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Museóloga gaúcha recusa convite, após aprovada não ser nomeada para direção do Museu Histórico Nacional

Passados quase cinco meses desde a publicação do resultado, Doris Couto, terceira colocada na seleção, explicou motivos em carta aberta

Por Daniel Israel em 04/03/2022 às 20:54:27

Entrada do Museu Histórico Nacional (MHN). Foto: Site do MHN/Divulgação

Na quinta-feira (3), a diretora do Museu Julio de Castilhos, localizado em Porto Alegre (RS), Doris Rosangela Freitas do Couto, divulgou nota de esclarecimento em seu perfil no Facebook, na qual rejeitou convite do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) para assumir a direção do Museu Histórico Nacional (MHN), situado na Praça XV, área central do Rio de Janeiro.

Na carta aberta, ela ponderou sobre a capacidade de elaborar "alternativas que teriam impacto e efetividade". "Não me assustaria assumi-lo e junto com sua equipe reposicioná-lo no cenário nacional e internacional. Contudo, o faria entrando pela porta da frente, com a chave nas mãos, obedecendo a ordem da classificação e não pulando o muro", declarou.

A museóloga Doris Couto ficou na 3ª posição no processo seletivo organizado pelo Ibram, desde março de 2020 sob a presidência do advogado Pedro Machado Mastrobuono, especialista em Direitos Autorais. A museóloga tomou a decisão de divulgar a nota uma semana após o contato do órgão federal.

“Pedi prazo até ontem [4ª feira] para responder porque queria falar com a Luciana e com servidores do MHN. Não a conhecia, mas consegui o contato e a procurei. Queria ouvir dela o que havia se passado, assim como dos servidores o que se passava com o Museu, qual era seu estágio, se estava em risco ou algo semelhante”, acrescentou. "Claro que também enfrentaria o pelotão da censura e não passaria da primeira busca porque defendo o direito à verdade sobre a ditadura; pauto minha vida pela defesa inalienável dos direitos humanos. Soma-se ao desrespeito do longo processo seletivo a prática da censura por este governo, à qual jamais me submeteria".

Luciana Conrado Martins foi a primeira colocada no certame e teve a aprovação anunciada por Mastrobuono no Diário Oficial da União (D.O.U.), na edição publicação em 10 de outubro de 2021. No entanto, a nomeação – ato que efetivamente garante a posse no cargo em qualquer órgão público – até hoje não saiu no D.O.U.

De acordo com Doris, a Casa Civil, sob a chefia do ministro Ciro Nogueira, levou meses para informar ao Ibram sobre o veto ao nome da historiadora, que fez trajetória acadêmica na Universidade de São Paulo (USP). Até o fechamento desta reportagem, não tivemos retorno de Luciana nem da Casa Civil. Não conseguimos contato com o Ibram.

Doris Couto publicou nota em rede social. Imagem: Facebook/Reprodução

Entre passado e presente

Historiador e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Paulo Knauss de Mendonça recorda-se de ter sido o primeiro diretor do Museu Histórico Nacional a ser aprovado em seleção do tipo. “A regulamentação do processo seletivo para diretores de museus do Ibram deriva do Estatuto dos Museus e da lei de criação do Ibram, ambas de 2009 e regulamentadas nos anos seguintes. Sempre o processo foi respeitado, é preciso dizer que se trata de um procedimento que valoriza o perfil profissional dos dirigentes de museus”, exalta. “A partir de 2019, os processos seletivos começaram a sofrer interrupções”.

Doris pontuou que o segundo colocado na seleção também rejeitou a convocação do Ibram, certa de que "essa deveria ser a atitude de qualquer pessoa". "Não acho que recusar tenha sido uma atitude excepcional. Talvez divulgar a nota seja a única coisa que possa ser considerada pouco comum", diz.

No governo Lula, com a assinatura da Lei 11.906/2009, foi criado o Ibram, atualmente vinculado ao Ministério do Turismo (MTur). Porém, sob o mandato de Michel Temer, a fundação da Associação Brasileira de Museus (Abram) foi apontada por especialistas do setor - por exemplo, José do Nascimento Júnior, ex-presidente do Ibram - como a privatização dos museus públicos a nível federal.

O Ibram sucedeu ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no tocante a direitos e deveres dos museus federais. No Brasil, há 30 unidades sob a administração do Ibram, que no estado do Rio de Janeiro cuida de mais da metade (16), distribuídas pelas cidades do Rio, Cabo Frio, Niterói, Paraty, Petrópolis e Vassouras.

Classificação final do processo seletivo para direção do Ibram. Imagem: Diário Oficial da União/Reprodução

Knauss ressalta o fato de que Doris "não está só", ao destacar que "o segundo colocado, apesar de não ter feito manifestação pública, também não aceitou a indicação". "Isso demonstra que os profissionais dos museus resistem às ameaças que vêm sendo apresentadas à gestão pública da Cultura. A manifestação da profissional levanta a questão para os outros classificados no processo seletivo em questão. Qualquer um que aceite a indicação estará compactuando com as práticas profissionais e o desrespeito às regras institucionais?", indaga.

"O desrespeito aos profissionais de museus confirma o descaso e a má gestão da Cultura e dos museus no Brasil atual. Será que nos resta esperar novos museus se incendiarem?", recorda-se ele, numa referência ao Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, que pegou fogo em setembro de 2018.

No final da carta aberta, Doris recorreu a palavras que misturam indignação e valorização do Brasil. "Nossa cultura, nossos patrimônios e memórias coletivas merecem respeito, ética e dignidade".

Na semana passada, o estudante de Comunicação Visual da UFRJ, Gabriel Ferrari Batista, foi anunciado como vencedor do concurso para elaboração da marca comemorativa referente ao centenário do Museu Histórico Nacional. Batista recebeu o reconhecimento das mãos da diretora substituta do MHN, Aline Magalhães, e da presidenta da Associação de Amigos do Museu (AAMHN), Maria Linhares.

Gabriel Batista exibe marca comemorativa: selo será utilizado pela instituição federal ao longo de 2022. Imagem: Facebook/Reprodução

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