Os primeiros três participantes voluntários dos ensaios clínicos (em seres humanos) da vacina SpiN-TEC MCTI UFMG, contra a covid-19, receberam hoje (25) a primeira dose da fase 1 dos testes. Essa etapa de desenvolvimento da SpiN-Tec, primeiro imunizante desenvolvido com tecnologia e insumos nacionais e financiamento de instituições brasileiras, foi iniciada em evento na Faculdade de Medicina da UFMG, que vai sediar os ensaios clínicos, por meio da unidade de Pesquisa Clínica em Vacinas.
O mestrando em Microbiologia da UFMG João Vítor Rodrigues Carvalho recebeu a primeira dose, que foi aplicada pelo médico e secretário de Pesquisa e Formação Científica do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcelo Morales. “Me apresentei como voluntário porque acho que é um dever de cidadão e porque sei como esse trabalho é importante. Trata-se de um marco para a ciência brasileira”, disse o estudante.
A SpiN-TEC vem sendo desenvolvida no CTVacinas da UFMG, em parceria com a Fiocruz Minas. Para as etapas de ensaios pré-clínicos e clínicos de fase 1 e 2, o MCTI investiu R$ 16 milhões; todo o processo contou com apoio financeiro de outras fontes, como a Prefeitura de Belo Horizonte, o governo de Minas Gerais e parlamentares nos níveis estadual e federal.
A expectativa é de que o imunizante seja eficaz contra novas variantes do Sars-CoV-2, o novo coronavírus, uma vez que a estratégia de sua concepção é baseada numa proteína do vírus que não muda de uma variante ou subvariante para outra. A primeira etapa do processo iniciado hoje será concluída em sete dias, depois de verificadas possíveis reações adversas nos três voluntários.
Até março de 2023, os 72 pacientes da fase 1 terão recebido as doses. O objetivo é avaliar dose ideal e imunogenicidade. Na fase 2, 360 voluntários serão incluídos, para definição de esquema de doses e verificação de segurança expandida. A fase 3, que deverá ser encerrada até o primeiro semestre de 2024, vai avaliar a eficácia do imunizante. O recrutamento de voluntários está aberto.
A reitora Sandra Regina Goulart Almeida recordou o trabalho conjunto, desde o início da pandemia, exaltou a atuação de “pesquisadores incansáveis” e o apoio de diversas instâncias de governo e do legislativo. Ela citou o jogador Richarlison, da seleção brasileira de futebol, que disse que não precisava entrar num laboratório para saber que sem a ciência ele não poderia fazer seu trabalho de atleta. “É preciso investir de forma contínua e sustentável em ciência, tecnologia e inovação para que o Brasil seja soberano e o país do futuro que queremos”, disse a reitora, acrescentando que a UFMG está à disposição da cidade, do estado e do país, não importa qual seja o governo. “Somos uma instituição de Estado, que tem como um de seus objetivos a saúde para todos.”
Os testes pré-clínicos da SpiN-TEC MCTI UFMG, realizados em laboratório em animais, comprovaram a eficácia e a segurança do imunizante. Os resultados foram publicados na revista Nature, em agosto deste ano. Os testes clínicos seguirão o modelo duplo-cego: parte dos voluntários formará o grupo controle, que receberá a vacina AstraZeneca. Cada participante ficará em observação durante um ano. Após a conclusão das fases 1 e 2, o grupo que desenvolve o novo imunizante enviará relatórios para a Anvisa, solicitando autorização para a terceira e última etapa dos testes, em que serão reunidos de quatro a cinco mil voluntários.
O antígeno (substância que desencadeia a produção de anticorpos) da SpiN-TEC inclui duas proteínas do Sars-CoV-2, vírus causador da covid-19. Uma é a proteína Spike (S), e a outra é o nucleocapsídeo (N), o que explica o nome dado à vacina. As vacinas atualmente em uso geram respostas de anticorpos neutralizantes, e a SpiN-TEC induz respostas do linfócitos-T, o que significa que ela atua sobre várias partes da molécula do vírus. Por isso, os pesquisadores acreditam que ela será capaz de combater variantes como a Ômicron e suas subvariantes. A alta estabilidade do imunizante, que pode ser mantido a 4ºC, vai facilitar a distribuições para lugares longínquos.'Projeto único'
O coordenador da equipe de produção da vacina, professor Ricardo Gazzinelli, ressaltou que a SpiN-TEC deixará um legado para o desenvolvimento de imunizantes contra outras doenças no Brasil, uma vez que as tecnologias criadas poderão ser adaptadas para o combate a outros agentes causadores de doenças.
Gazzinelli contou um pouco da história que culmina no início dos testes clínicos da vacina, mencionando, entre outros marcos, ações de um grupo de pesquisadores reunido há mais de dez anos e a criação do Centro de Tecnologia de Vacinas da UFMG, em 2016. Ele destacou o esforço conjunto e a importância, por exemplo, da Rede Vírus MCTI, que viabilizou projetos relacionados a tecnologias, insumos e equipamentos. “Pesquisadores seniores e jovens acreditaram que estávamos começando um projeto único, e tivemos apoio fundamental de governos, instituições públicas e farmacêuticas privadas”, salientou o professor da UFMG.
O secretário Marcelo Morales destacou a criação da Rede Vírus, ainda antes de declarada a pandemia de covid-19, e outras ações do MCTI relacionadas a sequenciamento do vírus, monitoramento de mutações e de pássaros e animais silvestres que podem trazer agentes patógenos para o território brasileiro. “Tivemos sempre respostas positivas do grupo da UFMG, que representa a competência que temos instalada no Brasil, responsável por estarmos vivendo este momento histórico, de início dos testes clínicos da primeira vacina integralmente brasileira”, disse.
O projeto de desenvolvimento da vacina SpiN-Tec MCTI UFMG também contou com recursos das fundações de amparo à pesquisa dos estados de Minas Gerais e de São Paulo (Fapemig e Fapesp). Colaboraram, ainda, a Fundação Ezequiel Dias (Funed), o Laboratório Nacional de Biociências (LNBIO), o Centro de Inovação e Ensaios Pré-clínicos (Cienp) e o Laboratório Cristália
Fonte: UFMG