Serviço por demanda, de forma temporária e sem carteira assinada. Essa é a realidade de pessoas como o entregador Rodrigo Lopes, de 30 anos, morador do Rio de Janeiro. Há dois anos, Rodrigo presta serviço para um aplicativo de entrega de alimentos. Do final de janeiro de 2021 até o 3º trimestre de 2022, mais 200 mil pessoas passaram a integrar esse mercado chamado de Gig Economy: de 1,5 milhão saltou para 1,7 milhão trabalhadores em todo o país.
Desse total, apenas 23% contribuíram para a previdência social nessa ocupação, seja ela a principal ou secundária. Os dados são de um estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada (IPEA) divulgado nessa quarta-feira. Os dados consideram toda a categoria gig economy, expressão usada para falar daqueles que não têm vínculo formal de trabalho (sem carteira assinada), prestam serviços sob demanda e de modo temporário.
Ouça no podcast do Eu, Rio! a reportagem da Rádio Nacional sobre a precarização do trabalho, no rastro do crescimento dos serviços de entrega a domicílio e transporte por aplicativos.
Alguns exemplos são os motoristas de aplicativo, os entregadores de moto ou bicicleta, e os mototaxistas. Nos dois últimos trimestres de 2021, havia 1,5 milhão de pessoas no país nessa modalidade. No terceiro trimestre do ano passado, o número chegou a 1,7 milhão.
No mapeamento regional, os contrastes são grandes. As maiores taxas de contribuintes estão no Sul (37%), Sudeste (27%) e Centro-Oeste (22,9%). Nordeste (16,5%) e Norte (9,6%) têm taxas bem abaixo da média nacional. Entre os demais trabalhadores por conta própria que não estão na gig economy, o percentual de contribuintes para a Previdência é maior: 33%. O Ipea compara a trajetória dos dois grupos nos últimos anos e indica que, enquanto o percentual de contribuintes dessa categoria está em queda, o percentual dos demais trabalhadores por conta própria permanece estável.
A reportagem da Agência Brasil conversou com trabalhadores de aplicativo. Os motivos para não contribuir com o INSS podem incluir problemas financeiros, falta de conhecimento sobre os benefícios da Previdência e até desconfiança sobre o sistema de seguro social.
Assim como o entregador Rodrigo Lopes, a maior parte dos trabalhadores desse mercado estão em situação de vulnerabilidade, desprotegidos de eventuais riscos e sem direitos como auxílio-doença, salário maternidade e aposentadoria por tempo de contribuição.
Embora esteja em dificuldade para acertar as contas mensais, Rodrigo pensa em contribuir de forma autônoma para o INSS.
Este é o caso de Gabriel João, de 29 anos, morador da Penha, na zona norte do Rio, que trabalha de 8 a 11 horas por dia no serviço de entrega de comida por aplicativo. Antes da pandemia, ele era atendente de telemarketing e, depois de ficar desempregado, viu nas entregas de bicicleta uma oportunidade de ter renda. Gabriel diz que todo mês sobra um dinheiro que poderia ser direcionado para o INSS, mas prefere investir em aplicações como fundos imobiliários. Ele pensa em voltar a pagar a Previdência quando terminar os estudos e conseguir um trabalho com carteira assinada na profissão dos sonhos.
“No momento, estou estudando para passar no vestibular e fazer psicologia. Eu só trabalharia na minha área. Tirando isso, não sairia do trabalho no aplicativo. Já me prometeram mundos e fundos. Cheguei a largar o trabalho com aplicativo em 2021 e não fui bem-sucedido. Eles não conseguiriam me oferecer o mesmo que eu ganhava no aplicativo”, lembra.
O pesquisador do Ipea Geraldo Góes destaca a importância do trabalho prestado pelos trabalhadores de transportes inseridos na Gig Economy e avalia a necessidade de regulação do setor.
O estudo do Ipea mostra ainda a desigualdade na contribuição previdenciária por região do país. Enquanto no Sul mais de um terço dos trabalhadores contribuem para a previdência social, no Norte esse percentual fica abaixo de 10%.
Góes reforça que os números baixos de contribuintes na modalidade gig economy aumentam a vulnerabilidade dos trabalhadores, que ficam desprotegidos ante eventuais riscos. Além da aposentadoria, os que contribuem para a Previdência têm direito a benefícios como os auxílios-doença, reclusão e acidente.
“É importante pensar em termos de regulação. Na União Europeia, nos Estados Unidos e no México, já se pensa em alguma maneira de essas pessoas terem uma proteção social. É uma modalidade de trabalho muito importante, mas tem essa característica de vulnerabilidade. Daí, a necessidade de regulação”, afirma Góes.
Fonte: Agência Brasil e Radioagência Nacional