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Novo coronavírus: contaminação de esgoto preocupa cientistas e ambientalistas

Presença do coronavírus em fezes de pacientes pode contaminar trabalhadores do setor de saneamento diz estudo

Por Claudio Rangel em 05/04/2020 às 21:47:01

Foto: Claudio Rangel

No início do século XX, o médico e cientista Oswaldo Cruz lutava para convencer a população e a elite quanto a importância da vacina e implantação de uma política pública de saúde. Desde então o Brasil não enfrentava tanta polêmica em relação a adoção de medidas sanitárias e governamentais para combater uma doença.

Hoje, em tempos de isolamento social e novo coronavírus, a necessidade de políticas voltadas para a criação de condições de saúde da população preocupa os cientistas atuais. Principalmente depois de estudos recentes indicarem que o RNA desses seres simples provocadores da covid-19 permanecem nas fezes de infectados por 11 dias após a cura do paciente, contaminando o sistema de esgoto e, consequentemente, sendo despejados em rios e lagoas.

O coronavírus é um tipo de RNA – sigla inglesa para ácido ribonucleico, molécula responsável pela síntese de proteínas das células em um corpo.

Estudo publicado na edição de abril da revista científica The Lancet Gastroenterology e Hepatology reconhece a transmissão direta de gotículas como fator importante de propagação do novo coronavírus. Porém, pesquisas realizadas com outros tipos de coronavírus sugere que a excreção fecal, a contaminação ambiental ou substância contaminada também podem contribuir para a transmissão viral desta nova versão do vírus.

Universidade de Minas Gerais comprova estudo holandês

Com base no estudo, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Sustentável da Universidade Federal de Minas Gerais (INCTS UFMG) emitiu nota técnica pedindo mais proteção para trabalhadores das estações de tratamento. Também alerta para o efeito do coronavírus presente no esgoto. De acordo com o Instituto, metade dos pacientes de covid-19 apresentaram RNA viral em suas fezes. Este material permanece no sistema sanitário até 11 dias depois de os pacientes testarem negativo para a doença.

Carlos Chernicharo, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Escola de Engenharia da UFMG e um dos autores da nota técnica, disse que outra implicação importante da possibilidade de transmissão feco-oral do novo coronavírus é que, no período de duração da pandemia, uma enorme carga viral pode estar sendo despejada nos rios. No Brasil, apenas 46% do esgoto recebe tratamento, segundo a edição de 2018 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).
“Como consequência, poderá aumentar a disseminação do Sars-CoV-2 (novo coronavírus) no ambiente e a infecção da parcela mais vulnerável da população, que não tem acesso a infraestrutura adequada de saneamento básico”, explica Chernicharo na nota técnica.

Ministério Público pressiona Prefeitura carioca por saneamento em Jacarepaguá

A contaminação do complexo lagunar do Rio de Janeiro preocupa ambientalistas. Um estudo indica que 259.223 pessoas vivem em áreas informais na região dos rios Anil, das Pedras, Arroio Fundo, Arroio Pavuna, Pavuninha e Rio Morto. A maioria desprovida de e saneamento básico. Análise da mostra de água coletada nesses rios indica a presença de coliformes fecais a índice superior a 1.600 vezes o limite estabelecido pela legislação.

O promotor de Justiça José Alexandre Maximino Mota, do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (GAEMA-MPRJ) abriu investigação para apurar risco de contaminação de trabalhadores do setor de saneamento por novo coronavírus, como informa o movimento Baía Viva no final de 31 de março.

No Rio de Janeiro, um grande programa de saneamento de favelas em torno das lagoas da cidade tem verba reservada de R$ 1 bi e meio. A prefeitura do Rio foi intimada pelo MPF e pelo MPRJ a realizar o saneamento dos rios que desembocam no complexo lagunar de Jacarepaguá. A intimação completa um ano no dia 9 de abril.

Coronavírus e o esgotamento sanitário

Com base nesses estudos, o movimento Baía Viva fez representação junto ao MPF e ao MPRJ alertando para a necessidade de adoção de medidas de prevenção e precaução aos trabalhadores do setor de saneamento. Também cobra as obras de saneamento, paralisadas desde 2016, apesar de notificação judicial.

Além disso, o Baía Viva lembra que desde 2016, com o reconhecimento de estado de calamidade financeira do Rio de Janeiro, as obras de saneamento estão paralisadas. Houve redução dos investimentos públicos para o setor de saneamento. Programas como o de despoluição da Baía de Guanabara é um deles.

Para o ecologista Sérgio Ricardo, membro fundador do Baía Viva e autor da Representação Judicial contra a prefeitura do Rio de Janeiro, a adoção de medidas pelo poder público e pelas concessionárias privadas do setor saneamento são fundamentais. Ele lembra outras crises ecológicas, sanitárias e hídricas ocorridas nos últimos 20 anos e cujas condições poderão se agravar com a pandemia do Coronavírus:

“Em caráter emergencial, a principal providência a ser adotada, é garantir a imediata implantação, em cada município brasileiro, de um Plano de Contingência e Segurança Ocupacional dos profissionais que atuam na área do Saneamento Básico que encontram-se em situação de risco sanitário devido à possibilidade de contaminação por outros coronavírus presentes nas fezes humanas, já que estas tem capacidade de transmissão via feco-oral.

“A segunda medida a ser adotada é retomar maciçamente os investimentos públicos em saneamento básico para que o Brasil possa superar o histórico déficit sanitário de nossas cidades que nas favelas e periferias urbanas das grandes metrópoles, ainda apresentam padrões de desigualdade socioespaciais e de exclusão social das populações pobres, como é o caso da não prestação de serviços básicos de saneamento, comparáveis às cidades do período medieval.

“É inadmissível, cruel e desumano constatar que, em pleno século XXI, que tem como marca do seu tempo os incontestáveis avanços tecnológicos e dos meios de comunicação digital, ainda hoje a maioria dos municípios do país ainda convivam, quase como se fosse uma situação de aparente naturalidade e de conformismo, com indicadores de elevada desigualdade socioespaciais, como é o caso da não prestação adequada de serviços básicos de saneamento. O resultado trágico desta omissão secular do poder público, é que cerca de 100 milhões de brasileiros (ainda) não têm acesso a serviços de coleta de esgoto e 35 milhões de pessoas pobres não tem o direito de acesso à água tratada. Essa é a verdadeira vergonha nacional!”, afirma o ecologista.

No passado, o cientista Oswaldo Cruz tinha consciência quanto a responsabilidade de políticos em relação à proliferação de doenças. Em sua curta passagem como prefeito de Petrópolis tinha como plano a construção de rede de esgoto e projetos de saneamento da cidade. Propostas questionadas pela classe política da época. A sua morte, em 1917, o impediu de concretizar suas intenções. Nos dias de hoje, a figura central da saúde do brasileiro é o ministro Luiz Henrique Mandetta, médico que tenta convencer políticos e população quanto a gravidade da covid-19 e a importância do Isolamento Social.
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