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Futuro do jornalismo e experiências nas ruas cariocas: Fábio Ramalho fala o que pensa

Profissional da RecordTV analisa como o digital tem transformado o meio e revela os cuidados que precisou tomar em situações de risco durante o quadro "Achamos no Rio"

Por Gabriel Gontijo em 11/08/2019 às 16:18:27

Foto: Divulgação

O número de profissionais demitidos da área de comunicação nos últimos anos tem se acentuado em inúmeros veículos. E por causa da crise que atinge o Rio de Janeiro desde o final de 2014, a situação é mais crítica no estado fluminense, principalmente na capital. Por causa desse cenário, inúmeros jornalistas trabalham desde então em outras áreas e tornou-se comum expressões do tipo "o jornalismo morreu" ou "comunicação já era". Em compensação, há quem defenda ser necessário um processo de requalificação, que também é entendido como reinvenção. É no cerne deste debate que o jornalista Fábio Ramalho sugere que o profissional do meio precisar estar atento com algumas mudanças para continuar na área.

Profissional da Record Tv Rio, o jornalista tem um quadro chamado "#Partiu" e com apenas um celular Fábio filma situações cotidianas da Cidade Maravilhosa, além de abordar os moradores da cidade para ouvir suas opiniões sobre um determinado assunto. Em conversa com o "Portal Eu, Rio!", o brasiliense que reside há quase 20 anos na capital fluminense aborda diversos aspectos relacionados ao futuro da comunicação, os desafios de se fazer jornalismo na atualidade e algumas situações inusitada que lhe aconteceram durante as gravações.

Portal, Eu Rio: O jornalismo atual passa por um momento bastante crítico. Muitos enxergam o digital como alternativa, mas o mercado publicitário ainda não o "abraçou" totalmente. Diante disso, como se reinventar sabendo que no início a falta de dinheiro pode pesar?

Fábio Ramalho: Não é que o mercado publicitário não abraçou o digital. É que o mercado demorou a acreditar no digital. As agências de publicidade só acreditaram que o digital estava ali pro que desse e viesse quando começaram a sentir no bolso a perda de anunciantes nas mídias tradicionais. Se uma empresa de calçados percebe que dar pares de tênis da moda para celebridades da web divulga bem o produto, porque pagar milhões para o anúncio em outros veículos? Foi esse "chute na canela" que as agências não estavam preparadas e ainda se adequam pra superar. Levar então a linguagem de internet para a TV e sobretudo baratear os custos de propaganda em TV foi uma alternativa para se adequar a essa nova realidade. Esse é o exercício de se reinventar que eu fiz e que a emissora fez junto, criando alternativas para a linguagem, e para a entrada de patrocínios, anunciantes.

Portal Eu, Rio! Tua iniciativa lembra muito com um programa que o João Gordo teve na MTV em 2007, o "Gordo Viaja". Era um programa de 30 minutos feito totalmente pelo celular. Já o teu formato é de quadro destacando as coisas boas do Rio. Mas o espaço entre um e outro é de 12 anos. Na tua avaliação, por que isso ainda não é mais explorado na televisão?

Fábio Ramalho: Nos primórdios do celular era assim: você comprava um telefone que tinha uma câmera. Hoje eu poderia te dizer tranquilamente que temos câmeras, que, quase que por um acaso, também servem como telefone! Essa ordem dos fatores altera totalmente o produto no caso de gadgets e tecnologia. Gravar com o celular se popularizou com quem usa celular - ou seja todo mundo - e não com que usa câmeras. O celular virou uma forma rápida, despretensiosa e nada profissional para se gravar algo. Pode tremer, gravar contra a luz, até mesmo sem ter a melhor luz. A referência de gravações feitas com celulares era essa. Por isso imagem do celular virou o sinônimo do flagrante, do meme, e quase nunca da direção de fotografia, da qualidade de vídeo, da captação com excelência. Por isso o celular nunca foi visto como a nova tecnologia capaz de competir com as câmeras profissionais. Nem eu nem ninguém que grava com celular inventou a roda. A gente só adaptou. Muita gente vem me perguntar se o que colocamos no ar é realmente gravado com celular. Nossos conceitos ainda são amarrados a realidade de que com o celular não se pode ter resultado profissional. Exatamente por isso, o celular, não se solidificou como equipamento profissional para captação de imagens.

Portal Eu, Rio: Muitos afirmam que a comunicação atual está no esquema "quanto menos, melhor". Porém, dentro desse contexto, o funil ficaria mais estreito dentro de uma lógica simplista. Diante disso como continuar incentivando alguém a entrar para jornalismo/comunicação?

Fábio Ramalho: O incentivo vem de se explicar quais são os novos desafios da profissão e perguntar em alto e bom tom depois: "está mesmo disposto a isso?" Quando a resposta é sim, aí você percebe que existe existe um talento nato para a profissão. Caso contrário, não tem porque seguir. Abordo sempre esta temática em minhas palestras. Professores de jornalismo ou me amam ou me odeiam, porque faço muita. gente repensar se quer mesmo se tornar jornalista. O mercado de trabalho mudou e hoje o que se aprende no primeiro semestre da faculdade pode não ser a mesma coisa que se aplica no mercado até pegar o canudo. Tudo mudou: salários, mercado, redações, aplicações do que se aprende. Nem mesmo as faculdades conseguiram se atualizar tão rápido! É por isso que o nome da minha palestra mais pedida é "Apertem os Cintos o Emprego Sumiu". Mas posso garantir que quem sai dela motivado, sabe que tem futuro certo.

Portal Eu, Rio: Há mais de 10 anos, o STF determinou que não é necessário ter diploma de jornalismo para exercer a função. Isso permitiu que muitos blogueiros se autodenominassem profissionais da mídia e com a "avalanche" do digital isso ficou mais acentuado. Como um jornalista pode ser visto como alguém diferente e sobreviver a essa "selva"?

Fábio Ramalho: O contexto de "ser diferente" não depende necessariamente de um diploma. Não precisa voltar muito no tempo para se ter a prova disso: muito dos apresentadores de telejornais da década de 80 não eram necessariamente formados e foram pessoas que marcaram o jornalismo brasileiro. Eu poderia citar vários. Mas isso, nem de longe, significa que não é preciso estudo. O meio acadêmico, para qualquer profissão traz vivências, aguça a busca intelectual e o mais importante: ajuda a "peneirar" quem de fato vai trabalhar na área. Recebo muitos pedidos de emprego de quem quer trabalhar em jornalismo na TV. Entretanto quando pergunto se quer estudar 4 anos, mesmo que seja de forma gratuita, a resposta muda.

Portal Eu, Rio: Apesar do Rio ser belíssimo por natureza, há o crônico e histórico problema da violência. Houve alguma situação que você precisou ser ágil para não roubarem teu celular ou algo do tipo?

Fábio Ramalho: Já passei sim. Se gravar com um carro de reportagem, um cinegrafista e um iluminador já envolve riscos - inclusive porque os equipamentos são caros - imagine quando você está sozinho? Em lugares com riscos de roubos assaltos, a primeira coisa que você faz é esconder o celular no bolso, certo? Eu tenho que fazer o contrário! Esticar o braço para gravar, afastar o celular de mim. Por isso que sempre saio para gravar meu quadro com um motorista da emissora que acaba fazendo as vezes de segurança. Ele está de olho em volta quando eu estou focado na história que estou contando. Passei a sair para as gravações pensando nisso depois que de fato tentaram bater com a mão no celular para ele cair e roubarem. Por sorte o larápio não conseguiu , eu estava coma mão "colada", apertando forte o aparelho. Mas o meu crachá que estava no bolso foi embora. Menos mal...

Portal Eu, Rio: Qual lugar com história que você ainda não fez um vídeo justamente pela falta de segurança?

Fábio Ramalho: Honestamente... nenhum. Eu nunca fui expulso de comunidade no Rio. Muito pelo contrário, tiro foto com quem me pede, seja policial ou traficante. Ja me pediram para tirar uma foto com a pessoa segurando um fuzil. Eu gentilmente pedi que ele largasse a arma para dar o clique. Não me neguei. Mas vou fazer o que? Eu respeito policiais, milicianos e bandidos. Se eles estão ali, de uma forma paramilitar, é porque o poder público falhou em algum momento. Não é o que eu sonho para o Rio de Janeiro. Mas eu não trabalho com segurança pública, eu trabalho com entretenimento, com divertir as pessoas. Se quem se diverte com o que eu faço é do bem ou do mal, eu não tenho como mudar isso.

Portal Eu, Rio: Nas gravações para seus quadros na Record, qual foi a situação mais curiosa que te aconteceu?

Fábio Ramalho: Acontecem várias, de todos os tipos e todos os dias. É até difícil citar. Tem dia que eu saio pra gravar e parece que encontro apenas pessoas sóbrias, centradas e sem muita aptidão para divagar sobre algum tema. Em outros dias, parece que as portas de um hospício foram abertas: só encontro pessoas "malucas" como eu, que trazem as melhores sonoras! A maior matéria prima para o que faço é GENTE. Aí tem quem pede tirar foto; tem gente que para pra reclamar de alguma coisa e por aí vai. Recentemente vi duas idosas caminhando vagarosamente, de braços dados, mas olhando atentamente para o que eu estava gravando do outro lado da rua. Mas olhando TÃO ATENTAMENTE, que esqueceram de olhar para frente! Uma delas - certamente com mais de 75 anos - tropeçou e caiu no chão, a ponto de ralar o joelho e quebrar um dente na calçada! Apesar de ter sido ela que não olhou para frente, eu me senti tão responsável pela queda - afinal ela estava olhando pra mim - que parei o que estava gravando e ajudei a levantá-la, a pedir uma ambulância para que fosse levada ao hospital e a consolar aquela senhorinha tão fofa. Só não fui junto porque a irmã dela chegou e foi na ambulância junto. Minha mãe tem 82 anos então logo imagino: e se fosse ela?

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