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Venezuela: A nova crise migratória global

No Brasil, cerca de 40 mil venezuelanos estão refugiados em Boa Vista

Por Kaio Serra em 22/08/2018 às 20:30:00

Cerca de 40 mil venezuelanos estão refugiados somente na cidade de Boa Vista, em Roraima. Foto: Agência Brasil

Diante de uma hiperinflação que superará 1.000.000% em 2018, escassez de alimentos e medicamentos, energia elétrica limitada, mais de cinco mil venezuelanos fogem por dia de uma ditadura que governa o país com mãos de ferro.

Cerca de 1,5 milhões de venezuelanos fugiram para outros países entre 2014 e 2017, de acordo com as estimativas do governo de Maduro. No entanto, esse número é muito aquém do real. De acordo com o Programa Latino-Americano do Instituto Wilson Center, " a situação na Venezuela é crítica, e continuará piorando. A expectativa é que, infelizmente, esses números aumentem absurdamente".

Embora o êxodo da Venezuela seja menor do que o sírio (de acordo com dados oficiais, cerca de 6 milhões de pessoas fugiram da Síria), o ritmo é bastante semelhante, e já causa impactos políticos, econômicos e sociais significativos nos países que acolhem esses refugiados.

Na Colômbia, as autoridades de imigração estimam que 30 mil venezuelanos atravessam a ponte Simón Bolivar, que separa os países, todos os dias. "Alguns atravessam só para comprar comida e levar de volta para a Venezuela. Os que possuem mais dinheiro, resolvem morar de vez aqui", diz Apolinário Guanaes, agente colombiano do posto de imigração.

No início da crise, a Colômbia acolhia amigavelmente os refugiados, no entanto, após 1.869 venezuelanos serem presos por crimes como roubo, assassinato e estupro, o sentimento do público mudou.

A crise imigratória também pairou sobre as eleições presidenciais colombianas. Ivan Duque, então candidato pelo Partido Centro Democrático, venceu as eleições com promessas de restringir a entrada de imigrantes, e exigir passaporte para aqueles que estão no país.

O Peru lançou um programa temporário de acolhimento de venezuelanos em fevereiro de 2017, que ajudou 25.500 imigrantes, de acordo com o Escritório de Migração do Peru.


Ilustração: Kaio Serra


No entanto, nem todos os peruanos foram acolhedores, especialmente porque o país vive em crise econômica. Em março deste ano, um grande pôster foi pendurado em uma ponta em Lima, capital do país. O grande cartaz tinha os dizeres "#PeruSinVenezolanos Basta Ya!" (Peru sem venezuelanos, é o suficiente!, na tradução livre).

No Chile, o aumento no número de imigrantes é o maior de todo o mundo. Ao todo mais de 1 milhão de venezuelanos entraram no país entre 2015 e 2017. O aumento abrupto foi um choque para a população, que atualmente sofre com epidemias e vê o número de desempregados aumentar.

O recém-eleito presidente Sebastian Piñera começou a estabelecer políticas mais rígidas para imigrantes, incluindo a exigência de passaporte para a entrada no Chile. Porém, a economia da Venezuela é tão ruim, que as autoridades venezuelanas lutam para obter papel moeda para a emissão de passaportes.

No Brasil, cerca de 40 mil venezuelanos estão refugiados somente na cidade de Boa Vista, Capital do Estado de Roraima. Os imigrantes representam mais de 10% da população local. A governadora do Estado, Suely Campos (PP-RR), decretou estado de emergência, uma medida que visa a liberação de fundos do Governo Federal, principalmente para o amparo à saúde pública. A Secretaria Estadual de Saúde estima de 8 em cada 10 pacientes dos hospitais públicos de Roraima, são venezuelanos.

O número de imigrantes que estão em Boa Vista também é refletido nas escolas da capital. A prefeitura diz que, de 2015 a 2017, o número de crianças venezuelanas matriculadas em escolas da rede municipal de ensino cresceu 1.064%. Além disso, só no ano passado, quase 300 famílias venezuelanas receberam o auxílio Bolsa Família na cidade.

Em Boa Vista, há três abrigos para imigrantes. Dois estão superlotados e, juntos, todos têm capacidade para no máximo 2 mil pessoas. Também há milhares de venezuelanos em situação de rua e uma parcela muito maior de imigrantes dividindo aluguéis.

Nas ruas, um dos principais pontos de aglomeração dos venezuelanos é uma praça na zona Sul da capital. O local abriga hoje pelo menos 300 pessoas e carrega o nome de Simón Bolívar - líder militar que lutou pela libertação da América Latina do domínio espanhol.

O Brasil tem generosas políticas de imigração para a Venezuela e, inclusive, introduziu um visto especial de dois anos especificamente para os venezuelanos. No entanto, incidentes envolvendo brasileiros e venezuelanos se tornaram recentes.

Em fevereiro, um incêndio de grandes proporções atingiu duas casas em Boa Vista, ambas serviam como abrigo para os venezuelanos, e estavam lotadas no momento do crime. No dia 18 de agosto, cerca de dois mil brasileiros que vivem no município de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, queimaram e destruíram várias barracas e pertences de venezuelanos.

A revolta contra aproximadamente 700 venezuelanos, se iniciou por volta de 7h, conforme a polícia, e foi desencadeada após um empresário brasileiro ter sido assaltado e agredido por quatro imigrantes na sexta-feira. Os manifestantes obrigaram os estrangeiros a cruzarem a fronteira de volta para o país de origem. Foi feita uma barricada para impedir que venezuelanos retornem para Pacaraima.

Em nota oficial, o Governo do Estado de Roraima diz que é preciso que o Exército Brasileiro garanta a ordem na fronteira. "A solução para a crise migratória só acontecerá quando o Governo Federal entender a necessidade de fechar temporariamente a fronteira, realizar a imediata transferência de imigrantes para outros estados e assumir sua responsabilidade de fazer o controle de segurança fronteiriça e sanitária".

Ainda conforme a nota, "é essencial também para o povo de Roraima o ressarcimento e a compensação dos gastos que o Governo do Estado está sendo obrigado a ter, por decisão judicial, para atender a excessiva demanda provocada por imigrantes venezuelanos na saúde, na educação e na segurança".

"Mais uma vez, o Governo de Roraima assume, de forma isolada, a manutenção de todos os serviços públicos, sem o apoio do Governo Federal", finaliza.

Ao redor do globo, os venezuelanos tentam abrigo na República Dominicana, no Canadá e no México. O governo de Trinidad e Tobago, criticado pela ONU por deportar 82 venezuelanos, apesar de autoridades terem afirmado que se retiraram voluntariamente.

Nos Estados Unidos, apenas 355 dos quase 20 mil venezuelanos que pediram abrigo, conseguiram permissão para entrar no país.


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