Nos dias 5 e 6 de julho, o Rio de Janeiro receberá o evento que concentra um hub de conhecimento científico sobre câncer na mulher. Em pauta, os tumores de mama e ginecológicos (colo do útero, ovário, endométrio, entre outros). Trata-se do Congresso Brasileiro de Câncer na Mulher, realizado pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), consiste na união das programações do IV Congresso de Oncoginecologia e do II Congresso de Neoplasias da Mama.
Com a participação de mais de 200 palestrantes de todas as regiões do Brasil, assim como de países como Colômbia, Estados Unidos, França e Índia, o evento abordará, em uma ampla programação científica, as novas tecnologias e as inovações em cirurgia minimamente invasiva, exames de rastreamento, teste de HPV molecular, influência dos hábitos de vida na evolução da doença, abordagens clínicas para pacientes de alto risco e opções terapêuticas para redução deste risco, cirurgias preservadoras de fertilidade, dentre outros temas.
O cirurgião oncológico e presidente da SBCO, Rodrigo Nascimento Pinheiro, destaca que as mulheres representam cerca de 51,5 % da população Brasileira e, além do câncer de mama (que é 100 vezes mais comum nas mulheres), os tumores ginecológicos também figuram entre os mais prevalentes no país. “É de fundamental importância agregar um olhar mais integral à saúde oncológica da mulher. Por conta disso, estamos reunindo grandes nomes da cirurgia oncológica e das demais áreas envolvidas no cuidado multidisciplinar às pacientes”, destaca Pinheiro.
Inovação, Inteligência Artificial e Gestão de Saúde 4.0
Um dos destaques da programação é o painel agendado para o dia 5 às 12 horas, sobre Inovação em Saúde, que abordará os temas gestão da saúde 4.0, inteligência artificial, uso de ChatGPT e plataforma de IA na Oncologia e a ética na decisão por novas tecnologias. Em cirurgia, a inovação é observada principalmente nas novas tecnologias associadas com as técnicas minimamente invasivas, tanto nas videolaparoscopias, quanto na cirurgia robótica.
Nos últimos cinco anos, com a queda da patente do robô, novas plataformas chegaram e, com elas, diferentes dispositivos, além de um preço mais competitivo e acessível para as fontes pagadoras e pacientes. Dentre os avanços mais recentes em robótica estão o uso da internet 5G. “Já é uma realidade a realização de cirurgia à distância. São pacientes que podem ser operados e cuidados a quilômetro de distância. Temos o robô transmitindo para o console, controlado pelo cirurgião, a sensação tátil do procedimento. É uma tecnologia que propicia um menor trauma cirúrgico para o paciente e com isso uma recuperação mais acelerada”, afirma o cirurgião oncológico e diretor da SBCO, Marcos Gonçalves Adriano Júnior, ou como ele gosta de ser chamado, "Jota". O especialista acrescenta que a cirurgia robótica também terá um ganho com a inteligência artificial. “Em pouco tempo e com a evolução exponencial que estamos vivendo, havendo qualquer movimento temerário ou não adequado, o sistema emitirá sinais e poderá até suspender o funcionamento. É como se fosse "dito" para o cirurgião, por exemplo, cuidado, você está chegando próximo a uma estrutura nobre”.
A cirurgiã oncológica Jacqueline Menezes, que também integra a diretoria da SBCO e presidirá a mesa de Inovação em Saúde, afirma que os novos dispositivos em cirurgia minimamente invasiva, como grampeadores automáticos e pinças ultrassônicas, ajudam em todas as fases do perioperatório (antes, durante e após a cirurgia). “A cirurgia não começa na hora que o paciente está na mesa para ser operado. É uma maratona, que começa no consultório, com avaliação de todos os critérios clínicos do paciente. É preciso não só conhecer a doença, como também o paciente como um todo”, explica.
Em Oncologia, explica Jacqueline Menezes, as cirurgias costumam ser longas e complexas, por vezes, multiviscerais (com substituição de diversos órgãos). Com isso, toda tecnologia, que agrega na linha de cuidado completa, é bem-vinda. “O grampeador automático, por exemplo, é uma nova tecnologia que, para uma mulher de menor estatura e mão pequena – como é o meu caso – seja capaz de realizar uma anastomose do reto, algo que é muito difícil. Com o grampeador automático, apenas se aperta um botão e ele mesmo já calcula a espessura do tecido e a velocidade certa para o procedimento”, relata Jacqueline. Marcos Adriano Jota complementa, afirmando que, por meio do grampeador, “se consegue medir a espessura do tecido e entregar a força de grampeamento necessária para cada órgão, além de propiciar um melhor ângulo de ataque para explorar localizações mais difíceis”.
No cuidado perioperatório, declara Marcos Adriano Jota, é fundamental se conhecer profundamente as necessidades do paciente, desde o diagnóstico, passando pela cirurgia e internação hospitalar, até o pós-operatório quando o paciente já está em casa, garantindo um cuidado contínuo e global. “Com isso, haverá o aproveitamento das ferramentas tecnológicas disponíveis para cada vez mais integrar e interligar todas as etapas do cuidado cirúrgico”, reforça. Sobre esse tema, Jacqueline Menezes complementa, afirmando que as novas tecnologias propiciam otimizar protocolos, além de monitorar a jornada do paciente por meio de ferramentas que envolvem inteligência artificial, chatbot e outras soluções digitais já disponíveis e, muitas outras, em desenvolvimento.
Uma substância verde que auxilia na cirurgia robótica - Embora sem indicações em câncer de mama, a cirurgia robótica tem protocolos bem estabelecidos para pacientes com tumores ginecológicos, especialmente em casos de câncer de endométrio, ovário em estágio inicial e câncer de colo do útero em casos selecionados. Somado ao conhecido potencial da cirurgia robótica (assim como a laparoscopia) ser uma abordagem minimamente invasiva - que resulta em menos sangramento, menos dor e menor tempo de internação – há avanços que aumentam a eficácia do procedimento.
Dentre os elementos que otimizam a cirurgia robótica estão a aplicação de inteligência artificial e a cirurgia guiada por imagem, com destaque para as reconstruções 3D para planejamento cirúrgico, realidade virtual, hologramas ou cirurgia guiada por traçador. O traçador consiste em uma substância fluorescente guiada por indocianina verde (ICG), que proporciona uma nova perspectiva para o cirurgião em atividade. Ele tem sido usado para identificar estruturas anatômicas, avaliar a perfusão tecidual e identificar tumores ou drenagem linfática tumoral.
A indocianina verde é uma molécula fluorescente, que, por meio de uma luz infravermelha – usada em fotografias e desde a década de 1950 na avaliação da função hepática e cardíaca – está sendo usada na cirurgia robótica para investigação de linfonodos, o que permite otimizar a necessidade de se remover tecidos, reduzindo assim o risco de complicações, como o linfedema. Em cirurgia onco-ginecológica, é indicada principalmente quando há risco de aderências no peritônio (que órgãos se “grudem” um ao outro). “Com isso, reduzimos o risco de sangramento, diminuímos o tempo da cirurgia, o paciente inflama menos, ou seja, oferecemos uma cirurgia oncológica segura”, afirma Jacqueline Menezes.
Gestão de saúde 4.0
Tão importante quanto a inovação refletida em novas tecnologias é a inovação a serviço do cuidado centrado no paciente, de tal forma que resulte no melhor desfecho clínico-cirúrgico. Nesse sentido, entra a gestão de saúde dita 4.0, que começa por diferenciar as funções do gestor do cuidado (profissional de saúde que cuida do paciente em toda a sua jornada e peça chave nesse novo modo de gerência) e do executivo de saúde (que tem um olhar mais empresarial para o setor).
“Em amplitude, o gestor do cuidado é como um drone, que olha tudo por cima, enxergando o paciente como um todo e por toda sua trajetória, de uma maneira mais abrangente. Com foco no paciente cirúrgico oncológico, ele está ao lado do paciente a partir do diagnóstico, durante o tratamento e pós-operatório, enfim, em todas as etapas da jornada”, ressalta Marcos Adriano Jota.
Para tanto, explica o especialista, é fundamental que o cuidado seja coordenado. “É preciso saber atuar com gestão de processos e de pessoas e ter conhecimento técnico em saúde. Assim, se consegue modelar processos eficientes e jornadas enxutas de cuidado, que entreguem valor para o paciente. A tecnologia é o meio, não o fim, para que você consiga entregar os desfechos desejados, mas só ter essa tecnologia não é o suficiente”, reforça.
Dentro do conceito de gestão de saúde 4.0, outro aspecto essencial, no entendimento de Marcos Adriano Jota, se refere à tomada de decisão de tratamento, referente ao cuidado a cada paciente. O cirurgião oncológico explica que há três tipos de decisão: delegada, consentida e compartilhada. A decisão delegada consiste em ter o médico se abstendo de propor participar de decisão, deixando o “menu” com o paciente, para que ele escolha, sozinho, o caminho a seguir. A decisão consentida é quando o médico informa ao paciente o que será feito e ele apenas aceita a imposição. A terceira é a decisão compartilhada, na qual são apresentadas as opções (assim como nos casos anteriores), mas o melhor caminho, com seus prós e contras, é definido na relação médico-paciente e utilizando, dentre as diversas soft skills necessárias, a empatia no seu mais alto grau. “É sempre melhor construir uma decisão compartilhada, pois essa abordagem une a evidência científica com aquilo que o paciente deseja para sua vida".
Outra abordagem do painel Inovação em Saúde será sobre ética na decisão acerca das novas tecnologias. “Qual é o desfecho que mais importa para o paciente? Viver mais tempo ou viver com qualidade de vida? Ou um balanço entre os dois? O que ele deseja preservar ou não? É uma visão holística para quem realmente importa, o paciente, e não para a doença. O médico que não entender isso e continuar entregando apenas o aspecto técnico, e não humano, do cuidado, será uma commodity. Ser ético é, como um exemplo, não indicar a cirurgia robótica para uma paciente que irá se beneficiar da mesma forma ao optar pela laparoscopia. É escolher o método que entrega o melhor desfecho possível pelo menor custo global do cuidado, trazendo sustentabilidade para o sistema”, afirma Marcos Adriano Jota.
Câncer de mama e ginecológico em números
Três em cada dez casos de câncer nas brasileiras ocorrem nas mamas. Em 2024, segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCA), são esperados 71.730 novos casos de câncer de mama. Entre os tumores ginecológicos, o mais comum no país é o de colo do útero, com 17.010 novos casos previstos para este ano, superando o câncer de corpo do útero (endométrio) com 8.140 e câncer de ovário, com 7.310.
SERVIÇO
Congresso Brasileiro de Câncer na Mulher
IV Congresso Brasileiro de Oncoginecologia e II Congresso de Neoplasias da Mama
Realização: Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO)
Data: 5 e 6 de julho de 2024
Local: Sheraton Grand Rio Hotel
Endereço: Av. Niemeyer, 121 - Leblon, Rio de Janeiro
Mais informações e inscrições para o público geral: https://cancerfeminino.com.br/