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Divisão do STF sobre Lula acirra a radicalização, diz cientista político

Por Portal Eu, Rio! em 21/12/2018 às 10:19:03

A decisão monocrática do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, na última quarta-feira, de soltar os condenados em segunda instância, entendendo que os processos não tinham ainda inteiramente transitados em julgado, conforme determina a Constituição Federal, e a posterior suspensão do ato pelo presidente do STF, ministro Dias Tóffoli, fez retomar o clima de ‘Fla x Flu’ na política brasileira, que havia na campanha eleitoral, fazendo a sociedade esquecer um pouco questões mal explicadas do futuro governo, como o motorista Fabrício Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL), e alguns futuros ministros investigados, como Paulo Guedes, da Economia. Voltou ao debate nacional ainda a defesa da Operação Lava Jato.

A decisão de Marco Aurélio beneficiaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde abril, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo juiz Sérgio Moro no ano passado e com a condenação confirmada em janeiro deste ano pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (RS). Afinal, Lula, antes da prisão, estava em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais para presidente e com a saída dele da disputa, Jair Bolsonaro subiu para o primeiro lugar e foi eleito.

As redes sociais foram inundadas de opiniões contra e a favor da decisão de Mello. Muitos dos que eram contra execraram a figura do ministro do Supremo e defenderam a invasão e o fechamento do órgão pelos militares e o posterior fuzilamento dos ministros. Foram postados vários ‘memes’ sobre isso. Para o cientista político Marcos Sales Saraiva, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o que houve não foi uma retomada da polarização, mas, mais um capítulo de um processo de radicalização iniciado nas manifestações de rua de junho de 2013.

“Um amplo movimento social de protestos, que têm origem em São Paulo, foi detonado por conta do preço das passagens e do direito à catraca livre. A partir daí ele se espalha pelas grandes capitais, também começando pela questão do transporte público e depois transbordando para uma pauta imensa de questões”, lembrou Saraiva.

Segundo o cientista político, logo, a radicalização foi dominada pelas forças políticas mais à direita. “Até porque uma parte significativa da esquerda brasileira estava no poder. E quem está no poder tem poucas chances de radicalizar. Apela para a moderação e a partir de 2013, 2014, 2015 há um crescente movimento de hegemonia da direita, inclusive nas ruas, nos protestos e de uma direita que vai se tornando cada vez mais radicalizada na sua pauta. Isso nos levou primeiro à eleição de 2014. Um ano depois, ainda com a brasa acesa das manifestações e protestos de 2013, teve eleição de 2014, onde Dilma novamente sai candidata e ali nós temos uma das eleições mais agressivas e violentas que eu pude assistir desde a redemocratização. Essa campanha agressiva de 2014, de ambos os lados, tanto o PT, ele partiu para uma linguagem dura em relação aos adversários. O partido estava  acuado diante da possibilidade de perder a eleição, de ter alguns de seus quadros políticos presos e parte para o tudo ou nada. Mas, esse tudo ou nada também mobiliza a direita brasileira, que vai ganhando a hegemonia nas ruas e nos discursos dos protestos de 2013.  A Dilma ganha, mas, por uma margem muito apertada”, recorda o cientista político.

Ele lembra ainda que o Governo Dilma Rousseff foi questionado desde o começo pelo PSDB, que pediu a recontagem dos votos e teve dificuldade de formar maioria no Congresso Nacional. Até então, a oposição não tinha força nas ruas. A partir de 2014 e 2015, essa oposição, liderada por atores e partidos de centro-direita liberais e de extrema-direita conseguiram uma mobilização suficiente para dar amparo a projeto de derrubada do governo.

“Era o processo inicial do projeto do Aécio Neves e do PSDB. A vitória da Dilma, na verdade, nunca foi aceita. Eles nunca engoliram não só perder, mas, perder por pouco. Ali começou o problema institucional. Aí, o Governo Dilma Rousseff passa a sofrer um certo boicote no Congresso. As chamadas pautas-bombas, lideradas pelo atual presidiário Eduardo Cunha. Aí, a coisa se complica. O clima vai se radicalizando. De um lado agora os defensores da legalidade democrática, de que não há nenhum argumento concreto ou evidência concreta que justifique o impeachment da presidenta Dilma. Desse lado não tem só petistas. Mas, muitos não petistas também foram contra.  Do outro lado formou-se através do incremento da grande mídia, uma maioria, inclusive no Congresso, que pediria então o impeachment de Dilma Rousseff.  O impeachment é um terceiro elemento que vai radicalizando. Aberto para todas e todos, algumas manifestações se dão no plano da civilidade, no plano democrático e da divergência comum às democracias liberais. Outras se dão de  maneira muito agressiva, com xingamentos, desrespeito à posição do outro. Aí você vai criando no país um estigma de quem está no lado da Dilma Rousseff é petista, quem é petista é bandido, apoia a corrupção. A esquerda é bandida e a extrema-direita vai avançando”, observa Márcio.

Para o cientista político, o Brasil se tornou o país das exceções: 

“Nos tornamos de uns tempos para cá o país das exceções. De exceção em exceção, a nossa Constituição vai sendo rasgada, as normas vão sendo burladas e a lei vai se tornando algo instável. Você nunca sabe o que poderá acontecer. Isso tudo aumenta o clima de radicalização no país. E aí, você tem uma nova eleição de 2018. Nessa eleição, você tem o crescimento de um candidato de extrema direita. Com falas e pronunciamentos extremamente polêmicos. Que atacam os gays, o feminismo, o movimento negro, como sendo mimimi, até mesmo alguns direitos fundamentais da pessoa humana. Que irá atacar inclusive a própria concepção de Direitos Humanos. Mais gasolina numa fogueira de radicalidade que o Brasil já estava vivendo. Para complicar ainda mais a equação, o ex-presidente Lula, que estava na frente das pesquisas, em primeiro lugar, é preso. Isso tudo vai ampliando o clima de radicalização. Substituem o Lula pelo professor Fernando Haddad. E aí, imagina, se o clima já era de radicalização, esta vai chegar a níveis estratosféricos. O que não era para ser. Era para se debater políticas públicas. Teve a questão da facada. Tudo isso radicalizou ainda mais as posições ideológicas, políticas, morais, pessoais, enfim. Esse elemento de radicalização permanece. Agora, prestes a começar o governo Bolsonaro,  você já tem uma parte da opinião pública radicalizada contra este novo governo. Uma outra parcela, bastante radicalizada na defesa deste novo governo.  Na minha opinião, o problema maior não é a radicalização da sociedade. Mas, é o aumento estapafúrdio da ignorância, da bestialidade, da mais completa e absoluta falta de argumentos, da degeneração do debate público. Ampliação das fake news,  das notícias absolutamente mentirosas, do jogo sujo, pelo whatsapp e pelo inbox do Facebook, que é o esgoto das redes sociais, e ali muita mentira se atravessa. Como nós temos uma população que ainda enfrenta graves problemas de educação e de informação cultural, a facilidade com que essas mentiras ganham corpo é imensa. Isso também contribui para a radicalização do debate”, analisa.

O cientista político questiona a polarização. “No caso brasileiro, não sei  se é correto falarmos em polarização, na medida em que as forças de centro-direita têm um poder infinitamente superior ao poder que têm os partidos de centro-esquerda e esquerda. É complicado falar em polarização, quando por exemplo, a centro-direita tem apoio de 95% dos canais de televisão. Que polarização é essa? Onde a centro-direita tem apoio de 90% das estações de rádio. A hegemonia dos principais jornais do país”, explica.

 

 

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