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Os murmurinhos da política externa de Bolsonaro

Especialistas falam sobre a expectativa criada pelo presidente eleito a partir de 2019

Por Kaio Serra em 06/11/2018 às 11:20:00

Foto: Pixabay

Mercosul, Israel, Argentina, blocos multinacionais. O alinhamento de Bolsonaro com Donald Trump é, de fato, uma ruptura na política externa do Brasil. Neste âmbito, o país passou por um processo de “partidarização” no comando de Celso Amorim, ex-comandante da chancelaria brasileira nos governos Lula e Dilma, mas tomou o velho pragmatismo na gestão de Aloysio Nunes, chanceler do governo Temer.

No entanto, até que ponto as declarações de Bolsonaro se concretizarão e quais as suas consequências para o país?

Vindo de governos com políticas externas fracas, o Brasil perdeu espaço no cenário diplomático internacional. No exterior, o alinhamento com ditaduras africanas foi mal visto, além do impeachment de Dilma Rousseff e a prisão de Lula terem sido o sinal da institucionalização da corrupção.

Para o economista do DIEESE, Adhemar Mineiro, apesar de ser um mandatário eleito de forma democrática, Bolsonaro precisará ter cautela quanto às escolhas a serem feitas.

“O novo governo entra eleito, e isso deveria lhe dar mais legitimidade. Mas se insistir em temas como a saída do Acordo Climático de Paris, a mudança da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, o afastamento do Mercosul (e talvez dos BRICS), uma política interna com enormes diferenças nos acordos internacionais já assinados nas áreas ambiental, social, trabalhista e de direitos humanos, poderá aprofundar o isolamento internacional, e perder ainda mais capacidade de liderar qualquer coisa”. Diz Adhemar.

Em relação ao Mercosul, o futuro ministro da economia, Paulo Guedes, afirmou que o bloco ficará em segundo plano, assim como as relações com seus integrantes. Para o economista, as declarações foram extremamente preocupantes.

A Argentina é muito importante como mercado para o setor industrial brasileiro, e não pode ser substituída no curto e médio prazo, e mesmo talvez no longo prazo. Também é um importante parceiro geopolítico, e a aproximação dos últimos trinta anos esvaziou uma tensão histórica entre os dois países. Uma mudança radical na relação com a Argentina prejudica o setor industrial brasileiro, e pode provocar mais desindustrialização. ”

Para o economista e professor do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio, Luiz Fernandes, caso o país abandone a orientação a favor de acordos bilaterais em separado, tais acordos não atenderão os interesses internos da nação. “Poderá abrir mercados para a ampliação da exportação de commodities de menor valor agregado, mas em detrimento de produtos de maior conteúdo tecnológico como os que tem peso importante na nossa pauta de exportações para o Mercosul”.

A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, no entanto, está muito distante da China. Responsáveis por mais de 44% das exportações brasileiras, os chineses já reagiram de forma incisiva. O China Daily, por exemplo, afirmou: "Até que ponto o próximo líder da maior economia da América Latina vai afetar a relação Brasil-China?".

Para Luiz Fernandes, não seria saudável para a economia brasileira criar atritos com a China, principalmente em nome de um alinhamento com os Estados Unidos, que se torna cada vez mais fechado e protecionista.

“Como candidato, Bolsonaro adotou uma retórica muito agressiva contra a China, tendo inclusive visitado Taiwan o que constitui uma autêntica e grave provocação ao governo de Pequim. Em defesa dos interesses maiores do Brasil, espero que recue desses posicionamentos no exercício da presidência. ”

O economista Adhemar Mineiro vai mais além: “Um aumento de tensões com os chineses pode representar enorme prejuízo econômico para o país, e a perda de mercados importantes para o país na área de produtos primários (soja, açúcar, carnes, petróleo e ferro e outros minérios, entre outros produtos), ao mesmo tempo em que a tensão com a China combinada a não-prioridade da Argentina pode fazer com que os chineses ocupem o mercado argentino com produtos manufaturados hoje fornecidos pelo Brasil. Uma coisa é evitar que os chineses (ou outros estrangeiros) comprem terras ou dominem setores estratégicos como o de energia no Brasil. Se a restrição valer igualmente para todos os outros países, não creio que os chineses criem dificuldades. Mas se for uma tomada de posição específica para a China, diferente da posição para outros concorrentes de empresas chinesas, como capitais estadunidenses ou europeus, por exemplo, creio que os chineses não vão deixar de reagir. E as consequências podem ser complicadas, especialmente no comércio. “

As declarações de Bolsonaro não causaram preocupações somente entre nossos vizinhos e a Ásia, mas também no Oriente Médio. Em entrevista recente à um jornal israelense, Bolsonaro disse que mudará a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém. Se for confirmada, essa ação representará uma mudança profunda na política brasileira para com a região. Historicamente, o país se destaca pela relação amistosa com todos os países do Oriente Médio, incluindo Cisjordânia, Israel, Palestina e Jordânia.

“Essa posição poderia acarretar riscos de segurança no próprio Brasil, agravando as tensões entre as comunidades árabes e judaicas no nosso país que tem convivido de forma pacífica até aqui. Aumentaria, também, o nosso isolamento internacional, acompanhando o posicionamento do governo Trump sobre essa questão, que considerado irresponsável por boa parte do mundo. ” Diz Luiz Fernando.

Já no âmbito militar, muito se falou, durante a campanha, sobre uma possível ação militar brasileira na Venezuela. O candidato Fernando Haddad (PT), chegou inclusive a dizer que “O Brasil perderia uma guerra contra a Venezuela. “

Para o especialista em Segurança e Venezuela, Pedro Rafael, tanto a hipótese de uma guerra contra os venezuelanos, como uma derrota brasileira são improváveis.

A Venezuela até comprou nos últimos anos milhares de armas e aeronaves russas. Acredito, porém, que esses esforços não seriam suficientes para deter o Brasil. Mesmo com a crise financeira e o evidente sucateamento bélico, estamos mais preparados. Hoje, conta mais ter uma inteligência estruturada. Mas essa hipótese (de uma invasão militar brasileira), é surreal. O que pode acontecer é o reconhecimento da ditadura venezuelana como tal por parte de um eventual Governo Bolsonaro. Uma guerra seria perda de tempo, esforços e dinheiro. O Brasil, por exemplo, é um dos países que mais exporta para a Venezuela. Como ficaria essa situação se uma guerra fosse iniciada? ”.

Para Pedro, o máximo que pode ocorrer é o país ser convidado para uma eventual ação de paz da ONU. “O Brasil é um dos poucos países reconhecidos, mundialmente, como pacifico. Acredito que nossas Forças Armadas participarão sempre que seja pelo bem da Paz mundial. “

 

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