Medidas urgentes que reduzam o contágio e o número de vítimas da covid-19 entre seus trabalhadores; a venda açodada da Refinaria Landulpho Alves (RLAM) e questões relacionadas à política de preços e investimentos da petroleira. Essas são algumas das principais questões apresentadas pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) ao novo presidente da Petrobras, general Joaquim Silva e Luna, antes mesmo de este ter sua posse confirmada pelo conselho de administração da estatal, nessa sexta (16).
A importância do diálogo entre a entidade e a companhia de petróleo foi enfatizada pelo coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar, ao manifestar a expectativa de que “a nova administração esteja aberta à comunicação com os petroleiros, em busca de soluções para os conflitos”. O dirigente, no entanto, cobrou do novo gestor recém-empossado ‘atenção máxima’ para o avanço da pandemia entre os companheiros, cujos ‘números de contágio são alarmantes’.
Incerteza cresce
De acordo com a federação, a doença já matou 80 trabalhadores da empresa – entre efetivos e terceirizados – sem contar outros 533 já infectados com o vírus. Desde o início da crise viral, há pouco mais de um ano, mais de 6 mil pessoas (13% do total) foram contaminadas nas unidades da Petrobras, sobretudo plataformas e refinarias. Nesse aspecto, Bacelar admite que a incerteza da categoria em relação à pandemia, após o anúncio de mudança para home office do sistema de trabalho, em maio próximo.
‘A toque de caixa’
As irregularidades na venda, ‘a toque de caixa’, da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia é outro assunto que tem dominado as discussões, entre os petroleiros. Nesse sentido, a FUP alertou o novo dirigente quanto a suspeitas de ‘preço aviltado e abaixo do valor de mercado’ na negociação com o fundo árabe Mubadala, ou, ainda, ‘inconsistências’ na subsidiária criada para a transação (Refinaria Mataripe S.A.), que nem CNPJ possuía, até o dia da assinatura do contrato.
“É um risco dar prosseguimento a esse processo de venda, que representaria a entrega de um patrimônio público por menos da metade de seu valor”, sustenta o dirigente dos trabalhadores, ao citar avaliações pelo Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), do BTG Pactual, da XP Investimentos e pela própria Petrobrás, constatam que o valor da venda (US$ 1,65 bilhão), foi feita a preço vil”, dispara o coordenador, ao acrescentar que a federação, após apresentar questionamentos a vários órgãos de fiscalização, ingressou com ação na Justiça federal, em que solicita a suspensão da venda, sob o argumento de esta impor ‘prejuízos ao erário’, além de ocorrer num momento pouco propício à operação, em plena pandemia e quando ativos, como petróleo e gás, enfrentam desvalorização internacional”.
Nesse sentido, Bacelar vai além, ao prever que a privatização de refinarias, como a RLAM, poderá impor entraves à necessidade de alterar o PPI. “Ao tirar a possibilidade do estado de definir a política de preço dos combustíveis, o PPI ficará estabelecido no mercado. Assim, o investidor que assumir a refinaria vai trabalhar, no mínimo, com o parâmetro do PPI ou até com preços maiores. É importante dar essa sinalização para o novo presidente da estatal, já que há uma preocupação em relação aos preços dos combustíveis”, disse.
Monopólio privado
Ainda com relação à celeridade da alienação da RLAM – realizada pouco antes da saída do presidente anterior, Paulo Castello Branco – o dirigente da FUP alertou Silva e Luna de que a operação criaria um monopólio privado. “Estamos falando de um grande mercado consumidor, o maior fora do eixo Rio-São Paulo e com potencial de crescimento, comenta Bacelar, ao ressaltar que a venda faria com que a Petrobras perdesse participação no mercado brasileiro de derivados, “o sétimo maior do mundo”. Para ele, a refinaria é um ativo que gera caixa para a estatal, em torno de R$ 1 bilhão por ano.
Nova política de preços
Ao lamentar a postura de Castelo Branco – de declarar, logo ao assumir a presidência, sua posição favorável à privatização da petroleira – Bacelar adiantou que a FUP, levando em conta estudos técnicos do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra – apresentará proposta de mudança na política de preços da estatal.
A ideia aqui é substituir, como referência, os preços de paridade de importação (PPI) – que se baseia em parâmetros internacionais – pelos reajustes dos preços dos derivados no mercado nacional. Sobre a mudança, o coordenador frisa que “quem paga a conta do PPI é o cidadão brasileiro, que arca com aumentos sistemáticos nos preços do diesel, gasolina e gás de cozinha”.
A proposta de alteração da regra de preços tem sintonia com o que já praticam outros grandes produtores de petróleo e gás (China, Rússia, Arábia Saudita e Canadá). Ele lembra que a maioria dos 127 países maiores produtores da commodity não usa o preço de paridade de importação, uma vez que “os custos de produção do petróleo e dos derivados internamente são muito mais baixos na comparação com o mercado internacional”.
Por fim, Bacelar comenta, ainda, que fatores, como custos nacionalizados da extração e produção de petróleo, bem como o custo de refino, devem ser valorizados na formação de preços do setor no país, e não ‘apenas’ usar o comportamento de preço do barril no exterior, a oscilação do dólar ou dos custos de importação como referências de valor.
Investimentos despencam
Outra frente aberta pela FUP diz respeito à política de investimentos da estatal, que tem priorizado obras no exterior, em vez de aplicar recursos na construção de navios, plataformas e sondas no país. “Estamos falando de 84 mil empregos diretos da indústria naval brasileira. Essa geração de empregos agora está em outros países”, criticou. Em queda livre desde 2015, os investimentos da Petrobras no ano passado são os mais baixos em 20 anos. “São números alarmantes. No novo plano de negócios, a empresa investiu US$ 8 bilhões em 2020, quando já chegamos a investir R$ 48 bilhões por ano”, afirmou observar que o índice de conteúdo local despencou de 65% para 25%.
Participação nula
Tendo em vista a expressiva participação feminina em todos os seus setores da empresa, Bacelar lamentou a ausência de mulheres na diretoria da petroleira “ainda mais considerando-se que o número de trabalhadoras na Petrobrás, em 2020, recuou para cerca de 8 mil. Entre 2007 e 2016, o total ficava acima de 10 mil”. Além disso, o coordenador aponta que a presença feminina, considerando o total de empregados, também se reduziu, passando de 17,5%, em 2016 para 16,6% em 2020 – dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).