Em maio deste ano, o deputado estadual Dr.Julianelli convocou uma reunião na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) para criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). O objetivo é investigar as possíveis irregularidades na realização do Teste do Pezinho em todo o estado.
Desde agosto de 2017, quando tomou conhecimento das falhas no serviço, Dr. Julianelli iniciou contato com os diversos setores envolvidos. Em seguida, o parlamentar passou a acompanhar as reuniões do Conselho Estadual de Saúde que tratavam do tema. Nesses acompanhamentos foi constatado que os problemas da triagem neonatal afetavam diretamente o diagnóstico precoce de seis doenças que, caso não sejam tratadas com rapidez, podem causar danos irreversíveis à saúde física e mental das crianças ou até mesmo a morte.
De acordo com as avaliações feitas nestes encontros, outro agravante que justificou o requerimento da CPI foi a garantia da efetividade na realização dos exames. Isso porque, o Conselho Estadual de Saúde não tem como assegurar que 104.358 testes foram feitos, bem como, que os procedimentos decorrentes dos resultados tenham sido cumpridos. Entre eles, a busca ativa do paciente, o tratamento e o acompanhamento clínico.
Ainda no início de maio, numa Audiência Pública da Comissão de Saúde, o CES declarou que não havia registro dos R$7 milhões destinados aos procedimentos da triagem neonatal na prestação de contas da Secretaria Estadual de Saúde (SES). Desse modo, os relatos de improbidades administrativas e as não conformidades na aplicação dos protocolos técnicos podem ter causado danos às crianças nascidas no período em análise.
Agora, devido o número máximo de pedidos de inquéritos na ALERJ, a CPI do Teste do Pezinho ainda aguarda sua abertura na Secretaria Geral da Mesa Diretora.
Há quase dois anos e meio, quando realizou o teste do pezinho da sua filha, a fotógrafa e produtora de moda Camila Mendes, 28, não imaginava que seria tão difícil conseguir o resultado. Além da demora, depois de muito tempo, ela ainda foi surpreendida com a notícia de que o teste não tinha sido devidamente encaminhado para o laboratório.
"Todas às vezes que retornava ao posto para alguma consulta ou vacina, perguntava sobre o exame. No entanto, ninguém nunca me dava uma informação concreta, apenas me pediam para entrar em contato com o laboratório. Um dia fui levada a administração do posto e tomei conhecimento que ele não estava pronto. E o pior, o teste não havia sido encaminhado para análise por motivo desconhecido. Como se alguém tivesse perdido o material coletado", contou a fotógrafa..
Desde então, segundo Camila, ela nunca mais conseguiu nenhuma resposta ou laudo.
"Depois disso, não consegui falar com ninguém do laboratório. Já a administração do posto fica jogando a responsabilidade para um e para outro. Enfim, ninguém se responsabiliza. Graças a Deus, a minha filha é uma criança saudável, mas se ela tivesse alguma doença identificável pelo exame, até agora não saberíamos", lamentou.
A policlínica regional Sérgio Arouca, em Niterói, foi o local onde Camila fez o procedimento. De acordo com uma nota emitida pela prefeitura ao Portal Eu,Rio!, a Secretaria de Saúde do Estado é a responsável pela coleta e análise dos exames.
"A Secretaria de Saúde do Estado é responsável pelo material de coleta e análise dos exames de Teste de Triagem Neonatal Biológica (TTNB) – Teste do Pezinho – coletados nas unidades de saúde. O município de Niterói encaminhou lista nominal de exames em atraso solicitando os resultados.
Nesses casos, a orientação é que seja feita avaliação clínica pediátrica em relação às doenças investigadas pelo TTNB, para crianças com idade maior de 1 ano, e, havendo suspeita clínica, realizar exames laboratoriais"
Procurada pela reportagem do Eu,Rio!, a administração da policlínica e o setor responsável pela realização dos testes não se manifestaram sobre o atraso e as falhas do serviço.
Prevenção e promoção da saúde
No Brasil, o Teste do Pezinho foi instituído em junho de 2001. Até hoje, o exame tem grande aceitação e muitas mães o solicitam. Entretanto, segundo especialistas, o tempo entre a realização do procedimento e o resultado precisa ser ajustado.
De acordo com a pediatra e professora da Universidade de Vassouras, Carolina Innocencio, o principal objetivo do TTNB é identificar, por meio do rastreamento de todos os recém nascidos, as doenças que são assintomáticas ao nascimento e diagnosticá-las em tempo oportuno para que haja uma intervenção precoce evitando sequelas e até mesmo a morte.
“O programa nacional de triagem neonatal tem quatro fases. Em cada estado do nosso país encontra-se um estágio de implantação. Ou seja, nem todos identificam as mesmas doenças, pois estas dependem de cada estágio. O Rio de Janeiro, por exemplo, é considerado de fase IV, a fase mais avançada. Dessa forma, seu diagnóstico abrange as doenças da fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, fibrose cística, deficiência de biotinidase e de 17 hidroxi-progesterona, doença falciforme, entre outras hemoglobinopatias”, afirmou a médica.
Para Carolina, o teste ampliado também pode fazer rastreio da toxoplasmose, rubéola, citomegalovirose, herpes congênita, deficiência de G6PD, aminoacidopatias, entre outras doenças. No entanto, ele não é feito no SUS. Nestes casos, só vai ser necessário em pacientes que possuem indicação como uma criança com acidose metabólica ou convulsão de origem indeterminada.
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