Apesar da disponibilidade de vacina, os rotavírus ainda são responsáveis pela maior parte dos casos graves de diarreia em crianças menores de cinco anos em países de baixa e média renda, provocando mais de 200 mil óbitos por ano. É o que aponta um amplo estudo realizado pela Rede Global de Vigilância da Diarreia Pediátrica, coordenada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e com participação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).
Publicada na revista científica BMJ Global Health, a pesquisa apresenta dados do monitoramento realizado entre 2017 e 2019 em hospitais sentinelas de 28 países, abrangendo as regiões das Américas, África, Europa, Ásia e Oceania. Os resultados do trabalho reforçam a importância da imunização. Considerando o conjunto dos países, o rotavírus foi responsável por 33% das internações. Porém, o impacto do patógeno caiu pela metade nos locais com oferta da imunização.
“Esse resultado deixa claro o impacto positivo da vacina contra os rotavírus e a necessidade de fortalecer e expandir essa imunização. A OMS recomenda que todos os países ofereçam o imunizante, no entanto, menos da metade das crianças nascidas em 2018 foram vacinadas”, ressalta o virologista José Paulo Gagliardi Leite, pesquisador do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC/Fiocruz e um dos autores do estudo.
Além dos rotavírus, a pesquisa identificou outros patógenos causadores de parcela expressiva das hospitalizações infantis: a bactéria Shigella (responsável por 10% dos casos), os norovírus (detectado em 6,5% dos casos) e os adenovírus (confirmado em 5,5% dos casos).
A partir dos dados coletados, os pesquisadores estimaram o número de mortes de crianças menores de 5 anos provocadas anualmente por cada um dos microrganismos em países de baixa e média renda: 208 mil pelos rotavírus; 63 mil pela Shigella; 37 mil pelos adenovírus; e 36 mil pelos norovírus.
“A diarreia é uma das cinco principais causas de morte de crianças menores de cinco anos no mundo. São mais de mil óbitos por dia. Conhecer os microrganismos que provocam a doença é importante para traçar estratégias de prevenção e controle mais efetivas”, afirma o virologista Tulio Fumian, também pesquisador do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC/Fiocruz e um dos autores do trabalho.
“Pensando em novas vacinas, já existem estudos em andamento para desenvolver imunizantes contra Shigella e norovírus. A partir dos dados, vemos que os adenovírus também podem ser considerados nessas iniciativas”, acrescenta José Paulo.
Situação nas Américas
O continente americano foi a única região pesquisada onde o rotavírus não foi a principal causa das internações. Na América do Sul, a maior parte das hospitalizações foi devida ao norovírus. Já na América Central, a bactéria Shigella foi mais prevalente.
O estudo destaca que os seis países da região com hospitais sentinela incluídos na pesquisa (Honduras, Nicarágua, Bolívia, Equador, Peru e Paraguai) oferecem a vacina para os rotavírus em seus programas nacionais de imunização desde 2010.
Segundo os pesquisadores, os dados observados na pesquisa são compatíveis com as análises realizadas no Brasil pelo Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC/Fiocruz, que atua como centro de referência regional para rotaviroses para o Ministério da Saúde e para a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS), recebendo cerca de mil amostras por ano de 11 estados do Sul, Sudeste e Nordeste do país, além de amostras de países da América Latina (Bolívia, Equador, Paraguai e Peru).
“Como referência, analisamos não apenas os casos graves, que demandam internação, mas também ocorrências ambulatoriais, principalmente em situações de surto. No Brasil, em nossos últimos trabalhos, detectamos aproximadamente o dobro de infecções por norovírus em comparação com os rotavírus”, esclarece Tulio.
Fonte: Agência Fiocruz de Notícias