os documentos relacionados à tragédia.

Empresas firmaram acordo em novembro de 2017, mas seguem sem cumprir acerto

“Absurdo” - O direito das populações atingidas à Assessoria Técnica Independente, conquanto reconhecido pelas próprias empresas no acordo assinado em novembro de 2017, por meio do qual assumiram o compromisso de custear os trabalhos das ATI, nunca foi efetivamente implementado.

“Na última terça-feira, durante audiência de conciliação, ressaltamos o absurdo da situação de as ATIs terem sido escolhidas em 2018 e não terem sido implementadas até hoje. É óbvio que o desrespeito a essa decisão de quatro anos atrás acaba por legitimar comportamentos contrários ao direito. Além disso, ainda que as ATIs possam ser trocadas quando não tenham mais a legitimidade popular, fato que é assessorias que nunca entraram em campo precisam de um tempo para mostrar seu trabalho para as populações atingidas que as selecionaram”, defende o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva.

Recusa - Lembrando que o direito à Assessoria Técnica Independente (ATI) é reconhecido também por lei estadual de Minas Gerais, o Juízo Federal rechaçou os motivos apresentados pelas empresas para recusarem a contratação de uma determinada ATI. As mineradoras alegavam que tal entidade faria “confusão com movimento político-partidário e movimentos sociais, e teria cometido falhas na prestação de assessoria em outro território”.

De acordo com a decisão judicial, “ideologia ou atividade de cunho político não são palavras que indicam algo negativo, mas algo inerente às relações humanas e inclusive caracterizador do ser humano”, e a assessoria técnica independente, após sua escolha, “passa a atender à parte da população que lhe foi simpática e àquela parcela que opôs à escolha”, devendo “acolher todos os atingidos, ser dialógico e ouvir as críticas, atender a todos e, se for o caso, submeter-se a novo escrutínio popular para que a legitimidade seja necessária para início e também para continuidade de sua atuação”.

Além disso, pontua o magistrado, “irregularidade em um território não implica impedimento em outro, já que essa sanção não está prevista em lei. Se constada irregularidade, em juízo exauriente, haverá os rigores da lei. Isso é válido para toda e qualquer ATI. Entretanto, presume-se, até manifestação judicial em contrário, a continuidade de atuação, como destacado verbalmente pelo membro do MPF presente à audiência realizada”.

Exceção – No caso dos territórios de Aracruz, Serra e Fundão, em que ainda há divergência quanto ao processo de escolha da ATI, a decisão judicial determinou que seja realizada ampla consulta popular, o mais rápido possível, para que a população chegue a um consenso sobre a entidade a ser contratada.

“Processo dialógico e coletivo não pode representar processo lento, falho e ineficiente. Eficácia deve ser também uma preocupação, ao lado da oitiva de todas as partes e busca da participação popular na extensão possível, sem prejuízo do controle da atuação deste Juízo pelo Egrégio TRF6, na via recursal, e mesmo de discussões seguintes, após implementada essa decisão proferida cautelarmente, em juízo exauriente e com regular consideração de todas as manifestações técnicas e que constroem o contraditório nessa complexa demanda (ou demandas, no plural, como se verificar de um caso dessa magnitude)”, afirma o magistrado.

Íntegra da decisão judicial.

Ação Civil Pública nº 1003050-97.2020.4.01.3800
Órgão julgador: 4ª Vara Federal (antiga 12ª Vara)
Jurisdição: Seção Judiciária de Minas Gerais

Fonte: Ministério Público Federal Minas Gerais

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