Parentes do motorista Fabrício Queiroz, que serviu aos gabinetes de Jair Bolsonaro, agora presidente, e do filho dele, eleito senador pelo Rio, Flávio Bolsonaro, foram notificados pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. O MPRJ tomou essa atitude levando em conta o não-comparecimento do motorista nas duas audiências já marcadas. Queiroz se encontra em tratamento de saúde, e os advogados dele informaram o Ministério Público que ele somente se apresentará em juízo quando for liberado pelos médicos.
Na quinta-feira, será a vez do deputado estadual Flávio Bolsonaro (PFL-RJ), senador eleito que toma posse em 1º de fevereiro, ser ouvido pelo MP. Como deputado, contudo, Flávio dispõe da prerrogativa de adiar o depoimento, caso considere conveniente, de acordo com nota do Ministério Público.
Uma das convocadas pelo MPRJ é Nathalia Melo de Queiroz, filha do motorista e também funcionária da Alerj. Em reportagem recente, consultando o relatório do Coaf, a revista Veja destacou que Nathalia transferiu o equivalente a praticamente tudo o que recebeu da Alerj. Como o relatório não abrange a movimentação financeira total da funcionária, a revista destaca que não é possível afirmar que todos os depósitos envolvem recursos recebidos do trabalho na Assembléia Legislativa.
Nathalia trabalhou na Alerj de setembro de 2007 a dezembro de 2016. Depois passou a trabalhar de assessora no gabinete parlamentar na Câmara dos Deputados do hoje presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL) . Foi exonerada em 15 de outubro, mesmo dia em que seu pai foi desligado do gabinete de Flávio. O motivo alegado foi a aposentadoria de Queiroz como PM. O senador eleito tem se defendido, afirmando não ter cometido qualquer irregularidade como deputado.
O presidente recém-empossado da República, por sua vez, já disse que caberá a Queiroz explicar sua movimentação financeira ?- de mais de 1,2 milhão de reais no período. Admitiu ter emprestado ao ex-PM quarenta mil reais e atribuiu o depósito de 24 mil reais feito pelo ex-motorista na conta da agora primeira-dama, Michelle Bolsonaro, à quitação parcial do empréstimo feito por Bolsonaro ao ex-funcionário e amigo.
No período investigado, ainda de acordo com o relatório da COAF, Nathalia repassou ao pai 97.641,20 reais, num crédito mensal médio de 7.510,86 reais. A quantia equivale a 99% do pagamento líquido da Alerj a Nathalia em janeiro de 2016, segundo a folha salarial do Legislativo fluminense. Os cálculos da revista são por aproximação. Foram comparados o relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) da Operação Furna da Onça, além de consulta a folha salarial da Casa.
A Operação Furna da Onça investigava um esquema de propinas ligado à Federação de Transportes do Leste Meridional (Fetranspor) e dez deputados estaduais, entre os quais Chiquinho da Mangueira, do partido do governador eleito, o PSC. Flávio Bolsonaro, André Ceciliano e Carlos Minc, cujos assessores estão tendo a movimentação financeira investigada por superarem os parâmetros do Coaf, não figuram entre os indiciados.
O rol dos presos inclui os dois presidentes da casa nas últimas quatro legislaturas, Jorge Picciani e Paulo Melo, além do líder do MDB, partido dos dois últimos governadores, Sergio Cabral e Luiz Fernando Pezão.
O órgão federal mostrou que no período investigado Nathalia transferiu os 97.641,20 reais para a conta do assessor de Flávio. A cifra foi dividida pelos treze meses investigados para obter a média mensal, que foi comparada com três valores. Um foi o pagamento líquido recebido em janeiro de 2016 por Nathalia na Alerj: 7.586,31 reais. No confronto com o bruto, 9.835,45 reais, chegou-se a um repasse de 77,14%. Cotejada com a renda usada pelo Coaf, 10.502 reais, o porcentual foi de 72,23%.
A renda considerada pelo Coaf, possivelmente, incorpora valores que não constam da folha de janeiro da Alerj ou rendimentos obtidos por Nathalia de outras fontes. Todos as cifras, porém, mostram porcentuais altos de repasse, semre de acordo com o relatório da COAF.
As diligências envolvem 75 funcionários de 21 deputados estaduais, sob a suspeita de lavagem de dinheiro e transferência irregular de recursos. A origem dos 22 inquéritos em curso foi o conjunto de relatórios de movimentação elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) sobre contas de deputados estaduais e assessores, no âmbito dos desdobramentos locais da Operação Lava-Jato.
Pela divisão de trabalho vinculada a presença ou ausência de foro privilegiado, quem não dispusesse de prerrogativa de foro seria investigado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ). No total, foram contabilizados 207 milhões de reais em transações consideradas não usuais. As apurações criminais serão conduzidas pelo Grupo de Atribuição Originária Criminal do Ministério Público, que atua com o procurador-geral de Justiça. Os procedimentos, no entanto, foram divididos conforme a prerrogativa de cada parlamentar.
O montante mais elevado foi detectado nas contas do deputado estadual André Ceciliano, do PT, reeleito, presidente interino da Alerj e candidato à presidência da casa na nova legislatura, que começa 1º de fevereiro próximo, com R$ 26,5 milhões no total. Reconduzido ao cargo pelo governador Wilson Witzel, que acatou a votação dos promotores de Justiça do Estado, o procurador-geral Eduardo Gussem ressaltou em nota oficial que as movimentações financeiras dos assessores parlamentares estão sendo investigadas, no âmbito dos 22 processos, mas isso não implica necessariamente irregularidade, que dependerão do avanço das investigações, mantidas em sigilo de Justiça.
MPRJ divulga nota oficial sobre a convocação dos parentes do ex-motorista
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) esclarece que, com relação à matéria publicada no jornal O Globo desta segunda-feira (7), intitulada "Flávio Bolsonaro não responde a convite do MP", em momento algum foram passadas ao repórter as informações atribuídas à instituição. O MPRJ se limitou a replicar nota divulgada no dia 27/12, sem fornecer maiores detalhes, uma vez que, como já é de conhecimento amplo, o caso está sob absoluto sigilo e assim permanecerá.
Cabe ainda salientar que as diligências relativas aos dados enviados pelo COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) - que até 31 de dezembro era vinculado ao Ministério da Fazenda e com a mudança de governo passou para a pasta da Justiça - sobre movimentações suspeitas nas contas de servidores, vêm ocorrendo regularmente.
Com relação ao deputado estadual Flávio Bolsonaro, esclarecemos que ele foi convidado a comparecer no dia 10/01, podendo, por prerrogativa parlamentar, optar por outra data. Os demais familiares de Fabrício Queiroz foram notificados a comparecer ao Grupo de Atribuição Originária do Procurador-Geral de Justiça, GAOCRIM/MPRJ, nesta terça-feira (8).