A apuração sobre o possível deslocamento de competência foi iniciada após a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) – instituição judicial autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA) –, que condenou o Estado brasileiro por não garantir a realização da Justiça com a punição dos culpados. No documento, a PGR aponta para a presença simultânea dos requisitos necessários para levar o caso à esfera federal. Foram constatadas a grave violação dos direitos humanos e a possibilidade de responsabilização internacional, decorrente do descumprimento de obrigações assumidas pelo Brasil em tratados internacionais. Além disso, mais um critério foi atendido para viabilizar o pedido: a evidência de que os órgãos do sistema estadual não mostram condições de seguir no desempenho da função de investigação, processamento e julgamento do caso.
A PGR também chama atenção para a jurisprudência do STJ, que determina que o simples risco de responsabilização internacional do Brasil, estando presentes os demais requisitos, dá causa ao deslocamento de competência para a esfera federal. O objetivo da federalização é assegurar o cumprimento da sentença da CIDH no que diz respeito ao direito à proteção judicial e às garantias de independência e imparcialidade da investigação, devida diligência e prazo razoável, em observância aos compromissos assumidos perante a comunidade internacional. "O Brasil efetivamente foi responsabilizado, não se tratando mais de mero risco, cabendo agora cumprir a sentença interamericana. Anote-se que, anualmente, o país deve prestar contas sobre o cumprimento da sentença à Corte", enfatiza Raquel Dodge.
Ao justificar o pedido, a PGR também destaca que já se passaram 25 anos sem a adequada apuração dos fatos. "Além do tempo excessivo e injustificado das investigações, sem nenhum resultado para o esclarecimento dos fatos, também a forma de atuação das autoridades locais – com gestos abonadores das condutas policiais até então sendo investigadas – demonstrou a falta de isenção e de vontade política para apurar e responsabilizar os envolvidos. Houve quebra de confiança daqueles que esperaram – e ainda esperam – longamente por resposta estatal adequada aos fatos gravíssimos mencionados", frisa a procuradora-geral. Dodge complementa que os casos merecem investigação realizada em ambiente isento, afastado de possíveis intervenções que prejudiquem, novamente, a busca por respostas à sociedade, às vítimas e a seus familiares.
Com site do Ministério Público Federal