A dois dias do Dia da Justiça – que é neste domingo – o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, desembargador Cláudio de Mello Tavares, não quis se manifestar sobre a decisão do desembargador Edson Vasconcelos, que determinou a retirada, do portal Eu, Rio!, de matérias sobre mau atendimento prestado por residentes na Santa Casa de Misericórdia do Rio, sem a devida assistência de professores e médicos responsáveis. A liminar foi dada no último dia 29 atendendo a um pedido de tutela de urgência em processo impetrado pela direção da Santa Casa, e, com isso, quatro vídeos produzidos a partir de denúncias por pacientes da unidade hospitalar tiveram que ser removidos do portal.
"Esta matéria está judicializada e não posso me manifestar. É questão dos advogados das partes se entenderem e apresentarem recursos", disse o presidente do TJ, que preferiu não comentar a posição da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que protestou na última quarta-feira contra o que considerou censura a um trabalho jornalístico e apresentou petição no TJ para funcionar como amicus curae em agravo de instrumento, protestando pela incabível censura e requerendo sua revogação.
Na comemoração do Dia da Justiça, Tavares entregou o Colar do Mérito Judiciário a 35 personalidades que prestaram relevantes serviços ao Judiciário, como o governador Wilson Witzel; o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes; e o senador Arolde de Oliveira; entre outras autoridades e servidores. A solenidade foi realizada no Palácio da Justiça, no centro.
Para a autora das quatro matérias que saíram na TV Eu, Rio!, dentro do portal, a jornalista Cláudia Freitas, a resposta de Tavares foi positiva. "Significa que ele já está sabendo da liminar e tem conhecimento das reportagens que fizemos", explicou a repórter. "Fui procurada por cinco mulheres que foram pacientes da Santa Casa e que me fizeram as denúncias. Segundo elas, os residentes fizeram os procedimentos sem nenhuma orientação e as cirurgias foram mal sucedidas. De acordo com as denunciantes, teve um caso até de mutilação de um seio de uma paciente", relatou Cláudia.
Os vídeos foram postados no site há menos de um mês. "O diretor da Santa Casa, Francesco Mazzarone, entrou com um processo judicial, alegando que o trabalho não tem nada de jornalístico. Eu ouvi as pacientes e dei espaço para a instituição se manifestar. Mas, o diretor se recusou", contou a autora das reportagens. Ela adiantou que não vai parar de denunciar as irregularidades. "Vamos continuar denunciando o que acontece no hospital e fazer outras reportagens investigativas", disse.
Segundo Mazzarone, no processo, as reportagens são sensacionalistas e violam sua honra e imagem, além da reputação do hospital. Em sua decisão, Vasconcelos determinou a retirada das reportagens do ar, sob pena de multa diária de mil reais.
Esta semana, o TJ deverá analisar a petição da ABI para entrar como participante do processo. A entidade classifica o ato do desembargador de "autoritário" e demonstra que ele colide com inúmeras decisões do Supremo Tribunal Federal que já decidiu ser inconstitucional qualquer tipo de censura. "(?) a diretoria da ABI confessa-se surpreendida ao tomar conhecimento da decisão exarada por V. Ex.ª nesses autos, determinando a censura ao Portal Eu Rio, na série denominada "Portal Eu,Rio! destrincha situação da Santa Casa".
Mais surpreso, ainda, ficamos ao constatarmos que V. ex.ª recorreu ao nosso site para justificar uma medida que, como firmado em diversos julgamentos, o Supremo Tribunal Federal considera totalmente inconstitucional, por ferir cláusulas pétreas da nossa Carta Magna". (grifos do original)
Segundo ainda a ABI, Vasconcelos não reparou no que disse a juíza Maria Cecilia Pinto Goncalves, da 52ª Vara Cível, ao rejeitar o pedido de censura na ação de "indenização para reparação de danos morais e materiais cumulada com obrigação de fazer com pedido de tutela provisória de urgência proposta por Mazzarone . "A veiculação de informações baseadas em fatos reais, objeto de reclamações de inúmeras pacientes junto à jornalista deve ser permitida, a fim de evitar a vedação à liberdade de expressão, sendo que as imagens devem ser analisadas à luz da liberdade de manifestação de pensamento. (...)
Os fatos narrados foram divulgados pelo réu, não tendo sido emitido juízo de valor, tendo sido entrevistadas inúmeras pacientes, que se limitaram a relatar as experiências vividas, conforme verificado junto aos links apontados pelo autor.