Dia da Marmota

Semana passada fui visitar um amigo que estava desmontando um local de trabalho, que tinha quadros meus nas paredes. Como ela estava se desfazendo de tudo, por conta de se mudar definitivamente para Portugal, fui pegar meus trabalhos. Assim que cheguei, senti aquele aperto no coração, por mais um local que fecha e de um amigo que se vai. Levante as mãos aqueles que tem amigos, parentes ou até conhecidos que se foram para Portugal? Já dá até para eles começarem a fazer piadas de nós. Eu entendo os motivos dele, que se equivalem em algumas partes aos meus, mas me contento em ficar por aqui na América do Sul. Alô, Alô embaixadas da Argentina, Chile ou Uruguai, podem me adotar! Pois bem, no meio da mudança que estava fazendo com parentes e amigos, tentei falar com esse meu amigo que estava em conferencia através do whatsapp, com profissionais da terrinha. Logo que ele teve o tempo de intervalo, foi falar comigo. Não um “oi”, não um “Como vai”, mas:

- Caramba cara! Faz um pouco mais de 20 dias e ELE não tem uma proposta de governo!

Ele, a quem se refere, seria nosso atual presidente da república. E pare para pensar. É verdade. Estamos ainda enfrentando enxurrada de fakenews, declarações absurdas, como se estivéssemos presos no dia da Marmota! Parece que ainda estamos em campanha e a sensação não é boa! No dia da Marmota, no filme Feitiço do tempo, onde o personagem Phil, de Bill Murray, fica preso no mesmo dia. Toda manhã ele era acordado na mesma hora, pela mesma música e as pessoas estavam fazendo as mesmas coisas, as mesmas falas dia após dia. Não adiantava a mudança de uma coisa ou outra, toda manhã, era a mesma situação. Me sinto desta forma. Uma grande variável de 1992, mas estamos todos presos na mesma situação da eleição do ano passado, o ano que parece não ter terminado. A diferença, é que no fime, o ator que está nessa situação, depois de muito aprendizado, se livrou da maldição. O que não dá para falar o mesmo de nós...

Outra diferença é que entraram novos atores e apoiadores do atual presidente. Um grupo novo de empresários. Isso irritou muito as velhas oligarquias, que não pegaram sua fatia do bolo. Além deles, quem sai perdendo, evidentemente, é o povo assalariado e a classe média, sempre achatados pelo neoliberalismo. A ultradireita não imaginava esse efeito criado com tamanha força, repartindo o país. No período de eleição, a esquerda ficou sem entender a estratégia e a direita saiu arranhada e enfraquecida, associada a antiga oligarquia permanente do poder.

Um terço apostou na ideia de uma pessoa ilibada, acima de qualquer suspeita e que não iria fazer a política tradicional, colocando a família em primeiro lugar, tradição e propriedade. Um terço não quis se envolver e um terço conseguia enxergar além do marketing fictícioso (se é que essa palavra existe). Aquele um terço que acreditou, já está diminuindo sua credibilidade, diante de tantos fatos, que mostram exatamente ao contrário que foi vendido a essas pessoas. Foi uma aposta audaciosa. A questão brasileira, é de um modo ou de outro, uma questão que está se alastrando pelo mundo. Mas não se engane, a receita neoliberal faz crescer a esquerda, mas infelizmente, também cresce a extrema direita. Foram crises de um certo liberalismo e desemprego, que alimentaram o fascismo nos anos 20.

Naquela época, assim como nos dias de hoje, a extrema direita explorava o medo do comunismo, uma xenofobia que nem naquela época existia, nem nos dias de hoje. E hoje, depois de 34 anos, o Brasil amanheceu com um general na Presidência da República. A extrema direita cresceu novamente e quando os barulhos de festas forem interrompidos pelos barulhos de coturnos nos corredores, não haverá cassetete só para os inimigos declarados, mas será para todos que discordarem. Quem disse que essa realidade não voltaria? Disseram o mesmo do ioiô.