A Defensoria Pública da União (DPU) entrou com ação civil pública (ACP) em que pede à União a manutenção das atuais regras do programa federal Mais Médicos e a abertura deste a profissionais estrangeiros de qualquer nacionalidade e não apenas a brasileiros. O objetivo é garantir a continuidade dos serviços prestados à população. A iniciativa vem depois que o governo de Cuba decidiu deixar o programa no último dia 14, após críticas do presidente eleito Jair Bolsonaro, afirmando que os médicos cubanos trabalhavam em “regime de escravidão” e propôs a mudança no contrato.
Segundo o órgão, o pedido de tutela de urgência em caráter antecedente à ACP visa evitar “a população atendida seja prejudicada com a saída abrupta de milhares de milhares de médicos sem que a União previamente promova medidas efetivas de modo a repor imediatamente o quantitativo de médicos que estão em vias de deixar o referido programa”, disse um trecho da nota da DPU.
Ainda segundo a nota, três defensores públicos federais assina a ação: o defensor regional de direitos humanos da DPU no Distrito Federal, Alexandre Mendes Lima de Oliveira, além de Alexandre Benevides Cabral e Amadeu Alves de Carvalho Júnior. De acordo com a DPU, qualquer mudança, em especial relacionada à não necessidade de submissão ao Revalida, deve estar condicionada à realização de prévio estudo de impacto e comprovação da eficácia imediata das medidas compensatórias que assegurem a plena continuidade dos serviços.
A ação lembrou que o artigo 196 da Constituição Federal diz que a assistência à saúde, através do Sistema Único de Saúde (SUS), é direito fundamental de todos. Além disso, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº. 5035, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a constitucionalidade do programa Mais Médicos, da forma como foi preconizada.
A nota afirmou ainda que “causa espécie a temerária e irresponsável interrupção abrupta do referido programa, seja formal, seja através do estabelecimento de novas exigências que ao cabo acarretariam na mesma consequência, sem que fossem previamente estabelecidas medidas para a reposição imediata dos médicos que não mais continuarão no programa, sobretudo quando sua saída é consequência direta da atuação da União, questionando a justeza ou juridicidade do prévio ajuste entre governos, tema já objeto de apreciação pelo STF”.
Metade dos médicos do programa são cubanos
Segundo a DPU, os cubanos representam, hoje, mais da metade dos médicos do programa. Por isso, a rescisão repentina dos contratos impactará de forma negativa o desatendimento de mais de 29 milhões de brasileiros “Um cenário desastroso em, pelo menos, 3.243 municípios. Dos 5.570 municípios do país, 3.228 (79,5%) só têm médico pelo programa e 90% dos atendimentos da população indígena são feitos por profissionais de Cuba”, destacam os defensores públicos federais.
Com a saída, cerca de 600 municípios brasileiros podem ficar sem nenhum médico da rede pública a partir do dia 25 de dezembro, segundo o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems).
Logo depois do anúncio da decisão do governo cubano e da saída dos primeiros 196 profissionais daquele país do Brasil, na última sexta-feira, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) se manifestou contra a saída deles e que o futuro governo encontre uma solução para o problema, pois muitas cidades ficarão em situação ‘calamitosa’. A entidade entrou em contato com o Ministério da Saúde e pediu medidas para resolver a questão. Também protocolou ofício na Embaixada de Cuba solicitando a permanência dos profissionais cubanos até o fim do ano, bem como a abertura de negociação junto à Confederação e ao governo brasileiro para que se encontrem alternativas que possam garantir o atendimento à população brasileira.
Neste domingo (18), Bolsonaro declarou que o Brasil não pode ser “conivente” com o que ele afirmou ser um trabalho “análogo à escravidão”. Pelo modelo de contratação, os cubanos, contratados com a Organização Pan-americana da Saúde (Opas) como intermediária, recebem cerca de 30% do valor pago aos demais médicos do programa. Os outros 70% ficam com o governo de Cuba. "Não podemos ser coniventes com o trabalho análogo a escravidão. É uma questão humanitária. Eu não sou presidente. Em janeiro nós vamos apresentar o remédio para isso. Se bem que o governo Temer já está trabalhando nesse sentido. É justo confiscar 70 ou 80% do salário de uma pessoa? Não é justo", criticou Bolsonaro. A afirmação foi feita durante a final do campeonato de jiu-jitsu realizado na Arena Carioca 1, no Parque Olímpico do Rio de Janeiro. O Grand Slam do Rio de Janeiro teve início na última sexta e terminou neste domingo.