Cá entre a gente: quanto tempo você demorou hoje para olhar seu celular a partir do momento que acordou? Daí você pega, vê uma mensagem, um reels, confere o resultado do jogo de ontem e por aí vai.
Mas isso está longe de ser uma situação comum, por mais incrível que possa parecer. Cerca de 36 milhões de brasileiros não acessaram a internet em 2022. O número equivale a 19% da população com dez anos ou mais. Vamos deixar isso mais tangível: imagine toda a população das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Vitória. Somadas, isso é ainda metade desse quantitativo.
Os dados são da pesquisa TIC Domicílios, do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação divulgada neste mês de maio. E sabe o que ainda é mais impressionante nesse levantamento? A maioria está justamente no Sudeste (aposto que, assim, de bate-pronto, você imaginou o Norte ou os rincões do Nordeste). A região é a que mais registrou número de pessoas sem internet no país, representando 42% daqueles que não acessam, o que corresponde a 15 milhões de pessoas. O Norte aparece em 2º, com 28% dos casos, ou 10 milhões de brasileiros.
Nosso país possui ainda um percurso significativo a ser trilhado em relação à universalização do acesso, demandando a adoção de estratégias específicas para promover a inclusão digital das populações mais vulneráveis. Se fizermos um recorte de classe, a gente vê que uma em cada três pessoas da classe D e E não tiveram contato com ambiente digital em 2022. O levantamento também mostra que o percentual de pessoas sem internet país está concentrado na faixa etária de +45 anos, representando 72% do total.
Além disso, não por acaso, a falta de acesso à internet é maior entre os brasileiros que se autodeclararam negros. Esse grupo equivale a 58% dos registros (21 milhões de pessoas).
É comum, hoje, escutarmos que o digital não é mais um meio. Mas, sim, um “comportamento”, “atitude” ou “visão de mundo”. Aí eu lhes pergunto: como isso vai valer para 36 milhões de brasileiros? Esses números nos mostram que estamos longe de uma democracia digital. Vendo por uma outra ótica, estão longe de ter uma cidadania plena (afinal, ela evolui conforme a sociedade se altera). Apesar da pandemia de Covid-19 ter auxiliado na aceleração de um comportamento mais digital, precisamos de políticas públicas eficazes para desenvolver (e devolver) essa cidadania.
Então, quando falarem para sermos inovadores e disruptivos, é preciso olhar com atenção para quem queremos ser inovadores. Caso contrário, a tecnologia digital se torna apenas mais um elemento que serva para distinguir pobre de rico.