Nascida e criada no Morro do Timbau, Fernanda Telles, de 37 anos, é uma das 50 travestis que cursam Gastronomia no Complexo da Maré. Moradora da Nova Holanda, Nataly Ferreira, 32, que já recebe acompanhamento psicológico a poucos passos de casa, já se inscreveu para aulas de informática e costura. Oportunidades e acolhimento que as duas nunca haviam recebido e viram surgir há pouco mais de um mês, quando o governo do estado inaugurou na Maré o primeiro Centro de Cidadania LGBTI (CCLGBTI) localizado em favela, uma iniciativa pioneira na América Latina.
O espaço, situado dentro da Nova Holanda, é administrado pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, por meio do Programa Rio Sem LGBTIfobia. O local oferece serviços gratuitos de atendimento psicológico, jurídico e de assistência social, além de cursos profissionalizantes para diferentes áreas. Funciona ainda como ponto de informação, acolhimento e mobilização.
Oficialmente, o CCLGBTI Maré foi inaugurado em 30 de setembro, mas os atendimentos – que já são mais de 140 – começaram em agosto.
Nova visão para o futuro
Desempregada, Fernanda Telles conta que a oportunidade tem mudado sua visão sobre o mercado de trabalho.
– Tenho aproveitado todos os treinamentos possíveis oferecidos pelo CCLGBTI. Sei que a partir disso, vou chegar em meu objetivo de ser empregada. Tem sido uma ajuda muito eficaz, principalmente nessa pandemia. É muito importante para a gente que se sente tão vulnerável em uma sociedade preconceituosa – afirmou ela, que também foi auxiliada pelo serviço jurídico do local.
Nataly Ferreira já se inscreveu para os cursos de informática e costura, que serão ofertados em breve pela unidade.
- Esse era um suporte que nós, trans e faveladas, não tínhamos. Participo de todos os eventos e faço psicólogo aqui também. Me sinto verdadeiramente acolhida. Foi uma bênção essa inauguração, e tão perto de casa – resume Nataly.
Dignidade e respeito para todos
O secretário de Estado de Desenvolvimento e Direitos Humanos, Matheus Quintal, destaca a importância de políticas públicas para combater a discriminação contra a população LGBTQIA+.
– O CCLGBTI é um equipamento que realiza um serviço importantíssimo, promovendo políticas públicas de combate à LGBTIfobia e visando contribuir para o acesso a direitos e para a promoção da cidadania dessa população tão marginalizada – diz o secretário.
Projeto de expansão para outras comunidades
Ao todo, o governo mantém hoje 15 CCLGBTIs. Os equipamentos estão distribuídos por todas as regiões e funcionam a partir de parcerias com as prefeituras. Só este ano, a secretaria inaugurou outros dois espaços do tipo: em abril, em Campos, o primeiro na região Norte do estado; e em julho, em Miracema, único no Noroeste Fluminense.
Coordenadora do centro e ativista da causa LGBTQIA+, Gilmara Cunha, de 37 anos, pensa em evoluir ainda mais o trabalho, levando os serviços de forma itinerante para as outras comunidades do Complexo do Maré.
- Estudamos a possibilidade de o projeto se expandir, começando pelas favelas vizinhas da Nova Holanda. Considero essencial pensar políticas públicas para territórios invisibilizados. A ideia é que esse espaço promova transformações e tenha um impacto direto na vida das pessoas, pensando na qualidade de vida e em políticas afirmativas para a população LGBTQIA+. Ter a presença do Estado aqui é importante. Vejo como uma frente ousada da Secretaria – pondera.