Os integrantes da CPMI do 8 de Janeiro aprovaram a convocação de ex-ministros de Jair Bolsonaro, assim como o envio dos dados extraídos pela Polícia Federal do celular do ex-presidente da República. Os primeiros depoentes deverão ser o ex-ministro da Justiça Anderson Torres e o ex-ajudante de ordens do ex-presidente, Mauro Cid.
Após mais de quatro horas de reunião, a CPMI do 8 de Janeiro aprovou nesta terça-feira (13), em blocos, a convocação inicial de 36 pessoas. Todos irão depor na condição de testemunha. Entre os convocados (veja quadro abaixo), estão nomes de integrantes do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, como o ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF Anderson Torres, o tenente-coronel Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno e o ex-ministro da Defesa Braga Netto.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) criticou o fato de a base aliada não ter aprovado a vinda do ministro da Justiça, Flávio Dino, e do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Gonçalves Dias, nem imagens do Ministério da Justiça e do Itamaraty. Mas a relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), explicou que Dino e G. Dias deverão ser ouvidos na segunda etapa das investigações.
A reunião foi marcada pelos primeiros embates entre governistas e oposição sobre os critérios e procedimentos a serem adotados no curso da investigação.
De acordo com o presidente da comissão, deputado Arthur Maia (União-BA), ainda não há qualquer acordo para o início das oitivas e nem sobre quem serão os primeiros depoentes.
— Eu vou me reunir hoje ainda com a Mesa para que nós definamos se, dentro dos que estão convocados ou convidados, já poderemos chamar alguém para a próxima terça-feira (20) — afirmou.
Centenas de requerimentos com pedidos de informações e acesso a imagens também foram aprovados. Entre eles, relatórios da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) com alertas sobre os riscos de ataques no dia 8 de janeiro. No total, foram colocados em votação mais de 285 requerimentos, sendo 181 de pedidos de informação e 39 de convocações.
Sob protesto da oposição, a maioria da comissão rejeitou uma série de requerimentos que solicitavam, entre outros objetos, acesso a imagens do Ministério da Justiça e Segurança Pública e do Itamaraty no dia do ataque. Foram rejeitados também requerimentos de convite ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, a convocação do ex-ministro do GSI Gonçalves Dias e do ex-diretor adjunto da Abin, Saulo Moura da Cunha, nomeados já no atual governo.
Eles decidiram deixar de fora desse primeiro momento da investigação o compartilhamento dos planos de segurança da viagem do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, à cidade de Araraquara, em São Paulo, no mesmo final de semana dos ataques em Brasília.
Ouça no podcast do Eu, Rio! a reportagem de Hérica Christian, da Rádio Senado, sobre a aprovação do Plano de Trabalho e dos primeiros depoimentos da CPMI mista sobre os atos golpistas de 8 de Janeiro.
Para a oposição, a articulação dos governistas para rejeitar em bloco todos os requerimentos que, segundo eles, buscam apurar uma possível omissão federal pode prejudicar a imparcialidade do relatório.
— Nós não podemos apurar apenas os atos. Nós precisamos apurar as omissões. E para ter as omissões, vários requerimentos aqui... Eu sei que já aprovaram alguns, mas tem requerimentos aqui importantes que vão dizer que tudo isso poderia ter sido evitado no dia 8 de janeiro — disse o senador Izalci Lucas (PSDB-DF).
A relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), rechaçou as afirmações de parlamentares de oposição e disse que não vai se intimidar. Ela garantiu que vai apresentar um relatório justo com a "transcrição do que realmente aconteceu" no dia 8 de janeiro, incluindo toda linha cronológica dos fatos que antecederam os ataques.
— O que nós tivemos aqui foi a confirmação e a constatação de que o foco da CPMI não será desviado. Nós fizemos um plano de trabalho, e nesse plano de trabalho nós deixamos claro o alinhamento, inclusive cronológico que seguiremos para descobrirmos quem foram os autores intelectuais, quem arquitetou e quem financiou o 8 de Janeiro. Nós não abriremos mão de fazer uma investigação que ocorreu a partir do resultados das eleições do dia 30 [outubro], dia 31, do dia 12 de dezembro e também do dia 24 de dezembro. O que tem sido colocado aqui, vez por outra, é que haveria aqui uma parcialidade, que não se sustenta no mundo real. Não se sustenta por quê? Porque os fatos estão apresentados para a sociedade brasileira.
Órgãos e ministérios como o da Justiça, Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), Secretaria de Segurança Pública do DF, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Civil e Polícia Militar do Distrito Federal deverão encaminhar informações e relatórios sobre, por exemplo, planos e estratégias para o enfrentamento dos ataques, bem como a quantidade de agentes públicos mobilizada e acionada para trabalhar nos dias 7 e 8 de janeiro na Esplanada dos Ministérios. Também foram solicitados à Polícia Militar do DF todos os processos administrativos disciplinares e inquéritos militares que envolvam os atos ocorridos no dia 8 de janeiro.
São requeridas ainda as imagens de câmeras de segurança dos Palácios do Congresso Nacional, do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF).
A Procuradoria-Geral da República (PGR), a Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério Público Militar (MPM), a Receita Federal e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) também deverão repassar informações e documentos específicos à CPMI.
Outro bloco de solicitações está relacionado às plataformas digitais. A CPMI quer ter acesso às imagens e mensagens compartilhadas em cada canal e que estejam ligadas aos ataques do dia 8 janeiro.
A relatora voltou a indicar que uma das linhas de investigação será a identificação dos autores intelectuais, dos financiadores e dos responsáveis pelos atos que, na visão dela, traçam a linha cronológica até os ataques de janeiro.
Nessa linha, a CPMI requer eventuais relatórios produzidos pela chamada Operação Petardo da PMDF, que investigou a tentativa de detonação da bomba colocada no caminhão-tanque, no dia 24 de dezembro de 2022 em Brasília.
O senador Sérgio Moro (União-PR) e o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) pediram à relatora que a CPMI "tenha responsabilidade" com as pessoas que estão sendo apontadas, no plano de trabalho e nos requerimentos, como possíveis financiadoras dos ataques.
— Existem sim os nomes que são óbvios, todos nós conhecemos, mas existem alguns nomes ali de pessoas que foram colhidas, aparentemente, talvez na internet, por suposto envolvimento nesses fatos. Nós queremos esclarecer a verdade, mas vamos reconhecer que existe também um jogo político aqui envolvido. Para muitos desses indivíduos, a convocação para ser chamado numa CPMI, a aprovação pode trazer a ruína para a vida deles, ainda mais para depor aqui com toda essa exposição — disse Moro.
Eliziane explicou que o plano de trabalho aprovado já indicava que essas pessoas seriam ouvidas como testemunhas.
— Nós deveremos saber quem financiou e quem foram os autores intelectuais do 8 de janeiro. E para que a gente possa chegar lá, nós vamos perseguir informações. Eu quero dizer ao senhor que eu tenho muita responsabilidade referente à pessoas e tanto tenho que fiz o requerimento de convocação mas nem solicitei ainda a quebra de sigilo. O que nós temos referente a essas pessoas, são pessoas que já tiveram, inclusive, bloqueio de bens. Nós temos suspeitas consolidadas dessas pessoas. Eu não peguei nome aleatório — afirmou.
Nesse sentido, entre os nomes que prestarão depoimento à CPMI, estão os empresários: Edilson Antonio Piaia, Diomar Pedrassani, Argino Bedin, Roberta Bedin, Albert Alisson Gomes Mascarenhas, Ainesten Espírito Santo Mascarenhas, entre outros.
Durante as discussões de encaminhamento, oposicionistas pediram a retirada do requerimento apresentado pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE), que pede à Polícia Federal o compartilhamento de dados extraídos de celular e outras provas referentes ao ex-presidente Jair Bolsonaro, na Operação Venire. A operação foi deflagrada com o objetivo de investigar fraudes nos cartões de vacinação do ex-presidente, de familiares e de assessores.
Na avaliação do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) e do senador Magno Malta (PL-ES), o assunto não estaria dentro do fato determinado.
Para o Rogério Carvalho, porém, é pertinente seguir essa linha de investigação porque, segundo ele, alguns diálogos e a possível fraude nos documentos poderiam estar ligados ao que estava sendo planejado para o 8 de janeiro.
— O que nós estamos pedindo (e aqui eu retifico) são as informações da Operação Venire, que levou aos diálogos que têm conteúdos sobre o 8 de janeiro de 2023 — reforçou.
Mesmo sob protesto da oposição, o requerimento de quebra dos sigilos dos celulares foi mantido na pauta e aprovado.
1 Anderson Torres, ex-secretário de Segurança do DF
2 Tenente-Coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordem do ex-presidente Jair Bolsonaro
3 Ricardo Garcia Cappelli, secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública e foi interventor da Segurança Pública do DF
4 Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do GSI
5 General Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa
6 Jorge Teixeira de Lima, delegado da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF)
7 Jorge Eduardo Naime, Coronel/PMDF então Comandante do Departamento de Operações (DOP) da PMDF
8 Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal
9 Coronel Elcio Franco Filho, ex-secretário do Ministério da Saúde
10 Gustavo Henrique Dutra de Menezes, ex-chefe do Comando Militar do Planalto (CMP)
11 Fernando de Souza Oliveira, ex-secretário executivo da Secretaria de Segurança Pública do DF
12 Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da Polícia Militar do DF
13 Robson Cândido, delegado-geral da Polícia Civil do DF
14 Marcelo Fernandes, delegado da Polícia Civil do DF
15 Márcio Nunes de Oliveira, ex-delegado-Geral da Polícia Federal
16 Milton Rodrigues Neves, delegado da Polícia Federal e ex-secretário-executivo da Secretaria de Segurança do DF
17 Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, coronel da Polícia Militar do DF e ex-chefe interino do Departamento de Operações (DOP)
18 Leonardo de Castro, diretor de Combate à Corrupção e Crime Organizado da Polícia Civil do DF
19 Júlio Danilo Souza Ferreira, ex-Secretário de Segurança Pública do DF
20 Valdir Pires Dantas Filho, perito da Polícia Civil do DF (PCDF)
21 Marília Ferreira Alencar, ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do DF
22 Ailton de Barros, ex-militar
23 Jeferson Henrique Ribeiro Silveira, motorista do caminhão-tanque onde foi colocada uma bomba nas proximidades do aeroporto de Brasília
24 Alan Diego dos Santos, suspeito de planejar o ataque a bomba no DF
25 Wellington Macedo de Souza, réu pela tentativa de explosão do caminhão-tanque
26 Adauto Lucio de Mesquita, empresário
27 Edilson Antonio Piaia, empresário e produtor rural de Campo Novo do Parecis
28 Diomar Pedrassani, empresário
29 Argino Bedin, empresário
30 Roberta Bedin, empresária
31 Albert Alisson Gomes Mascarenhas, empresário
32 Ainesten Espírito Santo Mascarenhas, empresário
33 Leandro Pedrassani, empresário
34 Joveci Xavier de Andrade, empresário
35 José Carlos Pedrassani, empresário
36 George Washington de Oliveira Sousa, gerente de postos de combustíveis
Muitos dos pedidos aprovados nesta terça-feira têm como objeto o pedido à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para o envio de todos os informes, informações e relatórios expedidos pelos órgãos os quais teriam indicado a possibilidade de manifestações violentas no dia 8 de janeiro. Os requerimentos solicitam data da expedição dos documentos, a relação dos destinatários além dos dados do protocolo de recebimento.
Também serão reclassificado de sigilosos para públicos os relatórios de inteligência produzidos pela agência desde dezembro de 2022 e que contenham alertas e análises dos riscos relacionados aos ataques aos prédios públicos ocorridos no início do ano. Serão compartilhados ainda os relatórios de inteligência produzidos pela Abin supostamente adulterados pelo ex-ministro do GSI de Lula, Gonçalves Dias.
A pedido do senador Esperidião Amin (PP-SC) e do deputado Carlos Sampaio, a CPMI terá acesso a todos os dados e inquéritos já encaminhados à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI).
Os requerimentos que pedem acesso a dados sigilosos de inquéritos que estão no âmbito do Supremo Tribunal Federal e estão relacionados ao ataques do 8 de janeiro não entraram na pauta. Arthur Maia informou que vai se reunir com o ministro da Corte, Alexandre de Moraes, ainda nesta terça-feira para deliberar sobre o assunto.
Também são requeridas informações e documentos da Vara de Execução Penal (VEP) e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), das inspeções e vistorias eventualmente existentes sobre as condições sanitárias das acomodações e da alimentação dos presos provisórios em decorrência dos fatos relacionados ao 8 de Janeiro.
A CPMI solicitou a cessão de sete servidores de outros órgãos para auxiliar nos trabalhos de investigação. Devem ser cedidos funcionários do Banco Central, Controladoria-Geral da União (CGU), Polícia Federal, Receita Federal, Tribunal de Contas da União (TCU), Procuradoria-Geral da República e Ministério Público Federal.
Os documentos e todo o andamento das investigações que estão ocorrendo no âmbito da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) deverão ser compartilhados com a CPMI.
Após as votações, Arthur Maia passou a presidência da CPMI ao segundo vice-presidente, senador Magno Malta, que deu sequência a lista de oradores. Oposicionistas seguiram criticando a conduta dos governistas na comissão.
Fonte: Agência Senado, TV Senado e Rádio Senado