Em ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal determinou, em liminar, a suspensão dos efeitos da Portaria Ministerial n. 1.576/2019 e a conclusão por parte da União e da Ancine do Processo Administrativo referente à Chamada Pública BRDE/FSA-PRODAV – TVs Públicas – 2018, segundo as regras do edital.
Ministro da Cidadania, Osmar Terra havia suspendido o edital para a seleção de obras de audiovisual independentes que seriam veiculadas em TVs públicas. O motivo foi a crítica do presidente da República a peças com temáticas LGBTs que estavam entre as selecionadas. Para a Justiça, "os direitos fundamentais a liberdade de expressão, igualdade e não discriminação merecem a tutela do Poder Judiciário, inclusive em caráter liminar".
Na decisão, a Justiça destaca que já foram transferidos ao BNDES e ao BRDE R$ 525.000,00, a título de gestão financeira, "havendo, ainda, o risco de vencimento de novas parcelas, em decorrência da indefinição do certame", concluindo, então, "que a demora na finalização do concurso poderá, também, trazer prejuízos ao erário".
Ministério Público Federal moveu ação civil por Improbidade Administrativa contra ministro da Cidadania e Ancine
No começo deste mês, o MPF ingressou com ação civil contra o ministro da Cidadania Osmar Terra pela prática de ato de improbidade administrativa. A portaria editada pelo ministro foi motivada por discriminação contra projetos com temática relacionada a lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis – LGBTs, dentre os quais os documentários "Sexo Reverso", "Transversais", "Afronte" e "Religare Queer", desmerecidos pelo presidente da República em vídeo publicado no dia 15 de agosto de 2019.
Os fatos narrados na ação do MPF constam de inquérito civil com mais de 900 páginas, instaurado para investigar a prática de eventual censura e discriminação na suspensão da Chamada Pública BRDE/FSA/Prodav – TVs Públicas 2018, voltado à "seleção, em regime de concurso público, de projetos de produção independente de obras audiovisuais seriadas brasileiras, com destinação inicial para os canais dos segmentos comunitário, universitário, e legislativo e emissoras que exploram o serviço de radiodifusão pública e televisão educativa".
Coordenado pela Ancine, o concurso foi iniciado em março de 2018 e, em agosto de 2019, quando foi editada a portaria ministerial, estava em sua fase final. Contemplava projetos variados, agrupados em catorze blocos temáticos ("Livre", "Ficção-Profissão", "Ficção-Histórica", "Sociedade e Meio Ambiente", "Raça e Religião", "Diversidade de Gênero", "Sexualidade", "Biográfico", "Manifestações Culturais", "Qualidade de Vida", "Jovem", "Documentário Infantil", "Animação Infantil" e "Animação Infanto-Juvenil").
Consta do processo administrativo do concurso que 801 propostas estavam inscritas. Na fase de avaliação, 613 propostas passaram pela análise de 121 pareceristas selecionados por meio de edital público. Conforme as regras do edital, foram classificados os cinco projetos com melhor pontuação para cada bloco temático/região, totalizando 289 produções.
Para o MPF, o verdadeiro motivo da suspensão foi impedir que os projetos mencionados pela Presidência da República sagrassem-se vencedores. Como não havia meio legal de impedir que somente os quatro projetos fossem excluídos do concurso em sua fase final, a "solução" encontrada foi a de sacrificar todo o processo. Como registra a ação, além do dano aos cofres públicos causado pela suspensão do concurso, "a discriminação contra pessoas LGBT promovida ou referendada por agentes públicos constitui grave ofensa aos princípios administrativos da honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade as instituições".
A ação lembra que em junho de 2019 o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADO 26/DF, afirmou expressamente que "os homossexuais, os transgêneros e demais integrantes do grupo LGBT têm a prerrogativa, como pessoas livres e iguais em dignidade e direitos, de receber a igual proteção das leis e do sistema político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que exclua, que discrimine, que fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. (...) O Estado não pode adotar medidas nem formular prescrições normativas que provoquem, por efeito de seu conteúdo discriminatório, a exclusão jurídica de grupos minoritários que integram a comunhão nacional".
Fonte: Com site do Ministério Público Federal